quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

10 anos

Comecei a escrever aqui há 10 anos. No início achei uma ideia intrigante, mas também problemática porque não achei que tivesse algo a dizer. Surpreendemente, apareceram coisas, umas mais importantes do que outras e algumas, as minhas preferidas, são as mais engraçadas. Neste período, perdi os meu três pugs, e uma das minhas amigas mais antigas, a Sónia, que tinha conhecido em 1997, quando me mudei para os EUA. Ainda não me refiz do choque de a perder e frequentemente "falo" com ela, como se ela estivesse comigo.

A maior diferença que sinto desde então é a realização de que as coisas que eu esperava para o mundo e para Portugal não se irão concretizar durante a minha vida ou sequer alguma vez. Cada ano que passa, é mais claro de que estamos num rumo perigoso, talvez porque a geração que viveu as guerras mundiais está a morrer e as novas gerações não têm noção do equilíbrio ténue que é preciso ser feito para manter a paz. Os direitos das mulheres estão a retroceder ou a não avançar e frequentemente penso quão agradecida estou de não ter filhos.

Hoje celebra-se a última noite de Hanukkah e, desta vez, acendi as velas durante os oito dias. É um exercício que para mim não é religioso, pois não sou crente, mas é dos poucos rituais que gosto de efectuar porque sinto imensa paz. Há três anos, quando a saúde da minha vizinha Birchie piorou e não sabíamos se ia sobreviver, acendi as velas a maior parte das noites como forma de lidar com a limitação de pouco ou nada poder fazer para ajudar. Também este Hanukkah tem sido inquietante porque a saúde do meu pai piorou e hoje a primeira coisa que fiz assim que acordei foi ligar o telefone para ver se tinha alguma mensagem a dizer que não tinha sobrevivido a noite.

Já há alguns dias que tinha um pressentimento de que algo não estava bem. Hoje passei parte do dia a negociar comigo própria acerca de como proceder em relação a o ir visitar. Parte de mim acha que se o for ver, ele pode ver isso como permissão para morrer; outra parte, acha que se morrer já não sofre mais; mas também há a possibilidade que, se eu o visitar, ele ainda melhore e adiamos a morte mais um tempo. É por estas e por outras que a minha mãe dizia que eu era tão lenta que era boa para ir buscar a morte.

A última vez que fui a Portugal vi a Sónia pela última vez, e este episódio com o meu pai tem me dado alguma sensação de déjà vu.

terça-feira, 31 de dezembro de 2024

De quatro a dois

"No one's picking up the phone. Guess it's me and me.

And this little masochist, she's ready to confess,

All the things that I never thought that she could feel"

~ "Hey Jupiter," Tori Amos

Há coisa de um mês, demiti-me da Home Owner's Association, a associação de moradores da minha vizinhança. Tinha-se tornado num exersício demasiado teatral, o que me corroia a alma. As minhas funções eram a de tesoureira e de autora do boletim de notícias da vizinhança. Os meu objectivos eram bastante básicos, mas também ambiciosos. Por um lado, quis ser tesoureira porque achei que seria uma função bastante tecnocrática e imune a dramas; por outro, a escrita do boletim permitia-me mensalmente comunicar com os vizinhos de forma mais humana e mais conduciva à criação de uma comunidade--era como se eles recebessem uma carta mensal de um amigo. Em ambos os esforços tive sucesso, mais do que os que me antecederam, mas tal teve mais do que um preço.

Nas últimas vezes que escrevi aos vizinhos, achei que a tarefa se estava a tornar penosa e o prazer que antes sentia tinha-se esmorecido; no entanto, sempre que conversava com os vizinhos do sítio, especialmente as vizinhas, todos adoravam o boletim de notícias. Sempre que o recebiam, ansiavam por lê-lo, por vezes, mal podiam esperar assim que o recebiam. Mas tirava-me um pouco a vontade de escrever noutros sítios e, perante um presidente da associação de vizinhos medíocre e controlador, sem apreço pela escrita e que por fim achei ser uma pessoa má, achei por bem desistir. O masoquismo não tem sido o meu forte ultimamente e sentia que não podia ter tanto contacto com uma pessoa de tal estirpe.

Depois há também o detalhe de a idade ser ingrata e passar muito tempo em frente do computador ou telemóvel a escrever ou a tirar e apreciar fotos não ser o melhor para a saúde dos meus olhos. Então desisti e, depois, quando fui à consulta bianual de oftalmologia veio a confirmação de quefiz bem porque a minha visão estava a deteriorar-se, especialmente o meu olho esquerdo--a esquerda deixa sempre muito a desejar, constato. A visão ao perto esvai-se, mas, felizmente, ainda dá para ver bem ao longe, o que me permite apreciar os poucos planetas e estrelas que escapam à poluição luminososa da cidade. Este mês, com a cooperação da meteorologia, deu para ver Júpiter brilhante tal qual uma estrela.

Há uns tempos estava no Dubai com uns colegas e calhou olhar para o céu e não reconhecer as estrelas que via. Puxei do meu telemóvel e usei uma app para idenitificar o que via. Um colega meu chinês gostou muito da app e pediu-me o nome. Na próxima vez que estivemos no Dubai pediu-me outra vez o nome da app que uso porque tinha mudado de telefone e não tinha transferido a dita. É a Sky Guide. Não vivo sem ela, ainda por cima tem uma música muito cativante.

Ultimamente, tenho sentido alguma proximidade com Júpiter porque estou a frequentar uma aula de literatura em que lemos a Eneida de Virgílio, e Júpiter aparece frequentemente. Não acho grande piada a Eneias, aliás, acho-o um autêntico traste, mas Júpiter gosto, apesar de como deus estar bastante aquém, mas que Deus não está? Talvez o Hey Jupiter da Tori Amos, tema que me agrada bastante, seja o que me faz gostar dele.

O tempo tem estado menos frio e à noite, esta semana, tenho ido para o jardim olhar para o céu. Daqui a uns dias, os meu óculos novos, progressivos, que supostamente irão diminuir a frustração que sinto com a deterioração da visão, estarão prontos. Tenho medo que não dêem para ver as estrelas tão bem, mas, por enquanto, dá sempre para abandonar os quatro e regressar aos dois olhos originais. Merda da idade...

domingo, 22 de dezembro de 2024

Homem bom, homem mau

A periodicidade de ir ao dentista fazer a manutenção dos dentes (limpeza) é seis meses porque, pelos ditames do seguro de saúde, só pagam duas limpezas por ano, mas tais limpezas têm de ser espaçadas exactamente como o seguro quer e não pode ser exactamente meio ano, tem de ser meio ano e um dia, disseram-me. E disseram-me porque a limpeza que fiz em Maio, que foi feita meio ano e um dia após a de Novembro foi rejeitada. Não liguei muito à decisão no início e nem sequer contactei o dentista, nem submeti um pedido de re-avaliação da despesa, o que é completamente contra o que se deve fazer nos EUA. Aqui quando há alguma coisa incorrecta, deve-se contactar a entidade e o normal é a coisa ser resolvida por alguém, mas sejamos honestos que por vezes não é resolvida.

Quando recebi a conta, estava atarefada no trabalho e pensei que não me apetecia tratar do assunto, como se os minutos que iria perder fossem mais preciosos que os $135 que me pediam. No entanto, não fui completamente "desleixada" porque ainda telefonei à seguradora e disseram-me que tinha de telefonar para outro número, e também enviei um email à senhora dos Recursos Humanos a expor a situação e ela reencaminhou o meu caso para a representante que trata com os seguros, que, tal como eu, não percebeu a razão de não aprovarem a despesa por casusa do tal meio-ano e um dia que estava a ser respeitado. Pedi que me enviasse as regras e as regras não diziam nada acerca da periodicidade exacta, apenas que não podia ser mais do que duas limpezas no espaço de um ano.

Vou confessar a que o meu cérebro tende a entrar em labirintos facilmente em situações destas porque começo a contemplar o tamanho dos meses e, se calhar, a culpa é de Fevereiro ser um mês curto e coisas assim. Com muito esforço, arrumei os macacos no sótão, que depois falava com o dentista para não me estar a chatear mais, dado que o apelo tem de ser feito por carta enviada por correio físico, não há um formulário na Internet, nem sequer um número de telefone que se possa chamar. Só falta pedir que a coisa seja feita em papel azul de 25 linhas com um selo, como muitas coisas se fazia quando eu morava em Portugal.

Neste passado Novembro, fui outra vez ao dentista e falei com a gerente do gabinete que me disse que aquela rejeição não fazia qualquer sentido e que ela ia contactar o seguro outra vez. Sugeri que se calhar devia ter feito o tal pedido de re-avaliação e ela achou que sim. Ia para o fazer, mas tinha de ser submetido 180 dias depois da decisão da rejeição e o prazo já tinha passado.

Andava eu meia chateada com a seguradora, que por acaso é a United Healthcare, quando o CEO foi assassinado e olha que coincidência interessante, que ele não tinha perdido pela demora. Um amigo meu até me enviou uma mensagem a dizer que a United Healthcare era a seguradora que rejeitava mais benefícios, cerca de 32% dos pedidos ou seja um em três. Julguei que, se calhar, tinha negado benefícios a alguém que precisava e fora essa a razão do atentado. Passam-se dias e o caso desenrola-se, mas o motivo acabou por não ter nada a ver com um caso específico de rejeição de benefícios, o que me desagradou. Ainda por cima a avó do presumido autor do crime tinha uma cláusula no testamento em que deserdava a família se houvesse um crime.

Entretanto, os americanos entraram em parafuso, como é normal: iniciaram uma campanha de angariação de fundos para o presumido autor, preocupraam-se com o bem-estar do dito porque a foto da polícia mostrava-o com uma aparência desfavorável, há quem se tenha apaixonado por ele, quem tenha ficado muito feliz, quem lhe tecesse elogios, etc. E claro que, como eu, muitos acham que o CEO não tinha perdido pela demora. Com uma opinião pública tão favorável ao presumivel autor não me admiraria que ele fosse absolvido e senti um enorme desconforto em pensar que um rapaz ainda tão jovem que tenha cometido um crime destes pudesse andar por aí à solta, mesmo sendo bem-parecido e ter levado desta para melhor o CEO da seguradora que não quer pagar a limpeza dos meus dentes.

Mas, verdade seja dita, quando vou à consulta médica anual e me mandam fazer uma ecografia ao peito porque a mamografia é inconclusiva, a United Healthcare paga a conta da ecografia. A seguradora que eu tinha antes, a Blue Cross Blue Shield, não pagava porque a ecografia não era considerada parte do pacote de cuidados anuais necessários e lá tinha eu de pagar os $900. Note-se que Blue Cross Blue Shield só rejeita 17% dos pedidos de comparticipação, se calhar porque o CEO é melhorzinho do que o da United Healthcare.

quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

Os cómicos

Em resposta à proposta de lei de financiamento adicional da despesa federal negociada pelo Porta-Voz Johnson, Trump e Vance acham que não deve ser passada sem incluir um aumento do limite da dívida pública, dado que o actual fica inválido daqui a uns meses. Já Ramaswamy e Musk acham que a lei está cheia de "pork", quer dizer, despesa desnecessária. Musk diz mesmo que é uma lei criminosa."

A malta ainda nem entrou em funções e já está em desacordo. Será que Trump entra em funções com o governo paralizado? Em Janeiro de 2019, quando Trump era Presidente, o governo federal ficou sem financiamento durante cinco semanas e foi uma enorme confusão.

sexta-feira, 6 de dezembro de 2024

Coitados deles e de nós

Num dos almoços desta semana, calhou conversar com uma conhecida (apoinate de Trump) cuja irmã foi recentemente ao médico--são americanas. A novidade foi que a irmã descobriu que tem problemas graves na tiróide e nos níveis de hormonas, o que lhe causa excesso de peso, cansaço, perda de cabelo, etc. Finalmente sabe a razão de muitos dos problemas que tem porque arranjou um emprego que tem seguro de saúde, o que lhe permitiu ir ao médico.


Fiquei um pouco frustrada com a história e perguntei por que não tinha ido ao médico há mais tempo. Disse-me que só agora é que tinha tido acesso a um emprego com seguro de saúde. E perguntei porquê nao ter comprado um seguro de saúde antes e respondeu que o seguro de saúde era muito caro. Ora depende porque há seguros para todos os gostos. Há programas federais que subsidiam o acesso a seguro para pessoas sem rendimento e que são mais em conta, há empregos que oferecem seguros mais baratos que são chamados de catastróficos que compensam caso a pessoa seja saudável e só precise em casos excepcionais, mas há também seguro normal, cobrindo condições pré-existentes, e que custa menos de $200 por mês para o empregado.


O sistema é complexo, mas dá para tudo e a vantagem é que para quem é saudável acaba por ser mais barato do que um sistema de saúde europeu e os americanos acham que um sistema assim constitui um incentivo para as pessoas prestarem mais atenção à sua saúde e escolherem estilos de vida mais saudáveis. E depois sendo mais barato, as pessoas podem poupar o dinheiro para terem quando ficam doentes e precisam de ir ao médico. Isto é o que eles dizem, mas não é o que fazem.

Depois me pergunta se não seria bom que o meu emprego oferecesse seguro de saude para o meu cão. Eu disse que não queria seguro de saúde para o cão. Quando o meu cão vai ao médico, a decisão é feita com base no que é bom para a saúde do cão e, no meu caso, não há grandes restrições financeiras. A verdade é que o meu cão tem acesso a melhores cuidados de saúde do que as mulheres nos EUA. Depois acrescentei que tive seguro pelo Obamacare e não foi caro, custava menos de $400 por mês sem subsídio. Ou seja, não disse, mas pensei que, se a irmã não tem seguro, é porque não se sabe orientar. Há imensa gente que chega aos EUA sem sequer falar inglês e desenvencilha-se melhor do que a irmã.

Ao longo da conversa tambem fiquei a saber que a apoiante do Trump, que é fumadora, tinha acabado de comprar roupas de inverno pelo Shein, apesar da política do Trump ser anti-China. Ou seja, postulam uma coisa e fazem exactamente o contrário mas nao têm culpa no cartório.

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

A queda de dois anjos

A ilusão que Biden era um dos melhores presidentes dos EUA que tinha uma economia a bombar, o mercado accionista a quebrar records (bateu 50 records até 8 de Novembro, a sério!), etc. dissipou-se na bruma, tal qual um D. Sebastião. Afinal, dizem alguns, aquele bocadinho de inflação foi fatal, mas isto merece um pequenino à parte.

(Quem andou em economia há 35 anos, deve lembrar-se daquela ideia de que nos EUA havia pouca tolerância para desemprego por causa da Grande Depressão nos anos 30 do século passado e, na Alemanha, havia pouca tolerância para a inflação por causa da hiperinflação da República de Weimar há 100 anos. Por isso nos EUA, o mandato da Reserva Federal era duplo, desemprego e inflação, enquanto que o mandado do ECB, que foi bastante moldado pelas preferências alemãs era principalmente um de controle de inflação. Durante a presidência de Biden, o desemprego americano atingiu o nível mais baixo de há 54 anos em Fevereiro de 2023, mas agora está mais alto.)

Biden é parcialmente responsável pela inflação, dado que as políticas fiscais expansionistas que implementou quando subiu ao poder não eram necessárias numa economia em franca recuperação, mas houve um outro efeito que o eleitorado costuma dizer ser desejável, pois com estas políticas houve redistribuição de riqueza: diminuiu a pobreza infantil, reduziram a dívida de educação dos jovens, foi generoso nas políticas de imigração e muitos imigrantes sem documentos ficaram legalizados, etc. Quem agora aponta os dedos aos Democratas por não redistribuirem está enganado. Até porque muitos dos estados que votaram contra os Democratas são os que recebem mais fundos do governo federal, logo são os que mais beneficiam de ter um presidente associado ao Partido Democrata.

Quase ninguém se recorda que em 2021 e nos primeiros meses de 2022, a maior parte das pessoas não estava grandemente incomodada com a inflação; pelo contrário, por exemplo, as casas na minha vizinhança vendiam-se numa questão de horas e havia filas de carros a rondar à espera que mais fossem colocadas para venda. Os contratos de compra e venda fechavam em três semanas e achava-se normal tanta anormalidade.

Caiu finalmente a ficha em Janeiro de 2022, dias pós o S&P 500 atingir um pico máximo, quando a Reserva Federal anunciou que ia começar a aumentar as taxas de juro e, em Março desse ano, as taxas de juro subiram. O mercado imobiliário travou e o S&P 500 entrou em parafuso e e teve uma queda de 18% em 2022; a última vez que o S&P 500 tinha levado um tombo sério tinha sido em 2008, quando perdeu quase 37% depois de atingir o pico em 28 de Agosto de 2008. (Foi nesse Novembro que se elegeu o Obama.) Apesar da bolsa ter mais do que recuperado em 2023 e 2024, o sentimento de euforia não mais regressou.

A seguir a esta eleição, vislumbrou-se algum entusiasmo na bolsa com a perspectiva de Trump continuar o seu projecto de liberalização da economia, mas parece ter sido apenas um efeito especulativo temporário. Até Trump perdeu o encanto aos olhos dos capitalistas.

segunda-feira, 18 de novembro de 2024

Dejá Vu

Passadas quase duas semanas desde as eleições, já estamos na fase de apatia. A primeira vez que Trump foi eleito, o choque foi bastante maior; agora apenas se sentiu a confirmação de algo de que já se suspeitava. Um dos meus vizinhos que votou em Trump dizia-me hoje que estas eleições eram prova que a América tinha uma boa democracia porque Biden teve o voto popular há quatro anos e agora foi a vez do Trump. Ou seja, vai à vez e cada lado tem pouco tempo para fazer grandes estragos.

As pessoas têm a memória curta, mas vale a pena um sumário do primeiro mandato de Trump que começou em Janeiro de 2017:

  • o Furacão Maria, em Setembro de 2017, com quase 3 mil mortos em Porto Rico, e cuja reposta foi evocativa dos falhanços do furacão Katrina em Nova Orleães durante a administração de Bush II;
  • a guerra comercial com a China iniciada em Julho de 2018, que foi uma mudança radical da política das relações China-EUA que tinha sido cultivada desde a administração de Nixon. Mas Biden continuou a política de Trump;
  • em finais de 2019 a pandemia inicia-se na China e, meados de Março de 2020, globaliza-se e acaba por dominar o resto do mandato;
  • e chegámos a Janeiro de 2021 e tivemos o ataque ao Capitólio duas semanas antes de Trump sair.

Já com Bush II também tinhamos tido uma sucessão de eventos de grande impacto, mas mais espaçados:

  • Janeiro de 2001 entra Bush e em Setembro temos o ataque de 9/11;
  • Bush invade Iraque em Março de 2003;
  • Furacão Katrina aterra em Nova Orleães em Agosto de 2005, causa mais de 1800 mortos;
  • Setembro de 2008 colapso de Lehman Brothers e crise financeira.

Neste novo mandato, claro que vamos ter mais eventos desta envergadura e, se calhar, não nos safamos só com três ou quatro. Talvez finalmente estoure a bolha das criptomoedas e quem sabe causa uma depressão económica mundial, que tal inflação acima de 10%, uma crise da dívida soberana americana, colapso do dólar, colapso da Segurança Social americana, uma nova guerra mundial, quiçá outra pandemia, perseguições e assassinatos políticos, etc. Mas também pode ser tudo isto e mais alguma coisa que me escapa.

quarta-feira, 6 de novembro de 2024

Cobertura das eleições na PBS

Finalmente animação!

Chegámos a 5 de Novembro, finalmente. Como a hora mudou no Domingo, decidi colocar o despertador para as 5:45 da manhã, que corresponde às 6:45 antigas. Demorou algum tempo até decidir se ia trabalhar do escritório ou de casa, mas decidi ir ao escritório. O trânsito não estava mal na direcção oeste na autoestrada, mas do outro lado tinha havido um acidente. Na minha imaginação havia a possibilidade do pessoal andar aos tiros, mas tal não sucedeu. Não é exagero da minha parte porque há bastantes relatos de situações dessas. Depois de tarde escureceu e tivemos umas chuvas fenomenais, logo pouca oportunidade para histrionices na via pública.

No trabalho chegámos a falar sobre as eleições, mas foi mais a jeito de piada do que lamento. Eu dizia que esperava que o pessoal tivesse poupanças, pois, se Trump ganha, a agricultura americana e a Segurança Social vão ao ar, mas pode-se sempre fazer dinheiro com as taxas de juro que a inflação das políticas dele irá produzir. Dá um certo calorzinho na barriga saber que quem o elege será mais prejudicado do que quem não votou nele.

E por falar em taxas de juro, em Setembro fui a Oklahoma e tive oportunidade de ir jantar com umas senhoras, algumas já reformadas, mas uma que trabalha num banco local. Dizia ela que as taxas de juro das contas a prazo e dos certificados de depósito estavam ridículas e não cobriam a inflação. Eu disse que não tinha razão de queixa, pois a minha conta de poupança tinha 4.3% de juro e o meu certificado de depósito a 12 meses tinha 5.25% (eu tenho conta no Capital One, mas até há outros bancos que tinham melhores rentabilidades). Ela disse-me que o meu banco não contava porque não era um banco regional e por isso funcionava de outra forma. Preferências--cada um usa o banco que quer. Oklahoma é completamente republicana: não há um único condado púrpura, é tudo encarnado, depois a culpa é dos azuis.

No meu Facebook, quase nenhum dos meus amigos americanos menciona as eleições e eu tenho amigos em ambos os lados. Mas há uma excepção: uma das minhas colegas do emprego que eu tinha há 12 anos, que já está reformada, é muito Republicana e ela acha que se Trump perder vai ser o fim do mundo, então de vez em quando mete uns posts a lamentar a chegada do fim do mundo. Claro que neste momento, Biden é presidente, logo se fosse para haver o fim do mundo por causa de um presidente democrata já não estaríamos aqui. E o mesmo é válido para Trump v. 2.0: sobrevivemos quatro anos, logo podemos sobreviver mais quatro e depois ele vai à vida. Claro que também há a possibilidade de o Vance o despachar para outras paragens ou até ele sucumbir à sua propria mortalidade.

De qualquer das formas, os EUA prometem que os próximos quatro anos irão ser animados.

terça-feira, 29 de outubro de 2024

Uma semana

Votei no Sábado. Normalmente, vou ao centro cívico de uma igreja baptista perto de casa, mas a minha vizinha postou no Instagram uma selfie depois de ter votado na companhia de teatro local, que eu não sabia ter mesas de voto, e decidi que a partir de agora voto lá. Não apanhei fila, mas havia um fluxo constante de pessoas em que uma saía e outra entrava. No momento em que me preparava para entregar o boletim de voto, a sala explodiu em aplausos porque uma jovem negra ia votar pela primeira vez.

Em conversas com os meus vizinhos, muitos já votaram e alguns apanharam fila, coisa que raramente acontece durante o voto antecipado. Não se sabe se isto quer dizer que haverá mais pessoas a votar ou se apenas reduzirá os votos de Terça-feira, 5 de Novembro. Hoje recebi um cartão postal da comissão eleitoral do condado aconselhando-me a estar regularizada para a eleição. Suspeito que tenha havido manipulação no envio ou na entrega porque o cartão postal devia ter chegado há mais de três semanas, dado que é necessário estarmos inscritos para votar pelo menos 30 dias antes da eleição. A mim não me afecta, pois o meu recenceamento está regularizado, mas decerto que haverá quem se tenha esquecido de tratar da papelada.

As sondagens estão bastante próximas para se saber quem é o favorito, mas com o Trump nunca se sabe se as sondagens são de confiança. Julgo que o mais surpreendente é ver tantas pessoas que ainda o apoiam, especialmente as pessoas mais religiosas. Entretanto, os mercados agrícolas têm estado em queda na expectativa que ele ganhe e recomece a disputa comercial com a China. Quem fica a ganhar é o Brasil, especialmente se Trump for eleito, e a agricultura americana ficará um passo mais perto do fim. Tem piada que Trump receba mais votos das zonas rurais, que acaba por ser quem mais sai prejudicado com a sua política.

Elon Musk anda a aproximar-se de Trump e é natural que fique com um cargo político em caso de vitória dos republicanos. Trump, Vance, e Musk juntos no governo seria demasiado forte e criaria um nível de incerteza tal que o país entraria em parafuso. Mas seria o cenário mais interessante, apesar de ser também o mais caro não só para os EUA, como para o resto do mundo.

terça-feira, 1 de outubro de 2024

Um mês e cinco dias

Amanhã vamos ter o debate entre o Tim Walz e o J.D. Vance e daqui 36 dias talvez já tenhamos uma ideia de como foi a eleição. Normalmente (e ouço na minha cabeça o Peter Mayle a dizer "normalment" no audiolivro "A Year in Provence"), estaríamos agora a debater propostas de políticas e a avaliar o mérito de cada candidato, mas este ano não há propostas, apenas "conceitos de um plano". A minha dúvida para o debate de amanhã é ver se Vance também vai dizer disparates à Trump ou se irá ser coerente.

Há dias, vi um vídeo no Instragram sobre Cincinnatti, no Ohio, cujo nome homenageia George Washington e Cincinattus, ambos considerados virtuosos por não se terem deixado corromper pelo poder. Vance ainda não tem poder, mas parece estar embriagado com a perspectiva de estar perto dele, já que apenas Trump o terá. Ou talvez o plano seja despachar Trump caso chegue a número dois. E essa perspectiva nem é de todo má, porque dificilmente ele seria pior do que Trump.

Mas não sou tão boa pessoa quanto pareço: há uma parte de mim que não se importaria de ver Trump ganhar e governar. Iria ser péssimo, mas talvez quem votasse nele aprendesse qualquer coisa. Claro que estou a ser muito optimista -- não aprenderam à primeira, dificilmente aprenderiam à segunda.

terça-feira, 24 de setembro de 2024

Pelo campo

Fui a Oklahoma na semana passada, mais propriamente a Stillwater, que é uma cidadezinha universitária que tem pouco mais de 49 mil almas e a área metropolitana tem 78 mil. Como foi o primeiro sítio onde vivi nos EUA, é como um regresso a casa para mim.

A viagem de carro demora umas seis horas e meia pela autoestrada com portagens; se for sem portagens, demora mais 40 minutos. Para lá chegar atravessa-se o Arkansas inteiro, o que tem algum charme na parte oeste, mas a parte leste entre Memphis e Little Rock costuma ter imensos camiões e é uma enorme seca. O Arkansas não tem portagens, todos os turnpikes (autoestradas com portagens) estão em Oklahoma. Não sei porquê, mas o Texas e Oklahoma adoram portagens.

Como estamos em época de eleições, umas das coisas que gosto de ver é se há anúncios políticos. Desta vez vi um no Arkansas e vários em Oklahoma a apoiar o Trump (na zona da I-40, perto de Sallisaw e Muldrow, que ficam na zona sul da Nação dos Índios Cherokee, em Oklahoma). Um dos campos por que passei tinha várias bandeiras americanas e o "Make America Great Again". Eu acho divertido que os agricultores apoiem o Trump porque ele foi péssimo para a agricultura.

Não vi nenhum anúncio pró-Harris, mas os estados por onde passei não são púrpura, logo não deve fazer sentido andar a gastar dinheiro por estas bandas.

segunda-feira, 16 de setembro de 2024

Tiro ao Trump

No dia a seguir ao debate, fui finalmente ver o vídeo do Alan Lichtman com as chaves para a Casa Branca. Estava quase a animar com a previsão dele, quando caí à terra e pensei que talvez fosse demasiado cedo para deitar foguetes. Mas tenho duas garrafas de champagne no meu frigorífico que são pau para toda a obra, quer ela seja chorar ou celebrar--a opcionalidade é sempre bem-vinda.

O resto da semana decorreu mais ou menos e houve imensas piadas pós-debate. Talvez as mais engraçadas tenham resultado da insistência de TRump de que há imigrantes ilegais a comer animais de estimação em Springfield, Ohio. Já vi duas memes com o ALF, aquele extra-terrestre da sitcom dos anos 80. Numa o ALF está ao telefone a pedir a alguém para o levar para Springfield. Na outra, vê-se uma mugshot do ALF com uma legenda a dizer que foi apanhado pelo FBI. O ALF era uma das minhas sitcoms preferidas, e teve bastante sucesso em Portugal, apesar de não ser muito popular nos EUA.

Hoje, Trump foi alvo de outra tentativa de assassinato: o FBI encontrou um individuo que disparou tiros no campo de golfe onde jogava o ex-presidente. Se ao primeiro atentado muita gente ficou chocada, desta vez já está normalizada a completa maluqueira. Ninguém achava que a campanha ia ser pacata ou normal.

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

A terminar o debate

Nada de novo debaixo do sol. Trump inventou como de costume e disse coisas sem sentido ou falsas. Ele insistiu que Biden e Harris apoiam o aborto após o nascimento, o que não tem ponta por onde se lhe pegue--um bebé que nasce não pode ser abortado por definição, mas definições nunca foram um entrave para Trump. O principal é que o público para quem ele fala ou não entende quando ele não faz sentido ou não fica incomodado.

Kamala podia ter estado melhor. Ela tem um discurso mais sofisticado, o que nem sempre é bom. O ideal é comunicar de forma bastante simples, ao nível do oitavo ano de escolaridade, mas o vocabulário dela é muito mais alto, o que pode afastar alguns eleitores. Na presença física, ela olhou muito para ele e gesticulou bastante, o que pode parecer um sintoma de ansiedade. Ele manteve-se sempre a olhar para a camera, e movimentou-se com bastante calma e exactidão.

No entanto, duvido que haja muitos indecisos nesta altura do campeonato, até porque Trump já governou, logo ninguém está a alimentar ilusões de que ele vai agir de forma "presidencial". Trump continua com a vantagem da geografia pelo facto de muitos dos seus eleitores estarem em zonas rurais, mas há muitas pessoas que votaram nele à primeira vez e que mudaram de ideias; duvido que votem em Kamala, o mais provavel é acabarem abstendo-se.

terça-feira, 10 de setembro de 2024

Ready to Rumble

No final do último século, um dos jogos de vídeo mais populares era o Ready to Rumble, que se tornou ainda mais popular quando saiu a o GameCube da Nintendo. Agora também é o nome de um filme, diz o Google, mas não é isso que despoleta a minha imaginação. Amanhã é dia de debate entre Harris e Trump e é bom que estejamos "Ready to Rumble". Tenho visto pouquíssimo entusiasmo com esta eleição, apesar de, no dia 5 de Novembro, os EUA não decidirão apenas quem será o Presidente--o que está em causa é o futuro da história mundial e até da raça humana, ou não fosse um dos tópicos caros ao establishment Trumpeta a eliminação da fertilização in vitro.

Ainda estou à espera que alguém tenha o bom senso de propor acabar com o Viagra porque, se Deus quisesse que os homens tivessem ereções, não teria permitido que eles as perdessem. E homens casados com mulheres já na menopausa também não precisam de ereções porque já não têm mulher com quem procriar, logo não faz sentido que tenham acesso a tal tratamento, até porque o divórcio é anti-Deus porque separa o que Deus uniu. Era tão bom ter uma lei que controlasse o corpo dos homens, seria uma prova suprema de que estamos a caminhar para a verdadeira igualdade.

Quando o Brett Kavanaugh estava a ser entrevistado para o SCOTUS pelo Senado, a Kamala Harris perguntou ao Brett se ele conhecia alguma lei que regulasse exclusivamente o corpo do homem; ele não se lembrava de nenhuma. Amanhã o debate deverá ser bastante interessante.