domingo, 26 de dezembro de 2021

Wish you were here

Sexta-feira, 24 de Dezembro, não foi dia de trabalho. Quando os feriados calham ao Sábado nos EUA, tira-se a Sexta-feira. Talvez por isso não houvesse grande trânsito na auto-estrada e consegui fazer a viagem de Memphis a Houston em pouco mais de 9 horas de carro, com apenas duas paragens. Entre Memphis e Little Rock havia muito poucos camiões, o que é bastante anormal -- este curto percurso faz-se em duas horas, mas é dos mais desagradáveis que conheço.

Não fiz nada de produtivo durante a viagem; às vezes, falo ao telefone ou ouço livros em audio; desta vez, apenas ouvi música e apreciei a paisagem. As árvores estão nuas e, apesar da claridade do dia, parece que o manto de escuridão da noite as cobre. O azul do céu salpicado de núvens recorda-me sempre de "O Império da Luz," um dos meus quadros preferidos.

Durante as minhas paragens em bombas de gasolina, vi muito poucas pessoas de máscara, o que me pareceu um presságio do que estava para vir. A ideia original de passar o Natal com uma das minhas amigas portuguesas foi da mãe dela, que a sugeriu em Outubro. Para mim tinha um significado especial porque a última vez que estive com portugueses pelo Natal foi em 1998, quando visitei os meus pais.

Ah, a discriminação. Falo tanto dos meus amigos e das minhas coisas portuguesas aos meus amigos americanos, que na semana passada calhou a minha vizinha usar-me como exemplo de discriminação, logo não é de estranhar que os brancos procurem outros brancos, se a Rita de Portugal procura outros portugueses, apesar de estar longe de Portugal.

O nosso vizinho, que estava de visita, deu uma perspectiva romântica do que eu procuro, dado que o meu Portugal é uma coisa agradável, a comida é muito boa, os meus amigos portugueses são pessoas que eu adoro e que me adoram, ou seja, o meu estilo de vida é desejável. Quem cresce nos ghettos não deseja lá regressar, dizia ele, em vez do familiar, essas pessoas procuram o que lhes é estranho.

A minha procura do conforto nacionalista não correu como previsto porque um dos nossos amigos portugueses que ia passar o Natal connosco testou positivo e depois dele--mais um das minhas relações próximas que ficou infectado,-- que é uma pessoa extremamente cuidadosa e que não faz ideia de como tenha apanhado, pareceu-me que estava tudo perdido. Vamos apanhar todos, sei lá se já tenho ou tive.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Maldita fome

Ontem fez uma semana que magoei um dos meus dedos. Não reparei que uma caneca que se partiu tinha espalhado alguns pedaços de vidrado pela borda do lava-louça e, quando estava a arrumar a cozinha, um pedaço alojou-se no dedo do meio da mão direita. E ainda cá está. Calhou que isto aconteceu na véspera do meu exame médico anual, mas a médica não quiz fazer nada porque não conseguia ver onde estava o "objecto estranho" e dizia-me que a ponta de um dedo tem muitos nervos e é um sítio muito doloroso, logo tinha receio de me magoar. Mandou-me aguardar uns dias a ver se a coisa saía sozinha; senão, recebi instruções de lhe enviar um email a pedir para me marcar uma consulta para um especialista de mãos. Acho que não vai ser preciso porque já vejo a ponta do vidrado perto da pele, logo penso que está a sair.

Durante a consulta, viu o meu ficheiro e ficou satisfeita que as minhas vacinas estavam todas em dia. Disse-lhe que só ia tomar o reforço anti-Covid em Março e ela achou bem. Perguntou-me acerca da minha dieta, o que foi novidade, e relatei o que comia e o que não comia -- abdiquei de quase todos os cereais porque me sinto melhor assim. Há um ano, tinha-me dado indicação para modificar a dieta porque o colesterol estava muito alto e, por acaso, naquela altura andava a comer bastantes ovos, o que não é normal para mim.

Quanto ao teste do Papanicolau, como fiz no ano passado, não preciso de repetir por uns anos. Restou apenas o mamograma, mas como tenho uma fibroide no peito esquerdo, as instruções dos técnicos é que tenho de fazer uma ecografia para acompanhar o mamograma. Aquiesci, apesar de custar $900 a ecografia, mas eu coloco $3500 ($750 é contribuição do meu patrão) por ano numa conta poupança-saúde (esse dinheiro não paga impostos) para estas eventualidades. Detesto gastar dinheiro em médicos.

No fim, mandou-me para o laboratório para fazer análises. Estava eu sentada na sala de espera quando do outro lado do corredor chega um homem branco 11 anos mais velho do que eu. Calhou eu ficar com a técnica de raça branca e ele com a técnica de raça negra. Sentei-me, dei o meu nome e a minha data de nascimento, virei a cara para o outro lado, e tentei ignorar a picada. Do outro lado da sala, o meu companheiro de tortura começou a refilar que ia ficar com uma nódoa negra porque a técnica tinha feito asneira com a seringa.

Fiquei duplamente chateada: primeiro por ter de o aturar, apesar de ele não estar a falar para mim; depois porque eu não disse nada para a defender. Eu já apanhei aquela técnica e ela nunca me deu uma nódoa negra, nem nunca achei que tivesse sido mal-atendida. Concluo que não estava no meu melhor: é no que dá ir em jejum para estas coisas. Para a próxima não posso ficar calada, mesmo se estiver com fome.

domingo, 19 de dezembro de 2021

Empobrecimento generalizado

Finalmente, ao fim de 13 anos de políticas monetárias muito acomodativas a nível mundial, temos inflação. Ou seja, a política monetária tem muito pouco a ver com a coisa. A política fiscal de resposta à pandemia foi bastante generosa e pode ter ajudado a recuperar os níveis da procura, mas a grande causa da inflação que sentimos deve-se ao ajustamento da cadeia de distribuição.

O facto de a economia mundial ter praticamente parado em 2020, o uso de encomendas via Internet ter disparado, os sucessivos confinamentos, inclusive em países asiáticos que há décadas exportavam deflação, e a flexibilização do mercado de trabalho -- a economia dos biscates -- levaram a que os preços aumentassem para que os recursos fossem racionados e também para sinalizar aos consumidores e produtores qual a melhor alocação de recursos.

Infelizmente para Portugal, isto são péssimas notícias pois acelera o processo de empobrecimento do país ainda mais. Não basta os preços aumentarem, o que encarece as importações, mas a pressão para aumento dos salários no estrangeiro irá atrair mão-de-obra portuguesa. Ainda hoje falei com uma senhora que recruta pessoas na área de IT que me dizia que as empresas com quem ela trabalhava nos EUA estão muito mais abertas a procurar empregados noutros países.

Perante o aceleramento da mudança nas economias mais desenvolvidas, em Portugal persiste a ideia generalizada de que a solução para os problemas do país é continuar as políticas falhadas que o levaram a um estado lamentável. Nem a aproximação de eleições inspira novas ideias, nem sequer há gente a sério. Nunca Portugal teve políticos com CVs tão pobres.

terça-feira, 14 de dezembro de 2021

Rancho ou Feijoada

Na semana passada, calhou fazer um estufado de grão de bico com frango que, não sei porque carga de água, me recordou de rancho. Já não pensava em rancho há mais de 25 anos. Não era uma comida que fosse frequente no repertório lá de casa e também não é das coisas em que pense e deseje, mas o inesperado aconteceu finalmente. Comecei a investigar as receitas de rancho nos meus livros de culinária e tirou-me o apetite: grão de bico, batatas, e macarrão. Este último não posso comer e não confio que as versões de massa feitas à base de tubérculos tenham a consistência necessária para aguentar o prato. Um outro inconveniente é que andar a comer grão de bico duas semanas seguidas parece-me enjoativo. Optei então por feijoada.

Durante o fim-de-semana recolhi os ingredientes necessários em dois supermercados (o primeiro não tinha toucinho) e lá fiz a minha feijoada no Domingo à tarde. Como fiz dose industrial, comprometi-me a fornecer o jantar à família da minha vizinha, que é a minha família de apoio durante a pandemia. Atrasei-me um bocado e só ficou pronto às 18:10, logo a mãe dela já tinha comido. Também estava com receio que a mãe comesse feijoada ao jantar porque é um prato pesado e ela está tão fraca e mais para lá do que para cá. Achei mais aconselhável que o prato fosse consumido durante o almoço de hoje.

Foi um sucesso: ao almoço comeu duas doses (feijoada com arroz branco, à boa maneira portuguesa) e ao jantar voltou a comer dado o sucesso do meio-dia e apesar das minhas reticências. Achei engraçado que um prato tão tipicamente potuguês lhe agradasse tanto, especialmente numa altura em que já tem tanta dificuldade em comer e beber. Não só acaba com fluídos nos pulmões, como muitas vezes recusa comida. Comprometi-me a fazer uma sopa para amanhã: vou meter carne de vaca, toucinho, batata, cenoura, nabo, e couve. Bem sei que é uma sopa inventada, mas é um bom veículo para ela consumir proteína e líquidos. E por lá gostam muito das minhas sopas.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2021

Masoquismo nacionalista

Contactei o Consulado em Washington, DC, para renovar o meu passaporte e cartão de cidadão. Responderam-me que tem de ser presencial e com marcação prévia. Falei então com um amigo meu português que vive lá para as bandas da capital americana, que me disse que só há uma funcionária e demora meses a tratarem das coisas.

Não faz sentido nenhum o governo português continuar com políticas que promovem tanta burocracia e atrasam os cidadãos. O mais patético é que andam a gastar dinheiro em campanhas nas redes sociais para investir em Portugal, o que é um perfeito disparate dado tudo o resto. Sem acesso a serviços consulares, as pessoas não podem fazer negócios em Portugal.

Quem já investiu pode continuar a pagar impostos em Portugal porque as obrigações nunca estão fora de prazo, apenas os direitos, como por exemplo o direito de eleger um governo. Não recebo emails a avisar-me de como exercer os meus direitos, mas todos os seis meses, sem falha, lá recebo a notificação do Portal das Finanças a dizer para não me esquecer de pagar o IMI.

Marcelo Rebelo de Sousa, na última campanha para as presidenciais, comprometeu-se a melhorar a situação do voto dos emigrantes. Até agora não fez absolutamente nada. A comunicação social também não lhe exigiu prestação de contas acerca do que (não) tem feito. É inconstitucional suspender os direitos de cidadania. Ele é que é o guardião da Constituição, logo cabe a ele exigir que os governos respeitem os direitos dos cidadãos.

E, ironia das ironias, vejo mais gente em Portugal preocupada com os direitos de voto dos americanos do que com os seus próprios direitos. A meu ver, no que diz respeito a conseguir exercer o direito de voto, Portugal é muito pior do que os EUA. Os americanos saem para a rua e manifestam-se na comunicação social para proteger quem tem os seus direitos atacados; os portugueses não só não saem, como atacam os concidadãos que se queixam. Que raio de masoquismo nacionalista nos aflige?

domingo, 12 de dezembro de 2021

Um dia estranho

Ontem de manhã, as janelas cá de casa estavam todas embaciadas. Achei estranho, mas não pensei mais no assunto e, como o dia ia estar ameno, decidi dedicar-me à jardinagem, dado que havia bastante para limpar e algumas plantas para transplantar. De vez em quando passava uma aragem forte e quente que dava vontade de abrir os braços e a sentir percorrer pelo corpo -- ovento do sul é o meu preferido. Já era quando eu vivia em Portugal.

A minha permanência no jardim impediu que os pássaros aparecessem para comer, até que já escurecia e uma fêmea cardinal voou pelo jardim fora apavorada, sendo perseguida por um gavião de Cooper. A coitada passou a vedação e deu meia-volta, mas foi contra uma janela e ficou meia-atordoada; não sei o que se passou a seguir, mas receio o pior. Quando abri a porta, nem a vi, nem o vi, apenas alguns pássaros voavam alto, como que em fuga. Quando ficou escuro, enquanto jantava, vi pássaros no jardim a comer sementes do chão, que caem dos comedouros.

Fui passear o Julian e no meu telefone davam indicação de estarmos sob alerta de tornado. Olhei para o céu e efectivamente, as nuvens indicavam que algo se passava. Não me recordo de ver algo assim em Memphis e nem é normal estas tempestades aparecerem em Dezembro, mas a temperatura alta -- chegaram a estar mais de 25,5° C -- e a humidade não deixavam dúvida que uma camada de ar quente do Golfo do México estava presa sob ar mais frio. Tirei uma foto da nuvem mais pituresca, regressámos a casa, e fui visitar a minha vizinha, onde estive cerca de uma hora.

À saída, havia trovoada para oeste e norte, mas só víamos os relâmpagos suficientemente longe para não se ouvir o trovão. As nuvens movimentavam-se rapidamente e havia vento forte. Quando cheguei ao meu pátio, a cadeira de madeira de dois lugares, que tinha uma cobertura impermeável, estava derrubada. Levantei-a e arranjei a mobília exterior de forma a que ficasse mais resistente ao vento.

Entretanto, os ramos abanavam nas árvores e o vento uivava. No jardim estava muito escuro para tirar vídeo, logo saí à rua para aproveitar a luz pública. Calhou que, enquanto filmava, a base do poste da bandeira que decora a casa dobrou-se com a força do vento e a bandeira ficou pendurada com o poste a bater na varanda. Como a minha casa tem imensas janelas, apressei-me a ir tirar a bandeira antes que fosse projectada por uma janela adentro. Pareceu-me mau sinal aquilo ter acontecido.

No telemóvel, as notificações indicavam que, no Arkansas, um lar de idosos tinha sido atingido por um tornado e havia fatalidades. Em Memphis e Shelby County, depois da meia-noite, o alerta de tornado foi modificado para aviso. Aconteceu que não acordei com as sirenes, trovoada, chuva torrencial, vento, alertas do telemóvel, etc., Passava das quatro da manhã quando regressei ao mundo dos vivos e vi que a noite tinha-se confirmado sido bastante perigosa. A minha vizinha tinha mandado um SMS a saber se eu estava bem. Ela e a irmã tinham colocado almofadas sobre a mãe e esconderam-se debaixo da cama de metal. Respondi que sim e aproveitei para meter um post no Facebook a avisar que estava tudo bem em minha casa. O pior da tempestade tinha passado a oeste de mim. Continuámos sob alerta de tornado e eu voltei a adormecer.

Felizmente correu tudo bem por aqui, mas muitos não tiveram tal sorte. Uma fábrica de velas no Kentucky parece ter tido mais de 100 fatalidades. Os governos locais já accionaram o governo do estado e o governador do Kentucky já disse que tinha pedido ajuda ao governo federal e tudo estava encaminhado. A Cruz Vermelha, a United Way, World Central Kitchen, e outras organizações de fins não-lucrativos também já iniciaram esforços para apoiar as pessoas afectadas.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2021

Competição e progresso

Quem duvida que a competição tenha benefícios pode ver como as coisas funcionam na questão de Covid-19. Ontem a Pfizer anunciou que a sua vacina permite alguma protecção contra a variante Omicron e já estão a trabalhar em modificar a fórmula para aumentar a protecção, logo daqui a curtos meses as novas vacinas serão mais eficazes. Como o meu plano é de levar uma vacina de reforço em Março, conto que as outras marcas sigam o mesmo processo. As minhas primeiras duas doses foram da Pfizer, logo quero levar uma vacina de marca diferente como reforço.

Espero que o governo português tenha um plano para as vacinas de reforço -- bem sei que o governo está de saída, mas isto não são coisas que se planeiam numa semana. O esforço inicial de vacinação foi começado há um ano, logo há que assegurar que esses primeiros vacinados tenham a vacina de reforço. Paralelamente, há que continuamente lembrar as pessoas das boas práticas pessoais na gestão do vírus e também liberalizar os horários do comércio e outros serviços para permitir uma melhor gestão do número de pessoas que frequenta o espaço público, para além de inovar na área da economia digital. O recurso aos chamados lockdowns só indica ignorância e falta de preparação.

Depois de dois anos de pandemia, a sociedade e a economia deviam conseguir funcionar relativamente bem, com um sistema flexível que permita uma adaptação mais rápida a novas condições, ou seja, algo que promova o progresso.

terça-feira, 7 de dezembro de 2021

O limite do que sabemos

Diz o NYT a propósito de Omicron que "Researchers in South Africa, where the variant is spreading quickly, say it may cause less serious Covid cases than other forms of the virus, but it is unclear whether that will hold true."

É muito difícil comparar a severidade desta variante com as anteriores porque os testes são ubíquos agora, logo é mais fácil encontrar casos, especialmente os não-sintomáticos. Antes, testava-se quem exibia certos sintomas, agora vai tudo a eito.

No que diz respeito à severidade, é relevante considerar que a população actual está truncada porque os mais susceptiveis já morreram com variantes anteriores, logo, temos uma população mais resistente. Dadas as taxas de vacinação e o número de recuperados, também podemos considerar um possível efeito de censura dos dados.

Ou seja, temos uma população com características muito diferentes do que tínhamos há um ano, logo temos de ter bastante cuidado com as conclusões que retiramos dos dados.

sábado, 4 de dezembro de 2021

Literalmente, um rabo gordo

A "literalidade" é capaz de ser um dos meus maiores defeitos, mas não acho que seja mesmo defeito, é apenas uma característica do meu cérebro, e muitas vezes quando ouço alguém falar, ou até quando leio, não percebo o que é dito. Depois há ainda outra dificuldade porque, à medida que o mundo se torna global, mesmo global, no sentido em que conhecemos e convivemos com pessoas de sítios muito diferentes, com quem podemos ter uma língua em comum, mas significados diferentes, a possibilidade de falhas na compreensão aumenta. Ruído é tudo o que impede a compreensão, dizia o meu livro de português do quinto ano de escolaridade.

Estava numa amena cavaqueira com uma amiga brasileira e deparei comigo muito encalhada na conversa. O tópico era homens e sexo, logo reconheço que estou em desvantagem -- claramente -- porque desde que mudei de Portugal, decerto que a língua mudou nestas conversas e depois há o detalhe de sermos de dois países diferentes. Ela falava em namorar e eu imaginava os idílios amorosos da minha juventude, se calhar mais inspirados pelo Camões, em que os elementos do casal olhavam um para o outro e o mundo estendia-se a seus pés. ã medida que a conversa fluía, salvo seja, percebi que o namorar dela era o que eu chamava de foder porque, lá está, sou literal.

Hoje de manhã, acordei a pensar que havia muito ruído na conversa. Se calhar, mal apanhei o fio à meada, o que inspirou aquele suspiro de resignação como se vê nos filmes. Há mais de 20 anos, suspirei assim porque a bagageira do meu carro estava cheia de tralha, o que confessei ao meu namorado:

Eu: "I have so much junk in my trunk!"
Ele: "Don't ever say that again."
Eu: "Why not? It's the truth."
Ele: "It means you have a fat ass."
Eu: "Oh..."

Nariz com mostarda

O plano para daqui a oito dias era ir a Nova Orleães. Era porque já não é. Por um lado, com a situação da minha vizinha não tenho andado com muita cabeça para pensar na viagem; por outro, porque fiquei chateada. Uma das minhas amigas que vai telefonou-me a perguntar se eu tinha ido levar o reforço da vacina ao que respondi negativamente. A minha intenção é esperar até Março porque isso maximiza a resposta do meu sistema imunitário segundo li na Bloomberg (era a opinião de um médico que citavam). Nesse caso, informou-me ela, não se sentia confortável em partilhar o quarto de hotel comigo. Mas eu nem tinha pedido para partilharmos o quarto de hotel.

Ela é mais velha do que eu, logo apanhou a vacina antes de mim -- eu fui das últimas pessoas do meu círculo de amigos mais próximos a levar a vacina por causa da minha idade e porque não estava em situação de risco, dado que trabalhava de casa e não ia a quase lado nenhum. Agora sou discriminada porque não quero tomar o reforço da vacina nesta altura. E nem sequer tem lógica que ela tenha medo de mim, dado que ela pode muito bem apanhar o vírus e dar-mo a mim. Depois também há o pormenor não insignificante que Nova Orleães no Natal fica com bastante gente, logo se não está confortável ao pé de mim que sou extremamente cuidadosa, como é que está confortável em ir para o meio dos malucos de NOLA?

Subiu-me a mostarda ao nariz e não estou em condições de ser boa companhia, então vou ficar em casa. Se me apetecer viajar, posso sempre ir sozinha, até porque eu gosto de hoteis mais giros do que aquele para onde vão.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Coisas misteriosas

Há dois dias acho que recebi uma notificação da minha médica a dizer que tinha de ir fazer a revisão anual. Digo "acho" porque li aquilo quando recebi, mas depois não consegui encontrar de onde vinha a notificação e até tinha desaparecido do rol das mesmas. Lá fui obediente nem sei a quem ou quê, se aos serviços automatizados, se à minha imaginação, e ontem telefonei a fazer a marcação não só da revisão, mas também da vacina da gripe, que ainda não tinha tomado e bem sei que já estou com uns dois meses de atraso.

Fiquei um pouco chateada que só houvesse consulta para meados de Janeiro, mas a vacina da gripe pude tomar hoje, dado que havia vaga para as duas da tarde. Agendei ambas e hoje ao almoço, telefonam-me do centro médico para dizer que no dia 13 de Janeiro não podia ter consulta porque a médica ia estar de folga. Olha que chatice, mas disse à senhora que o que eu queria mesmo era ter consulta em Dezembro. Era capaz de dar agora, disse-me, porque tinham andado a modificar os horários. Então e que tal dia 15, às 9 da manhã? Excelente, lá estarei.

Saí de casa às 13:25 para ir tomar a vacina, a contar com o tempo de lá chegar e depois preencher a papelada. Como é muito perto em coisa de cinco minutos estava lá e chamaram-me para entrar às 13:32. Apanhei uma enfermeira pouco conversadora, mas despachada. Às 13:38, entrei no carro para me ir embora e cheguei a casa às 13:43 porque estive parada num sinal STOP o que pareceu uma eternidade -- era hora de ponta naquele cruzamento.

Misteriosamente, tudo encaixou bem.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Terceira noite

Estamos na terceira noite de Hanukkah e estou à espera que as velas da chanukiah se apaguem para ir visitar a minha vizinha e acender as velas lá. Todas as noites o contraste entre o corpo e a mente da mãe dela é maior: o corpo está cada vez mais mirrado, apesar de ela estar a comer melhor e a tomar mais líquidos; a mente está mais bem disposta, reage a piadas e a comentários bem dispostos, fala mais alto. Nunca vi ninguém agarrar-se tanto à vida, como se estivesse a espremer tudo o que pudesse dar.

Mas este fim lento da mãe da minha vizinha por vezes enche-me de dúvidas. Eu não gostaria de estar assim e sei que ela não gosta deste limbo, por vezes com dores, mal-disposta... Ontem disse-me "I feel awful!" Depois, no fim, ao despedir-me estava animada quando lhe disse "You behave and don't do anything crazy. I love you and will see you tomorrow..." Respondeu "I love you, too" e sorriu muito.

Temos mais cinco noites de Hanukkah, talvez consigamos um milagre.