quinta-feira, 6 de janeiro de 2022

Competitividade

Após mais de dois anos do início da pandemia, parece ser evidente que os problemas de logística criaram uma nova matriz de competitividade, o que afecta preços e mesmo inflação. A última vez que tivemos forte crescimento nos preços de activos (imobiliário e bolsa) foi antes da crise subprime. Nessa altura, o efeito nos preços de bens e serviços da forte procura dos EUA era contrariada pela China que, para além de controlar as taxas de câmbio,  também usufruía de salários baixos. Ou seja, os americanos criavam inflação enquanto que os chineses exportavam deflação, aliviando a pressão na inflação. 

Nos últimos anos, à medida que os salários da China aumentaram e as taxas de câmbio foram liberalizadas, as fontes de competição salarial passaram a ser países como o Bangladesh, Vietnam, Paquistão, India. Ajuda também que estrutura de competitividade assenta numa optimização dos transportes e da cadeia de distribuição, especialmente por via marítima. 

A pandemia interrompeu este processo. Os americanos começaram a fazer mais compras pela Internet o que alterou a cadeia logística--a IHS Markit estima que o crescimento no comércio digital que ocorreu no último ano teria levado quatro a seis anos sem a pandemia. Depois houve modificações no tipo de compras, pois o dinheiro que era gasto em experiências (viajar, comer fora, hoteis, etc.) ficou temporariamente livre para ser gasto em bens físicos. A rapidez com que tudo está a ocorrer afecta os preços e essa é uma das fontes de inflação.

Obviamente que os estímulos por via das políticas fiscal e monetária não só não resolvem o problema da cadeia de distribuição, como mantêm níveis de procura elevados que a oferta não consegue estancar, logo os preços aumentam como mecanismo de racionamento. Nesta altura, a cenário mais provável é que em breve as políticas fiscal e monetária tenham de aliviar a pressão na procura, em vez de a incentivar.

Há outra perspectiva a considerar: no último meio ano, vislumbram-se inovações nas rotas de comércio internacional. Em vez de as empresas se focarem em preços baixos, estão a valorizar mais a previsibilidade nas entregas de produto, logo a América Latina está a ganhar encomendas que podem ser entregues aos EUA sem ser necessário o recurso a comércio marítimo. Na Europa, muito do negócio que ia para a Ásia está a ir para países como a Turquia. Portugal também terá vantagem em fornecer a Europa dada a sua proximidade física e o acesso por via terrestre.  

É uma pena que os políticos portugueses não se interessem pelo mundo, nem tenham políticas adequadas aos actuais desafios que são verdadeiramente oportunidades. Ainda mais deprimente é a sua falta de preparação em época de campanha para as legislativas.

 


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