sábado, 25 de agosto de 2018

Jack on the rocks...

Uma das coisas a fazer no Tennessee é visitar a distilaria do Jack Daniel's, em Lynchburg. Não sou -- ou melhor, era -- grande apreciadora de whiskey, e nem sequer sabia que Jack Daniel's era tão conceituado, até porque levou a medalha de ouro na Feira Mundial de St. Louis, em 1904, mas é sempre bom aprender estas coisas. (Relativamente a esta feira, há uma outra história que é de cultura geral. Como deverão saber, no sul dos EUA, o chá gelado é a bebida de referência. Pois, é uma invenção que frequentemente é associada a essa feira, mas parece que precede a mesma.)

Lynchburg é uma cidadezinha muito pequena, mas tem uma praça antiga muito bem preservada e a operação turística do Jack Daniel's é verdadeiramente impressionante, assim como é o facto de ser ali o único sítio que produz este whiskey e que abastece todos os países onde se consome. A inovação introduzida por Jasper Newton Daniel, mais conhecido por Jack Daniel, foi a filtragem por carvão, que suaviza o whiskey.

Jack Daniel aprendeu a fazer whiskey com o seu reverendo e um escravo dele quando ainda era criança -- Jack fugiu de casa e foi recolhido pelo clérigo a quem, aos 13 anos, comprou a distilaria a crédito porque a congregação chateou-se por o reverendo dedicar tanto tempo ao whiskey e também não parecia bem. A distilaria Jack Daniel's foi fundada em 1866 e o seu primeiro empregado foi para a posição do que seria hoje considerado o mestre-distilador -- Jack contratou o escravo que depois se tornou um homem livre. Os descendentes deste homem negro ainda trabalham para a Jack Daniel's. Não vos dá vontade de beber mais whiskey deles só por saber que estavam na vanguarda das causas sociais?

O whiskey orginal, o N. 7, é feito da seguinte maneira: mistura-se farinhas de milho (80%), cevada (12%), e centeio (8%) com água de uma fonte subterrânea local e fermento, formando uma papa. O fermento usado é a papa da última fermentação, logo o Jack Daniel's é por isso chamado de "sour mash"; isto ajuda a manter a consistência do sabor do produto. A natureza segue o seu curso durante seis dias, altura em que temos a produção de álcool. Se o processo parasse aqui, teríamos o chamado "moonshine".

Mas para se tornar em Tennesse whiskey, segue-se a filtragem do "moonshine", que é incolor, por três metros de carvão gota a gota -- leva dois a cinco dias -- e mete-se em barris de madeira de carvalho novos, mas cujo interior foi tostado e depois ligeiramente torrado para caramelizar os açucares da madeira e dar mais sabor e cor ao whiskey; toda a cor e grande parte do sabor vêm do barril. Note-se que o carvão usado como filtro é de madeira de ácer doce que foi regada com whiskey antes de ser queimada para produzir um carvão cujo tamanho não pode ser muito grande, nem muito pequeno (ajudem-me: não me recordo de que nome se dá a um pedaço de carvão).

Os barris são feitos de propósito para o Jack Daniel's manualmente e apenas são usados uma vez. Os barris velhos são reciclados por várias vias. Por exemplo, a Bacardi é uma das marcas que compra alguns dos barris usados da Jack Daniel's para produzir rum. Outros vão para a Escócia onde servem para envelhecer whiskey -- note-se que o whiskey escocês não é filtrado por carvão. Com os barris usados, a Jack Daniel's também produz mobília, artefactos, artigos de jardim, etc.

Durante quatro a sete anos, os barris cheios de Jack Daniel's descansam em armazéns, sem serem mexidos, nem estarem sujeitos a controle de temperatura. A variação das condições atmosféricas faz com que o whiskey entre e saia da madeira dentro do barril, que é o que lhe dá cor e sabor. Alguns barris chegam a ter whiskey a sair pela parte de fora e essas pequenas perdas são consideradas a porção que cabe aos anjos (angel's share). Depois o produto é engarrafado e para consistência do produto, o whiskey de vários barris é misturado.

Como vêem, é um produto completamente natural, sem químicos, logo podem consumir à vontade.

Para além do Jack Daniel's normal, que é mais de 90% da produção, há alguns whiskeys de produção limitada e para esses o método é ligeiramente diferente. Por exemplo, há um que é Single Barrel Select ($49 por garrafa), em que o whiskey é provado antes de ser engarrafado e apenas os melhores barris são usados e identificados na garrafa, mas não misturados uns com os outros. O Jack Daniel's Sinatra ($150 por garrafa) envelhece em barris cujo interior tem sulcos, o que aumenta a superficie de madeira caramelizada com que o whiskey contacta, e é filtrado duas vezes: depois de sair do barril, passa outra vez por um metro de carvão, o que lhe dá um acabamento muito suave (o acabamento é a sensação que fica quando passa pela garganta; se é suave, não arde). O Sinatra é engarrafado por barril. O Jack Daniel's Gold No. 27 ($100 por garrafa) também é filtrado duas vezes e para além do envelhecimento em barris de carvalho, é amadurecido em barris de ácer; este whiskey tem um acabamento muito suave também.

O whiskey preferido de Frank Sinatra era mesmo Jack Daniel's e, quando o cantor morreu, colocaram no caixão um cantil de Jack Daniel's e o filho de Sinatra trabalhou com a distilaria para desenvolver um whiskey que homenageasse o cantor.

Bem, vou deixar-vos com algumas fotos e espero que vontade de irem beber um copo -- responsavelmente, claro!


A loja turistica da Jack Daniel's na praça de Lynchburg, TN


Detalhe da escultura em frente da loja


A entrada da distilaria


Uma das cadeiras feitas com madeira dos barris: superconfortável,
custa $244 + imposto


Um dos antigos carros de bombeiros da distilaria:
a Jack Daniel's tem os seus próprios bombeiros


A gruta de onde é extraída a água para fazer o whiskey


Uma escultura de Jack Daniel (ele era mais pequenino).
Chama-se Jack on the Rocks


Os cereais usados para fazer o Jack Daniel's:
milho, cevada, e centeio


As amostras de whiskey que provei durante a visita


Na loja da distilaria (diferente da de turismo),
podemos gravar uma mensagem numa garrafa de whiskey.
Comprei Gentleman Jack

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