terça-feira, 25 de junho de 2013

Será que Crato quer que a ciência recue 20 anos em Portugal?

Deitar abaixo o que vem de trás, mesmo o que funcionava bem é um erro que se soma aos cortes cegos efectuados. Numa legislatura, o actual governo pode destruir muito do avanço conseguido nos últimos 20 anos. Avanço que colocou o nosso sistema universitário como o 22.º melhor.

Num momento em que Portugal se arrisca a perder milhares de alunos brasileiros de pós-graduação e a perder programas de cooperação com algumas das melhores Universidades internacionais (como MIT e a Carnegie Mellon), a política de ciência, ou a falta desta, está a desestabilizar centros de investigação e laboratórios associados, com alterações pouco claras nas regras de financiamento e de avaliação. 

O memorando de entendimento não previa, nem defendia cortes na ciência, uma área em que a Troika considerava que o país tinha registado uma evolução muito positiva vista como determinante para o reforço do crescimento e competitividade.

A decisão de fazer cortes na ciência, inclusive superiores aos cortes na despesa corrente, é uma decisão política. É uma opção do actual Governo. Cortar em cérebro, mais do que se corta em gorduras é uma decisão errada que compromete o potencial de crescimento futuro do país. A forte redução nas bolsas de doutoramento e nas verbas para pós-doutoramento (programa ciência) são exemplos que vão contribuir para aumentar o já enorme fluxo de fuga de cérebros que o país enfrenta.

Os cortes não são, no entanto, o único problema. Dou aqui quatro exemplos.

domingo, 23 de junho de 2013

A sombra de Malthus

O estudo da população é uma ciência de pouca exactidão. Por exemplo, ninguém previu o colapso demográfico da Rússia pós-soviética ou a descida da taxa de fertilidade que se regista um pouco por todo o lado. De qualquer maneira, de acordo com alguns especialistas, a actual população mundial, cifrada em 6 000 milhões de pessoas, deverá atingir os 7 200 milhões em 2050. Pode o planeta suportar tanta gente? A história diz-nos que não. Uma população humana próxima dos 8000 milhões só seria mantida por meio de uma devastação da terra. Convém sublinhar que a destruição do meio natural não é o resultado do capitalismo global, da industrialização, da “civilização ocidental” ou de qualquer outra invenção humana. É o resultado do êxito de uma espécie excepcionalmente predatória, a espécie humana. Os avanços da engenharia genética poderão permitir rendimentos crescentes de solos cada vez mais deteriorados e, em última análise, restará sobre a Terra pouco mais do que o Homo sapiens e o meio-ambiente protésico que o manterá vivo. Um cenário aterrador. Alguns autores, como Reg Morrison, têm notado que os seres humanos reagem ao stress da mesma forma que os outros animais: ante a escassez de recursos e a sobrepopulação reduzem o impulso reprodutivo. Dito de outro modo, a “praga humana”, tal como as pragas de outros animais, só poderá ser de curta duração. Não por acaso, a fertilidade encontra-se em queda em boa parte do mundo.
No virar do século XIX, Thomas Malthus indicava a guerra e as fomes recorrentes como meios de manter o equilíbrio entre a população e os recursos. Hoje, a guerra, as alterações climáticas, as novas doenças, a queda da fertilidade, ou a combinação destas, poderão interromper o actual pico de seres humanos. Num sistema caótico, não se pode prever com rigor a escala da transformação já em marcha. Ainda assim, Reg Morrison prevê que a população mundial por volta de 2150 se situará algures entre os 500 e os 1000 milhões – a título de curiosidade, em 1600, a população do planeta rondava os 500 milhões.
Durante décadas Malthus foi ridicularizado. O progresso tecnológico, que ele não antecipou, tem iludido os resultados da sua célebre Lei dos Rendimentos Decrescentes. Até quando? Talvez não seja má ideia voltar a ler o seu “Ensaio sobre o Princípio da População” de 1798.

Tudo o que é sólido dissolve-se no ar

A popularidade de Karl Marx foi um acidente histórico. Não fora I Guerra Mundial, o consequente colapso do czarismo, os posteriores incidentes, acasos, pura sorte e golpes de génio de Lenine que conduziram os bolcheviques ao poder em 1917, e Marx seria hoje, provavelmente, um obscuro autor do século XIX, conhecido apenas por alguns eruditos. Em vez disso, carradas de intelectuais espremeram os miolos a decifrar o que o homem escreveu, tentando fornecer coerência e “fundamentos científicos” à obra do autor do Capital. Por causa da actual crise, alguns pensadores, onde pontificam Alain Badiou e Slavoj Žižek, têm tentado reabilitá-lo. O resultado desses esforços é previsível: Marx compreendeu algumas características fundamentais do capitalismo do início do século XIX, mas estas não têm nada a ver com as do capitalismo do início do século XXI.
De qualquer maneira, há uma frase de Marx que li há uns anos, numa passagem do Manifesto Comunista, que me ficou gravada: “Tudo o que é sólido dissolve-se no ar”. Não estarei a exagerar se disser que Marx foi o primeiro a perceber que as mudanças provocadas pelos mercados não se confinam à economia, ao invés, transformam toda a ordem social, não deixando pedra sob pedra. A religião e o nacionalismo não morreram tal como ele havia previsto (nem há sinais da sua morte para breve), mas, ao perceber a forma como capitalismo estava a alterar a velha ordem social, Marx tocou num ponto essencial. Talvez por isso me pareçam fantasiosas e incoerentes as posições da direita conservadora - onde em Portugal se destacam João César das Neves e João Carlos Espada -, que acredita, por um lado, nas virtudes do mercado e, por outro, gostaria de manter ou restaurar a “família” e uma certa ordem social. Se Marx não se enganou neste particular, isso é o mesmo que pedir sol na eira e chuva no nabal.

sábado, 22 de junho de 2013

Património Mundial

A minha Alma Mater é agora património mundial. De certa forma, isto faz de mim, e de outros elementos deste blogue, património da humanidade, o que faz do próprio blogue património imaterial da humanidade, ao lado do fado e do flamengo.

Graçolas à parte, parabéns à Universidade de Coimbra. Cada vez mais me orgulho de ter sido nessa Universidade, e na cidade que a acolhe, que me formei.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Uma coisa que nunca percebi foi

por que motivo haveriam os restaurantes de pagar IVA reduzido. Há alguma explicação racional para argumentar que os clientes dos restaurantes devem pagar menos IVA do que os consumidores de outros produtos?

PSL - Partido Sem Lei

Apesar de o Tribunal da Relação ter rejeitado o recurso para se candidatar, Fernando Seara apresenta, já esta sexta-feira, a sua candidatura à Câmara de Lisboa, durante uma conferência de imprensa, no Padrão dos Descobrimentos.
Já não há adjectivos  para qualificar a atitude dos partidos da maioria perante o quadro legal do seu país. Para o PSD e para o CDS as leis, que eles próprios aprovaram, são simples obstáculos a ser ultrapassados.

Ainda sobre as Zonas Monetárias Óptimas

O detalhei na minha entrada sobre Zonas Monetárias Óptimas tem, essencialmente, a ver com a teoria económica nos anos 60 e inícios de 70 do século passado. Nos anos 80, a literatura económica esqueceu este assunto. Com os projectos de criação da moeda única europeia que culminou com o Tratado de Maastricht, o assunto reavivou-se na literatura científica. 

Não houve grandes contributos teóricos, apesar de haver alguns, naturalmente. Eu dividiria a evolução nos anos 90 em 3 fases:
  • primeiro, foi feita uma releitura da teoria das zonas monetárias óptimas para que as condições de optimalidade fossem empiricamente testáveis;
  • segundo, fizeram-se vários testes que concluíram, basicamente e sem grandes margens para outras interpretações, que os países da União Europeia não formavam uma zona monetária óptima;
  • terceiro, surgiram então novos contributos teóricos para a literatura. Esses contributos defendiam a endogeneidade das Zonas Monetárias Óptima. 
O argumento era mais ou menos este: mesmo que antes na união monetária não estejam reunidas as condições para ela poder ser óptima, uma vez formada essas condições serão facilitadas. Por exemplo, uma das condições para que dois países devam adoptar uma moeda comum é que o comércio entre eles deve ser intenso. Ora, a existência de uma moeda comum vai, precisamente, incentivar o comércio entre esses dois países. Assim, condições que não existem ab anteriori podem ser criadas a posteriori.

Serve esta entrada para dizer que o voluntarismo político identificado por Zé Carlos teve como boa companhia o voluntarismo de diversos académicos economistas.

quarta-feira, 19 de junho de 2013

Nuno Crato admite-se derrotado

Afinal o Ministério da educação não tem problemas em alterar a data de exames por causa de greves. Tudo para não prejudicar os alunos. Ou então teve medo que os exames tornassem a decorrer com toda a normalidade, tal como o exame de português.

O mais interessante é que desta vez estamos a falar de alunos de 6º e 9º anos. O que quer dizer que se por acaso parte dos alunos tivessem de fazer exame num outro dia os prejuízos seriam incomensuravelmente menores do que no caso dos exames do 12º ano. Afinal de contas, para estes as notas contam a valer e podem ser absolutamente decisivas no acesso ao ensino superior.

Fica assim demonstrado, para quem tivesse dúvidas, que a intransigência com a data dos exames de 2ª feira passada pouco ou nada tinha a ver com o supremo interesse dos alunos. Nuno Crato, simplesmente, quis fazer um braço-de-ferro com os professores. E perdeu.

O grande salto em frente

Em posts abaixo, o Luís e o Manuel Cabral defendem, implícita ou explicitamente, o reforço do orçamento comunitário. Ambos gostariam que fosse transferido mais dinheiro para as regiões ou países com maior desemprego. O Manuel Cabral não se importaria se tal fosse feito à custa dos agricultores dos países mais ricos. O LAC relembra o conceito de Zonas Monetárias Óptimas, introduzido em 1961 por Robert Mundell, segundo o qual um “orçamento parcial comum” é uma das condições chave para uma integração monetária eficaz. Muito bem. O problema é a realidade. Os líderes europeus já mostraram não pretender aumentar as contribuições dos seus países para o "orçamento comunitário" e não pretendem tal coisa porque os povos que os elegeram não estão para aí virados, bem pelo contrário.
Pois é, a democracia às vezes é uma chatice, o povo nem sempre quer ver a luz. Há quem diga que nos fazem falta líderes do calibre de um Helmut Schmidt, um Valéry Giscard d'Estaing, um François Mitterrand ou um Helmut Kohl. Afinal de contas, foram eles que sonharam, idealizaram e puseram de pé a moeda única, contra todas as teorias e, mais importante, contra toda a evidência histórica – nunca em época alguma se tinha avançado para uma União Monetária sem a existência prévia de uma União Política. Em suma, foram eles, esses visionários, que nos empurraram para a beira do abismo. Agora, como dizia o outro, só falta dar o grande salto em frente.

Exame de português

Os tribunais da Guarda e Évora aceitaram os candidatos contestados pelo movimento revolução branca: Álvaro Amaro (PSD) e Pinto Sá (CDU), respetivamente. Esta história representa Portugal no seu melhor. A lei de limitação dos mandatos (Lei 46/2005, de 29 Agosto) tem apenas um artigo com três alíneas e nem assim os nossos ilustres representantes conseguiram escrever uma lei clara, sem ambiguidades, que toda a gente entenda. Há quem diga que as leis são feitas deliberadamente assim, susceptíveis de mil interpretações, para dar dinheiro aos escritórios de advogados; a mim parece-me que, na maior parte das vezes, a explicação é bem mais prosaica: os nossos deputados não sabem pura e simplesmente escrever num português escorreito.

terça-feira, 18 de junho de 2013

Pode alguém ser quem não é?

Primeiro, parece que António José Seguro diz uma atoarda conceptual respeitante à estatística. Depois, parece que afinal não é caso de burrice, mas tão só boa vontade. A seguir vem o decano do blogue, Luís Aguiar-Conraria, escrever que a ideia até é louvável. Mais tarde, é Manuel Cabral que vem para aqui dizer que a proposta do SG do PS era exequível e preferível a sustentar vacas francesas (embora isto seja outra discussão).
Que o meu post foi assim uma piada falhada não é surpresa nenhuma para ninguém, já que não se espera outra coisa. Agora o que quero saber é isto: se é para o dr. Seguro dizer coisas que a malta deste blogue acha que não são tontas, para que servem afinal este blogue e, principalmente, António José Seguro?

Sobre apoios europeus ao subsidio de desemprego ou a regiões com forte desemprego

Concordo inteiramente com o que o Luís disse e com o geral da proposta do António José Seguro.
Já a defendo há algum tempo, embora numa versão mais soft que a americana, que penso poderia ter enquadramento na lógica europeia. 
Tenho defendido que uma medida desta natureza devia ter sido colocada com força no orçamento comunitário para os próximos anos. No entanto, não foi. Embora em espírito até por lá ande qualquer coisa do género com o programa de politicas de emprego para os jovens.
O que eu defendi é que, havendo apoios comunitários para vários grupos alegadamente desfavorecidos (como os agricultores, as regiões com um nível de rendimento abaixo dos 75% da média da UE, regiões industriais em declínio, etc) poderia e deveria haver também apoios para regiões (ou países) com níveis de desemprego acima de um determinado nível absoluto (maior que 15%) ou relativo (por exemplo com um nível de desemprego 3 ou 4 pontos acima da média comunitária).
Num esquema razoável, estes apoios deviam ser majorados quando simultaneamente houvesse um nível de desemprego particularmente elevado e se tratasse de regiões ou países com rendimento abaixo da média.
Esta medida, em minha opinião, já teria feito sentido antes da moeda única, e os apoios às regiões industriais em declínio iam razoavelmente nesse sentido. Mas, existindo uma moeda unica, faz ainda mais sentido que, dentro dos países que a integram, houvesse mecanismos de transferência favoráveis às regiões com níveis de desemprego acima da média, em especial quando estas coincidem com regiões com rendimentos mais baixos.
Estes mecanismos de transferência poderiam ser para pagar parte do subsidio de desemprego, ou para financiar investimento ou programas activos de promoção de emprego.
E quem paga?
O Orçamento comunitário.
Ou uma parte do Orçamento apenas da Zona Euro.
Ou, no limite, esta parte até podia ser financiada por emissão monetária - o que criava um mecanismo automático de expansão monetária quando houvesse muito desemprego.
Confesso que acho a ultima alternativa muito ousada. Pelo que deve ser deixada de fora da discussão.
Mas acho que uma União que continua a gastar quase 40% do seu orçamento a apoiar um grupo desfavorecido como são os agricultores, podia, num momento em que os preços agrícolas estão tão altos, ter reduzido este montante para 30% e já ficava com 10% para dedicar ao apoio ao emprego. Podia também colocar parte das verbas destinadas à coesão mais viradas para regiões com forte desemprego. Países do leste que estão com um bom crescimento e com baixo desemprego estão a receber fortes apoios do fundo de coesão que estão a contribuir para inflacionar os preços da construção, entre outras coisas. Talvez uma parte dos fundos de coesão devesse ser ligada ao nível de desemprego (até eventualmente aceitando que regiões próximas da média pudessem beneficiar destes fundos quando têm desemprego elevado).
Para terminar, acrescento apenas duas coisas.
A primeira é que os apoios ao combate ao desemprego jovem  incluidos no orçamento plurianual vão já muito no sentido do que disse, pelo que parece existir na UE um razoável consenso de que criar apoios especiais para regiões com muito desemprego é coerente com a politica europeia. O problema aqui é que o orçamento comunitário dedica a este problema apenas 0,7% do total das suas verbas! É isto que a meu ver é errado.
A segunda é sobre se Portugal andaria a pagar o subsidio de desemprego alemão.
É possível que sim.
Mas com nuances. A primeira é que mesmo que tivessem existido apoios fortes ao desemprego, continuaria a ser provável que a Alemanha dos anos 90 fosse um contribuinte líquido para o orçamento comunitário.
Fosse como fosse, eu penso que a reunificação alemã recebeu alguns apoios de solidariedade da União europeia (o fundo de coesão aplicou-se no leste) e eventualmente devia ter recebido ainda mais.
Porque é que a ideia de se no futuro houver muito desemprego na Finlandia haver apoio comunitário a regiões e aos desempregados da Filândia é uma ideia chocante, numa Europa que dá enormes apoios aos agricultores, em particular aos agrícultores franceses e alemães, com uma percentagem particularmente elevada a ir parar aos agricultores com maiores explorações (os mais ricos).
Passámos todos os anos 90, com os portugueses a financiar agricultores com rendimentos acima da média de Portugal da França, Holanda e Alemanha (três dos países que mais recebem da PAC) de duas formas:
* Usando verbas comuns da UE (que também os portugueses pagavam - pelo IVA) em apoios comunitários;
* Com preços particularmente elevados dos bens agrícolas, que significavam que os nossos consumidores financiavam os produtores de cereais e outros bens em que a Europa é menos competitiva do que os EUA. Esta transferência era particularmente forte no caso português, pois Portugal é importador líquido de bens agrícolas, e em particular dos em que a UE coloca mais restrições à entrada.
Portugueses a financiar alemães e franceses já hoje existe. Eu confesso que preferia que fossem desempregados a agricultores (principalmente quando se sabe que 80% dos apoios eram canalizados para os 20% de agricultores com maior rendimento). 
Penso que faz todo o sentido haver apoios a regiões com forte desemprego.
A UE e a Zona Euro retiraram instrumentos aos estados para lutar contra o desemprego.
Seria razoável que tivessem criado um mecanismo de compensação parcial.
Hoje o desemprego é o maior problema europeu.

O combate a este merecia mais do que 0,7% do orçamento comunitário.

O meu balanço

Para o dia de exames de hoje, o Ministério da Educação convocou todos os professores. O que quer dizer que por cada professor-vigilante havia cerca de 9 substitutos. É mais ou menos como se uma equipa de futebol tivesse um plantel de 110 jogadores para poder fazer 99 substituições durante um jogo. De manhã, no facebook, escrevi que se depois desta convocatória mais de metade dos exames não se realizassem, então estaríamos perante uma monumental derrota deste governo.

Os números finais já são conhecidos. Cerca de 30% dos alunos não fazerem exame, quando foram convocados 1000% dos professores necessários, é uma derrota para o ministério. Não é uma derrota monumental, mas é uma derrota clamorosa. Estes resultados só são possíveis com uma adesão brutal, na casa dos 90% ou mais. Que eu saiba, é uma adesão sem precedentes entre professores.

Estes números são ainda mais impressionantes se tivermos em conta as condições caóticas em que milhares de alunos fizeram os exames. Desde exames feitos em cantinas e ginásios, a exames vigiados por pessoal não docente, passando por exames que se realizaram graças à presença da polícia (chamada para expulsar alunos que se manifestavam nas escolas e nas salas de exame).

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Traumatismos de greve

Talvez não se lembrem, mas em 1989 ninguém foi admitido pela primeira vez numa universidade pública portuguesa. Os que concluíram o 12º ano em 1989 esperaram até Janeiro de 1990 para saberem os resultados das candidaturas. A razão do atraso, se bem me lembro, deveu-se a uma greve à correcção das provas específicas por parte dos professores do ensino superior.
Posso adiantar que estes seis meses de férias prolongadas foram profundamente traumáticos para a minha geração, e para mim em particular.  Li o que faltava da biblioteca lá de casa, o que incluiu três ou quatro romances de Milan Kundera, as duas obras principais de Kafka, uns tantos romances de Fernando Namora e de Urbano Tavares Rodrigues, e outras obras cujo nome já não me recordo. O trauma foi tanto que até deu para um part-time num gabinete de contabilidade de um primo, o que me permitiu pagar umas viagens e uns acampamentos pelo país.
Em suma, fui obrigado pelos grevistas de então a passar o tempo a namorar, a ler e a passear. Com um trauma assim, acho que vou pedir uma pensão por invalidez.