quarta-feira, 23 de abril de 2025

Quase carapaus

Na sexta-feira passada, a Administração Trump decidiu lançar o isco de como correriam as coisa se Trump despedisse Jerome Powell. Perante a possibilidade, os mercados reagiram negativamente e o dólar continuou a cair. É cada vez mais consensual que o estatuto dos EUA e do dólar como refúgio dos investidores está muito abalado e talvez destruído por uns bons anos, se é que alguma vez o volte a recuperar. Na terça-feira, a Casa Branca veio meter água na fervura indicando que os EUA já têm alguns acordos comerciais quase firmados com o Japão, e a Índia, mas sem grandes detalhes--ou seja, uns acordos algo por alto. Scott Bessent também ajudou a acalmar os mercados dizendo que era óbvio que os EUA e a China se acabariam por entender porque eram as maiores economias do mundo, etc. E finalmente, de tarde, lá veio o anúncio de que Jerome Powell não ia ser despedido, o que apaziguou ainda mais os deuses do mercado.

Na economia real, os portos de Los Angeles e Long Beach, na Califórnia, estão a perder bastante volume vindo da China em reacção ao anúncio da guerra das tarifas. As pequenas empresas estão completamente em pânico porque dependem da manufactura chinesa para as suas vendas. Trump cancelou a isenção de taxas alfandegárias dee pacotes que entram nos EUA com valor inferior a $800 (isenção de minimis) e a DHL deixou de aceitar pacotes de valor superior a $800 destinados aos americanos porque agora estão sujeitos a uma maior burocracia. (Isto não vos lembra a saga de enviar pacotes do estrangeiro para Portugal?)

A cereja no topo do bolo são as últimas estimativas de crescimento do PIB para a economia americana e mundial: a americana é esperada crescer 1.8%, em vez dos 2.7% estimados em Janeiro. Imaginem a matemática disto! O primeiro trimestre, que teve um Janeiro bastante optimista, é esperado ter um crescimento do PIB negativo, o segundo trimestre parece que também vai ser negativo por causa da guerra comercial, dificuldades na fronteira que mandam os turistas para trás, medo de voar dentro dos EUA, despedimentos na função pública, e agora também no sector privado, etc. As únicas notícias positivas são aumento de vendas de carros e outros itens para evitar as tarifas., que tem um efeito bastante temporário. Resumindo, para a estimativa se concretizar, o segundo semestre tem de bombar para colmatar o crescimento perdido e ainda adicionar o que falta, o que é bastante improvável.

A única coisa que faz parar esta administração são as más notícias da economia, do dólar, e da bolsa e, por sorte, houve a falta de visão de começar pela parte mais destrutiva e depressiva, em vez de alimentar a bolha da bolsa com cortes de impostos e aumento da dívida. Quanto às questões sociais, o que Trump faz apenas serve para alimentar a base e não dá para fazer oposição porque são questões que fragmentam a opinião pública. O Clinton tinha razão: a única forma de ganhar apoio é pela economia. 

Há no entanto alguma luz ao fim do túnel: os tribunais e o SCOTUS não parece que estão dispostos a dar uma carta branca permanente à Administração. E a sociedade civil também não: Trump tentou tirar financiamento a Harvard, se a universidade não largasse certas práticas consideradas "woke" ou anti-semíticas. Harvard recusou, Trump cancelou o financiamento de 2.3 mil milhões de dólares e ameaçou retirar o estatuto de entidade com fins não-lucrativos. Harvard acabou por processar a Administração Trump, mesmo depois de esta ter dito que a carta que tinha sido enviada a Harvard não era final e tinha sido enviada em erro

É um pouco misteriosa a razão pela qual a Administração decidiu recuar nas exigências a Harvard, mas a universidade tem um "endownment" de 53.2 mil milhões de dólares, e decerto que parte deve estar investida em dívida pública americana. Na semana passada, os jornalistas começaram a especular estratégias de como a universidade poderia resistir a Trump. No final, a estratégia adoptada foi a tradicional: os tribunais. Tem algum risco, mas se funcionar também cria precedente que pode ajudar outras instituições.

Imaginem se nos EUA tudo dependesse de financiamento público, mas não houvesse independência das instituições como acontece em muitos países. Estaríamos mais fritos que carapaus.


segunda-feira, 7 de abril de 2025

Ainda a Segurança Social Americana

Para além de terem despedido pessoal na Social Security Administration, a Administração Trump decidiu que não vai pagar benefícios via cheque (sim, ainda havia pessoas que os recebiam). Foi levantada a questão de as pessoas não serem informadas que não vão receber, mas a Administração acha que quem recebe via cheque está a cometer fraude, logo obviamente que não irá reclamar. Os benefícios da Segurança Social (as reformas) são na maior parte pagas na segunda, terceira, e quarta quartas-feiras do mês dependendo da altura do mês em que as pessoas nasceram, respectivamente,  1-10, 11-20, ou 21-31. Ou seja, daqui a dois dias vamos ver se alguém reclama de não ter recebido o dito cheque.   

Se ainda não se aperceberam, este tipo de comportamento é completamente anti-americano. Normalmente, coisas deste tipo são planeadas com muita antecedência e os interessados são informados de mudanças para não causar transtornos às pessoas e estas terem tempo amplo para planear a vida. É por isso que ainda havia pessoas que recebiam por cheque porque, obviamente, não lhes era mais fácil receber por outra via.

Jacarandágate

Andava eu pelo Instagram a tentar relaxar antes de ir para a cama quando aparece o Carlos Moedas a tentar explicar o Jacarandágate. Dizia ele que as árvores em questão estavam demasiado danificadas para serem transplantadas. Ora antes do parque de estacionamento abortar, a justificação para o projecto era que as árvores não estavam em risco porque iam ser transplantadas -- em Março e Abril. 

  1. Ninguém transplanta árvores caducifólias em Março e Abril. Se é para haver transplante, este teria de ser feito no outono ou inverno, quando as árvores estão em dormência. Quero ver estas árvores que transplantaram agora a sobreviver o calor sufocante de verão, quando não tiveram tempo nenhum para desenvolver raízes no novo local de plantio. Espero bem que haja um plano de irrigação para as coitadas. Ou seja, este projecto não envolveu ninguém com competências técnicas em agronomia ou paisagismo. 
  2. Os jacarandás são uma das imagens mais populares de Lisboa e é comum encontrarem-se fotos nas redes sociais. Eu não me admiraria que um dia Lisboa desenvolvesse um turismo sazonal de reconhecimento mundial só para visitar a cidade quando as árvores estão em flor. Turismo desse tipo é comum noutros países: as tulipas na Holanda, as cerejeiras em flor no Japão e em Washington D.C., a folhagem de outono na Nova Inglaterra, etc. Ou seja, quem é a alma que achou que isto ia ser uma boa ideia? 
  3. O país vai a eleições em breve. Quem é que decide ir para a frente com um projecto que é óbvio que não vai ser popular meses antes de eleições? Ainda por cima cortar árvores vistosas para enfiar mais outro parque de estacionamento, como se esse parque fosse fazer uma enorme diferença. 

sábado, 5 de abril de 2025

A vermos grego

Agora entrámos mesmo na dinâmica de uma Administração Trump, com ele a todo o gás em direção ao abismo ao mesmo tempo que metade do país lida com a situação através de comédia ou da ridicularização dos acontecimentos.

No caso das tarifas a comédia tem sido fenomenal, não só porque Trump impôs tarifas a ilhas sem habitantes humanos, mas também atingiu uma ilha com apenas uma base militar com pessoal americano e britânico. O James Surowiecki, que eu acho um dos melhores escritores de peças de opinião sobre a economia, descortinou a metodologia de Trump que, aparentemente, é algo que é sugerido pelos algoritmos de inteligência artificial (isto da inteligência artificial merecia um post, mas tenho andado preguiçosa). 

Em resposta ao Gotcha, a administração divulgou uma fórmula matemática manhosa cheia de letras gregas, em que dois dos parâmetros se cancelam e no fim ficamos apenas com o rácio do défice comercial dos EUA com um país dividido pelo volume de exportações de bens desse país para os EUA--esse rácio é o que Trump denota de tarifas e outras barreiras comerciais actuais cobradas aos EUA, mas obviamente que não é tarifa nenhuma.

Quanto ao valor lúdico do caos actual, acho que estamos conversados. Resta apenas dar uns passos atrás e ver o contexto mundial de forma objectiva. Em 2024, a economia americana representava 26% do PIB mundial--é enorme, apesar de a proporção já ter sido mais alta. Ao contrário do que os europeus pensam, o nível de vida americano é bastante alto e consome muitos recursos. 

Por exemplo, no outro dia, tive um jantar da minha vizinhança e uma das organizadoras dizia que, para facilitar a vida à senhora onde o jantar se iria realizar, ela ia comprar pratos, copos, e talheres de plástico, daqueles a imitar vidro e cerâmica que depois se deitam fora, para assim não se ter de lavar loiça. Super-comum nos EUA. Há famílias que só comem de pratos descartáveis, apesar de toda a gente ter máquina de lavar louça. E isto é apenas um exemplo de muitos. Para além de ser péssimo para o ambiente é mau para a alocação mundial de recursos--grande parte da economia mundial serve as preferências americanas, mas as políticas de Trump irão ajudar a modificar algum deste comportamento. 

Estas políticas apesar de péssimas para os americanos não têm necessariamente de ser más para o resto do mundo porque os americanos ao perderem poder de compra irão colocar menos pressão nos recursos mundiais, o que deflaciona os preços para o resto do mundo, dado que a economia americana era tão grande e irá encolher imenso. Se Trump avançar com tudo o que ele já começou, não me admiraria se encolhesse mais de 10% e, se calhar, 20% é ser conservador. 

O capital já está a fugir para a Europa depois de anos em que saía da Europa para alimentar a bolsa americana. Desde que a Europa aja de forma fria e contida, irá atrair capital, investimento e turismo. E com as modificações da política de imigração americana, a Europa também tem a oportunidade de atrair cérebros e mão-de-obra (bem sei, os portugueses têm horror a imigrantes porque são xenófobos: a população portuguesa mal tem aumentado, ou seja, os que entram compensam os que saem; o que há é mais pessoas em algumas cidades porque a infraestrutura é má em sítios mais pequenos, mas é natural que tal seja temporário).  Não nos podemos esquecer que os americanos beneficiaram imenso, no século passado, da fuga de cientistas e outros quadros superiores da Europa para os EUA. Agora o oposto pode acontecer. Há bastante potencial para a Europa crescer mais depressa e o euro ficar mais forte como moeda de reserva.

Há uma enorme nuvem na economia mundial que é a questão das criptomoedas. Acho provável que à medida de as pessoas entram em pânico, haverá mais fuga de capitais desses "activos" que apenas têm valor especulativo, o que pode causar uma séria crise financeira mundial para além dos problemas que o Trump já está a criar.

Como se dizia durante a crise subprime: as crises são oportunidades. Pena que Portugal nem governo tenha. Se continuar assim, fica ainda mais atrasado.

domingo, 30 de março de 2025

Suspense

A queda do domínio económico dos EUA soma e segue. O nível de incerteza está ao rubro e os métodos tradicionais de gestão de risco são, no mínimo, desadequados. Vale a pena destacar a Segurança Social, que está um caos. A Administração Trump já indicou que tal não é problemático e que quem se queixa de não receber dinheiro se calhar cometia fraude--daqui a uns dias, vamos ver quem não recebe o mês de Abril. 

Em meados de Abril vai também ser finalizada a lista de pessoal que será eliminado da função pública federal, ou seja, vão recomeçar os despedimentos em massa e, naturalmente, à medida que as coisas deixam de ser feitas, veremos se realmente despediram pessoas "supérfluas" ou não. Para ajudar a festa, no sector privado, algumas empresas também planeiam despedimentos e até há uma página de Internet que está a fazer a compilação dos layoffs do governo federal e de empresas de tecnologia. 

Em termos de política de imigração também já houve progresso: como não era suficiente assediar imigrantes ilegais, agora a administração decidiu ir atrás dos imigrantes legais. Pelas redes sociais multiplicam-se vídeos a informar os cidadãos de quais os seu direitos e qual a melhor forma de agir se forem interpelados por agentes da autoridade. Não me surpreenderia no mínimo se também começassem a ir atrás de cidadãos americanos naturalizados, dado que já falaram em retirar a cidadania a quem nasceu nos EUA, logo tem cidadania americana, mas é filho de imigrantes ilegais. 

No século passado, os EUA "repatriaram" cidadãos americanos de ascendência mexicana nos anos 30; prenderam em campos de internamento cidadãos americanos de ascendência japonesa nos anos 40; depois também houve a perseguição de comunistas por McCarthy nos anos 50; e, claro, há ainda o tratamento de cidadãos americanos de ascendência africana, que ainda deixa muito a desejar. Ou seja, nada do que se passa agora é anormal; até poderíamos argumentar que o anormal foi o período de "relativa paz ou progresso social" interrompido por Trump. 

domingo, 9 de março de 2025

Fase do bisturi

Passámos da fase do serrote à fase do bisturi porque o pessoal não "gostou" do que ele estava a fazer porque acharam o exercício demasiado aleatório. Claro que se ele não tivesse feito nada, estas pessoas diriam que o governo federal não criava valor nenhum e tudo o que fazia era desperdício, logo corte-se à vontade, que foi a campanha de Trump. 

A fase do bisturi é mais perigosa do que a do serrote porque não é tão visível. É como aquelas pessoas que um dia acordam e notam que têm uma dorzita e, vão a ver, e roubaram-lhes vários orgãos ou enfiaram-lhes um quilo de drogas no abdómen com ajuda de um bisturi. Se lhes tivessem serrado um braço com um serrote era mais visível e ainda dava para ir ao hospital tentar salvar a coisa. Mas a ignorância dá conforto a muita gente, por isso é assim que vamos para a frente, às cegas.

A última estimativa do PIB do primeiro trimestre, datada de 6 de Março, continua negativa, mas em vez de se estimar diminuir 2.8% versus 2024T4, melhorou para -2.4%, que é o que eu chamaria de "dead cat bounce". No dia 17 actualiza outra vez e já começam a aparecer dados de Fevereiro, pois sai o Advance Retail Sales (vendas a retalho preliminares) de Fevereiro; sai também a actualização das vendas e os níveis de inventário de Janeiro. E depois actualiza outra vez no dia 18. 



terça-feira, 4 de março de 2025

Nem o zero nos salva!

Saiu mais uma actualização da estimativa do PIB americano na Segunda-feira e a taxa de crescimento baixou de -1,5% to -2,8%. Parte do efeito tem a ver com muitas empresas estarem na expectativa de nova guerra comercial e começaram logo a preparar-se para essa eventualidade, mas também é verdade que Trump e Musk não perderam muito tempo para iniciar hostilidades para com a economia americana. 


"The GDPNow model estimate for real GDP growth (seasonally adjusted annual rate) in the first quarter of 2025 is -2.8 percent on March 3, down from -1.5 percent on February 28. After this morning’s releases from the US Census Bureau and the Institute for Supply Management, the nowcast of first-quarter real personal consumption expenditures growth and real private fixed investment growth fell from 1.3 percent and 3.5 percent, respectively, to 0.0 percent and 0.1 percent." 

Fonte: Atlanta Fed

Tenho de confessar outra vez a enorme admiração que tenho pela forma como os EUA estão organizados: é mesmo "a government of the people for the people." Em poucos dias é informação pública os resultados do que eles estão a fazer, os media estão a funcionar, os dados estão a sair, e os mercados estão a começar a reagir, apesar do enorme ataque que está a ser feito ao governo federal. E daqui a uns dias, quando as pessoas começarem a ver as contas de investimento e poupança-reforma a diminuir, os telefones em Washington não vão parar. Duvido que os membros do Congresso consigam regressar aos seus estados sem serem assaltados por um milhão de perguntas, isto se não forem corridos a tiro. Afinal, as armas servem para alguma coisa. Eu sou contra o uso de armas, mas quem com o ferro fere com o ferro será ferido. É como o Einstein dizia: "God does not play dice with the universe" e nós também somos parte do universo.

E por falar em jogos, o Gary Kasparov publicou uma peça de opinião super-interessante na revista The Atlantic, na qual diz que a pressa de Musk e Trump revela um calculismo perigoso. Eu acho que a preferência pela rapidez é mais circunstancial do que calculada e é inata a estes dois personagens: o Trump porque está interessado em criar atenção 24/7, pois era isso que lhe dava dinheiro nos reality shows; o Musk também já agia assim de antemão como ficou bem ilustrado pelo seu desempenho no Twitter. Se eles tivessem agido de forma mais lenta e calculada, os efeitos do que estavam a fazer seriam menos claros e penso que seria bem mais perigoso. 

O NYT publicou um artigo acerca de como surgiu o DOGE que também recomendo e onde sugere que Musk quer substituir o governo por Inteligência Artificial. Só que ele está a despedir e a eliminar muitas funções que recolhem dados que depois se tornam públicos. O governo americano presta ajuda a cidadãos e empresas, mas em troca exige que estes lhe forneçam dados--muitas pessoas desconhecem este pequeno, mas bastante importante detalhe. Sem dados públicos não há IA e é por isso que é mais fácil para a IA ser treinada em letras do que em economia. Os livros estão muito melhor organizados e disponíveis do que os dados de economia. 

Mas Musk já cometeu este erro antes: Musk tinha acesso a bastante informação que era publicada no Twitter e que podia ser minada, mas como alienou os utilizadores, estes sairam ou deixaram de publicar, logo o valor do Twitter como prestador de informação diminuiu. Agora está prestes a fazer uma coisa semelhante com os dados do governo federal.

É bom que eles partam tudo. Por um lado, porque assim é mais provável que não aguentem o barco durante quatro anos a fazer coisas destas, logo livramo-nos de boa. Depois, o mundo está mais bem preparado para uma crise, pois durante a crise sub-prime muitos bancos centrais em todo o mundo contrataram pessoas com enfoque em macroeconomia e modelos que simulam a economia, logo ao menos a nível da política monetária há talento com década e meia de experiência que nos pode guiar nestes tempos tão incertos.  Depois, isto vai doer tanto que é natural que os Democratas sejam eleitos durante 8 anos e construam um sistema novo, como aconteceu quando Hoover perdeu a reeleições e Roosevelt foi eleito por dois termos consecutivos. Vale a pena ler sobre a governação de Hoover. E sim, estou a contar com este episódio levar a uma depressão da economia.


segunda-feira, 3 de março de 2025

Gente fina, finalmente!

No Sábado, fui fazer mais 3,5 horas de voluntariado no Victory Garden de Collierville; no total éramos 22 voluntários. (Preciso de completar 40 horas antes de Agosto para ter a certificação de Master Gardener.) Plantámos cebolas, alface, couve, nabos, rabanetes, e acelga suíça. Enquanto trabalhávamos, estávamos em amena cavaqueira: era o tempo que anda estranho com tempestades frígidas anuais que destroem árvores, arbustos, e outras plantas perenes; o sítio em que tínhamos nascido; os estados em que já tínhamos vivido, há quanto tempo estávamos em Memphis; se era melhor água da chuva armazenada ou fresca para regar (não chegámos a acordo), etc. 

Uma das voluntárias teve um neto recentemente: um bebé que nasceu quatro semanas prematuro e que passou cinco dias em cuidados intensivos, mas já está em casa. A avó mencionou várias vezes (eu ouvi-a pelo menos duas) que estava com receio de apanhar sarampo e transmitir ao neto,  pois estava prestes a apanhar o avião para o ir visitar em Boston. Para quem não sabe, os EUA estão com um surto de sarampo que começou em Lubbock, West Texas, numa comunidade menonita que não vacina as crianças. Entretanto, mais pessoas apanharam um pouco por todo o país, e uma das crianças até já morreu, mas é difícil saber a verdadeira dimensão do problema por causa de Trump et al. 

Acho extremamente provável que se desencadeie um número bastante maior de casos, o que seria bastante sério para os americanos porque há muitas pessoas que nunca tiveram ou não estão vacinadas. É o preço de se ser mais desenvolvido do que Portugal: eu fui vacinada e, mesmo assim, tive porque quase todos os miúdos tinham naquela altura e as mães até queriam que tivessem. A minha mãe não fez esforço nenhum para eu ter e a minha avó, que cuidava de mim, nem gostava que eu brincasse com outras crianças, logo é um bocado misterioso como apanhei. O certo é que o médico disse que ainda bem que eu estava vacinada porque foi bastante forte. A boa notícia é que agora estou imune. 

Com o pessoal ainda saturado da pandemia COVID, poucas pessoas andam a ligar aos casos de sarampo. A notícia actual de maior importância é o falhanço de um acordo entre os EUA e a Ucrânia. Apesar de eu ser americana, não apoio a posição dos EUA e fiquei feliz que a Europa tivesse finalmente mostrado alguma capacidade de liderança. Num ápice, os europeus reuniram-se, comprometeram-se a gastar mais dinheiro para ajudar a Ucrânia, e até disseram que o objectivo era terminar com a guerra para poderem entrar em acordo com os EUA. Faz lembrar aquela definição de diplomacia: 'Diplomacy is the art of telling people to fuck off in such a way they look forward to the journey.' Gente fina é outra coisa! 


sábado, 1 de março de 2025

GDPNow

A Reserva Federal de Atlanta tem um modelo que tenta estimar o PIB americano quase em tempo real, o GDPnow, que é um nowcast em vez de um forecast. Assim que sai um relatório que entra no modelo, a estimativa trimestral do PIB -- neste caso, o PIB do primeiro trimestre de 2025, que vai de Janeiro a Março -- é actualizada. 

Ontem, a estimativa tinha o PIB americano a crescer a 2.3%. Hoje saiu o Personal Income and Outlays (é um relatório do U.S. Bureau of Economic Analysis) e o crescimento do PIB depois do modelo actualizado ficou em -1,5% (uma redução de 1,5%). Na segunda-feira, vai sair mais outro relatório, e a estimativa do PIB irá ser novamente revista. (A primeira metade do mês costuma ter bastantes relatórios mensais que saem nos EUA.)

Os dados dos relatórios que estão a sair correspondem à actividade de Janeiro e só saltou a tampa ao Trump a 31 de Janeiro, ou seja, Fevereiro tem dados bem piores, mas só saberemos a partir do final de Março e, nessa altura, o PIB do primeiro trimestre já estará feito.


Wall Street ainda está meio a dormir. Dizia um analista da UBS à Bloomberg, que o bull market estava intacto--famous last words:
“We think the bull market is intact. But we have also cautioned that volatility would likely be higher this year,” said David Lefkowitz at UBS Global Wealth Management. “Therefore, we have been highlighting that short-term hedges may be worth considering.”
Fonte: Bloomberg

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2025

A desordem

Antes da Grande Depressão era comum haver crises financeiras nos EUA e descoordenação de políticas governamentais, e, muitas vezes, as próprias políticas serviram como desestabilizadores da economia americana. Com a introdução de estabilizadores automáticos na economia, através da criação de uma "safety net", que é essencialmente uma forma de manutenção de um consumo mínimo da economia, a duração e profundidade das crises atenuou-se. Talvez a expressão máxima deste fenómeno tenha sido a forma tão rápida como a economia americana recuperou da pandemia.

Toda essa infraestrutura de suporte da economia está a ser desmantelada pela administração Trump e, para além disso, todo o aparatus federal que facilita negócios, como as garantias do governo federal para obtenção de seguros em zonas de risco de catátrofe, ou até de financiamento na obtenção de casa está sob ameaça. Até o pessoal dos parques naturais responsável por encontrar pessoas perdidas ou que tenham sofrido acidentes, está a ser despedido, porque não é considerado essencial.

O pessoal do Internal Revenue Service vai ser reduzido durante a época alta de processamento de impostos de rendimento. A FEMA (Federal Emergency Management Agency), que foi o calcanhar de Aquiles de George W. Bush por causa das falhas de resopsta ao furacão Katrina, também vai sofrer cortes com a época de tornados praticamente aí, e a 1 de Junho a começar a época de furacões. Na agricultura, a USAID não vai comprar as commodities americanas que servem para apoiar os países mais pobres, mas mais cortes são previstos. Depois há também o detalhe de o governo federal americano recolher e produzir dados e relatórios que medem a actividade económica e as condições reais não só nos EUA, como em outros países, sendo provável que muitos desses relatórios e dados tenham os dias contados devido aos cortes no pessoal de tantas agências.

Os meus contactos em universidades americanas, indicaram-me que as universidades e pequenas empresas ligadas a pessoal das universidades que dependem de financiamento para investigação e disseminação de informação científica já começaram a cortar pessoal e em gastos de viagens e contratação de pessoal. Na semana passada, foi anunciado que Trump vai despedir os directores do serviço postal nacional (USPS) e vai colocar o serviço sob o Departament of Commerce.

Os americanos não conseguem funcionar assim, pois é um povo que gasta imenso dinheiro em recolha e analise de dados e gestão de risco. Quando estas medidas de Trump e Musk começarem a ser sentidas em termos de incerteza, a actividade econonómica irá desacelerar e talvez até parar. Na Sexta-feira, o processo pode já ter começado: os primeiros relatórios de entidades privadas que tentam antecipar os relatórios oficiais do governo americano já indicam que a actividade econonómica está a desacelerar.

O último inquérito de actividade da S&P indica que a actividade económica expandiu mais lentamente, a um nível equiparável ao de Setembro de 2023. O inquérito das expectativas de inflação dos consumidores aceleraram para 3.5%, o nível mais alto dos últimos 30 anos. O mercado accionista fechou em queda e os bonds, que oferecem mais estabilidade, em alta (yields das treasuries baixaram, logo o seu preço aumentou). Esta semana é provável que a correcção continue, dado que Musk irá continuar a despedir funcionários públicos federais (na Sexta-feira enviou outro email a pedir que os empregados indiquem o que fazem para que seja avaliado se devem ficar no emprego), para além da retórica de entrave ao comércio internacional de Trump.

A administração também está a tentar fazer mudanças em entidades que são consideradas independentes do poder executivo, o que levanta a possibilidade de haver mudanças a nível da Reserva Federal e afectando a política monetária americana. Com os despedimentos da função pública, qualquer implementação da política fiscal está comprometida. Mesmo que daqui a semanas ou meses haja vontade de passar políticas fiscais de apoio à economia, não há como as concretizar. Aguarda-nos caos e desordem, mas pode ser que algumas pessoas consigam *finalmente* entender o papel do governo federal na economia americana.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2025

Um oitavo de polegada

Ontem de manhã telefonou-me uma amiga que votou no Trump e que eu tenho evitado porque não sei o que pensar. Não sei se deva ter pena ou se deva ficar zangada com estas pessoas. Tentei ser seca e evasiva, até que ela me perguntou da economia e eu não me contive e disse que achava que estavamos prestes a ter uma crise enorme. Ela responde que não, que acha que as taxas de juro até vão baixar. Claro que não, disse eu, porque a política de comércio internacional de Trump é inflacionista. Ah mas o Trump vai acabar com o desperdício, responde-me.

É verdade que há desperdício, mas o governo federal também gasta imenso dinheiro em controle de desperdício; aliás o custo de encontrar e controlar desperdício no governo federal é mais alto do que o desperdício que ocorre e que se evita. Nesta administração, acha-se que o remédio para se eliminar desperdício é parar tudo: já se começou a despedir a função pública e a suspender gastos em investigação, daqui a umas semanas é quase certo que nem toda a gente irá receber pensões, nem apoio financeiro para gastos médicos ou educação ou apoio a aquisição de casa, nem que se possa contar com o governo para assistência em caso de catástrofes naturais, etc. Ou seja, está a demantelar-se todo o sistema de controle de risco e de estabilização da economia americana que foi criado no último século.

Soltei os cães na minha amiga. Como é possível ainda no outro dia ela me ter perguntado porque é que não há investigação médica para certas doenças de mulheres e ela votar num traste como o Trump, é a terceira vez que vota nele, não me pode dizer que não gosta do homem. Só que não gostava do Biden e será que eu achava melhor que ela não votasse. O Biden não era o candidato, respondi-lhe, eu também não gosto dele e não votei nele nas primárias. Mas ela também não gostava da Kamala e não gosta do Trump, mas o Trump era um oitavo de polegada (3,18 mm) melhor do que os outros e vai tudo correr bem.

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

O elefante e a porcelana

Há uma expressão em inglês da qual gosto muito: an elephant in a china shop, i.e., um elefante numa loja de porcelana. É isso o que os primeiros dias da segunda Administração Trump têm sido. A forma como se está a atacar o funcionamento do governo federal é completamente desastrosa. As pessoas que elegeram Trump não têm noção do papel do governo federal na economia e na vida dos americanos. É de propósito que há uma certa obscuridade acerca de como as coisas funcionam, mas também há um nível de ignorância que roça a estupidez, como ilustra o facto de ser comum ver em manifestações de pessoas anti-governo ver cartazes com "Stay out of my Medicare", como se o Medicare, o programa que fornece seguro de saúde aos reformados americanos, fosse um programa divino que tivesse caído do céu e não um produto do governo federal.

Não se pode dizer que o governo deferal seja um governo perfeito, mas não é a incompetência que dizem que é e nem sequer serve apenas os americanos. Os funcionários públicos dos EUA, no geral, são das pessoas mais prestáveis e com sentido de missão. Muito deles foram voluntários em programas como o Peace Corps, em que foram para outros países para trabalhar com pessoas desfavorecidas, aprenderam outras línguas, fizeram amigos de outras culturas, etc. Nos EUA, quase ninguém sai da escola e consegue um bom emprego se não demonstrar ter uma consciência social. Isto apesar de o resto do mundo ver os americanos como uns capitalistas selvagens, sem ponta de dever cívico.

Talvez a melhor forma de ver como o resto do mundo beneficia do que os EUA fazem e estão a deixar de fazer seja mesmo suspender tudo e atirar o país e o resto do mundo para o caos. Na primeira vez que Trump governou, houve oposição que apenas impediu que as pessoas vissem as verdadeiras consequências do que Trump propunha e niguém aprendeu a lição, logo talvez assim consigamos sair deste tipo de "groundhog day". Não vai ser um processo agradável, mas dá para ver que há pessoas que vão acabar bastante mal e não acho que sejam os coitados do costume.

E quem vai salvar o país? Obviamente que vai ser o sistem financeiro, tal como aconteceu quando a Administração Bush passou anos a abusar do poder. Talvez as pessoas já se tenham esquecido do caso de Valerie Plame, por exemplo, uma agente secreta da CIA cuja identidade foi revelada por motivos políticos pelo gabinete do VP Dick Cheney. E claro, a invasão do Iraque, e outros episódios mais. Na altura, o mundo ergueu-se contra os EUA, mas se não tivesse havido o crash de 2008, duvido que o mundo tivesse ficado melhor. Aguardemos o crash.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Uma semana que vale anos

Começámos a semana com notícia de que os pagamentos do governo federal estavam congelados, mas passado um dia Trump teve de mudar de ideias. O General Mark Milley, que se opôs a Trump durante o primeiro termo, irá ser investigado e provavelmente vai ser despromovido. Depois veio a notícia na Quarta-feira de que os funcionários públicos federais tinham recebido um e-mail com um convite para se reformarem; funcionou tão bem com o Twitter, que o Musk repetiu a dose. Nessa noite, deu-se o acidente aéreo que pasou para o primeiro plano das notícias ontem.

Entretanto, as audiências já retomaram o foco em Trump: os agentes do FBI que tenham estado envolvidos em investigações relacionadas com Trump vão ser despedidos. Foi também anunciado que amanhã é o início oficial da nova guerra comercial; os alvos serão a China, o México, e o Canadá. Há uns minutos também saiu a notícia que o Justive Department despediu os "prossecutors" envolvidos na investigação do golpe de 6 de Janeiro de 2020. E ainda temos mais umas horinhas antes de terminar Sexta-feira.

O Warren Buffet já mudou o portefólio para dinheiro e mandou as acções à fava por uns tempos. Está à espera que o mercado entre em saldo, o que me parece não ter de demorar muito.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Nem com capa se escapa

Ainda não completámos o terceiro dia da segunda administração Trump, mas já se nota que é diferente da primeira. Em vez de oposição, há uma certa resignação de que temos de aguentar com a peça até ao final do termo. Como ele tem o Congresso, a maior oposição irá vir dos estados e das cidades. Se ele conseguir passar cortes de impostos e despesa, os mais afectados, negativamente, diga-se, serão os estados que votam no Partido Republicano porque são os que crescem menos e recebem mais transferências do governo federal. Mas por vontade da fortuna, Los Angeles, devido aos incêndios, terá de pedir ajuda ao governo federal para a reconstrução e decerto que Trump se rogará.

Os incêndios de Los Angeles poderão dominar esta presidência dada a escala da tragédia e o facto de as perdas para as seguradoras serem bastante significativas, logo haverá transferências da indústria seguradora [os hubs da indústria seguradora nos EUA são Des Moines (Iowa), Hartford (Connecticut), e Phoenix (Arizona), mas indirectamente gente de todo o sítio porque há instrumentos financeiros ligados a estas apólices cujo objectivo é mesmo esse: dispersar o risco] para as vítimas na Califórnia. O mais provável é que, depois de receberem as indemnizações, muitas das vítimas irão aproveitar e sair da Califórnia. Algumas ficarão nos EUA, mas outras poderão sair do país. E isto a juntar aos que sairão porque não querem viver nos EUA de Trump.

A juntar a isto, Trump parece estar interessado em promover as indústrias da inteligência artificial e a das criptomoedas, logo podemos contar com uma ou duas bolhas que devido ao efeito acelerador de Trump ainda devem estourar durante o seu mandato. Pessoalmente, não sou fã de nenhuma destas duas indústrias, mas não há como escapar.

terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Um caco, mas...

Há mais de 20 anos que não passava tanto tempo em Coimbra, que continua um completo caco. A minha mãe achava que era uma cidade belíssima, mas o fado diz que o seu encanto é maior na hora da despedida. Efectivamente, não penso que é o sítio que é encantador, mas talvez a ideia de lá se ter estado ou, no meu caso, cresci lá quando ainda havia coisas bastante bonitas, mas eu tenho um imenso fraco por espaços verdes e lembro-me de ir com o meu avô passear pelo parque à beira rio para andar nos baloiços e sentir-me super-orgulhosa de conseguir manter o baloiço em movimento sem ajuda dos adultos. Devia ter uns três ou quatro anos.

Nota-se que os actuais residentes também fogem da cidade: pouca gente anda pela Baixa e os sítios mais dinâmicos são ao pé de centros comerciais estilo americano, que ficam no que antes eram arredores. Não sei se alguma vez voltará a ser uma cidade com uma Baixa a sério, mas tenho especial apreço pela Loja das Meias que ainda não desistiu da sua localização na R. Ferreira Borges.

É um bocado misterioso como é que, num país e cidade com tantas regras e impedimentos legais, é possível haver uma cidade sem qualquer planeamento urbano. Os prédios são erigidos ao calhas, os espaços verdes são insuficientes ou inexistentes e os que existem não servem qualquer função para além de ocupar espaço. Os jardins de outrora como o Parque Manuel Braga à beira rio ou o Jardim da Sereia continuam uma sombra do que já foram. Também se destruíram os canteiros no Largo da Portagem, e os da Avenida Sá da Bandeira idem. A calçada está danificada em vários sítios, por exemplo, na R. Lourenço de Almeida Azevedo, algumas almas empreendedoras decidiram colocar cimento a tapar alguns dos buracos das calçadas.

Depois, continua-se com a circulação rodoviária na Baixa da cidade completamente ilógica. Deus nos livre de haver um acidente grave ou um incêndio na Baixa porque os carros de bombeiros e ambulâncias demorarão mais do dobro do tempo necessário a chegar ao local do sinistro. Claro que talvez tentem salvar as vitimas indo em sentido contrário, se tiverem espaço.

Mas houve algum progresso. Finalmente, os prédios à beira rio cuja obra estava há décadas embargada foram terminados, um absurdo ter demorado tanto tempo a resolver o assunto. Também parece que vai haver mesmo um metro que afinal é uma carreira (não tem nada a ver comigo) de autocarros porque não há dinheiro para fazer um metro a sério, apesar de se ter andado a estudar o assunto há décadas com gente muito bem paga.

E, finalmente, há um Centro de Arte Contemporânea de Coimbra, criado em 2020, ao pé do Arco de Almedina. Gostei bastante da ideia, só é pena quase ninguém o visitar porque passa despercebido, mas dizem que está num espaço temporário. Idem para o Museu Municipal de Coimbra -- Edifício Chiado, mesmo ao pé, mas a esse vou lá sempre que passo pela cidade porque alguém tem de apoiar a iniciativa e é um sítio simpático para além de ser um edifício bastante icónico da Baixa de Coimbra, desenhado pelo atelier do Eiffel. Misteriosamente, para entrar nestes dois estabelecimentos tem de se pagar com cartão multibanco português ou dinheiro porque a máquina não aceita cartões estrangeiros.

Sim, é uma cidade universitária, mas talvez na era da inteligência artificial consiga untrapassar os limites da natural.