quinta-feira, 13 de agosto de 2015

"O que fazer com este país" -- um surpreendente sectarismo

O meu primeiro reparo ao livro de Ricardo Paes Mamede, "O que fazer com este país". Com o tempo, escreverei uma apreciação mais longa e ponderada, mas lembrei-me desta a propósito da reportagem/entrevista do Diário Económico sobre Ricardo Reis.

No livro de Ricardo Paes Mamede, faz-me muita impressão a quantidade de trabalhos sobre a economia portuguesa que são, simplesmente, ignorados. Uma coisa é não concordar com visões diferentes, outra é fingir que não existem. 

Os trabalhos de Ricardo Reis são um exemplo desta falha. É, eventualmente, dos exemplos mais chocantes, dado que Reis é dos melhores economistas portugueses em actividade. Não se é apontado como estando na shortlist para a John Bates Clark Medal por um mero acaso. Para quem desconhece, penso que basta dizer que, no passado, este prémio antecipou os prémios Nobel de Friedman, Samuelson, Krugman, Stiglitz e, prevejo eu, Esther Duflo. Esta medalha é também conhecida como o Bebé Nobel e premeia economistas com menos de 40 anos radicados nos EUA.

Ricardo Reis, ao contrário de Sérgio Rebelo, outro dos mais prestigiados economistas portugueses, tem-se dedicado bastante ao estudo de Portugal e da crise portuguesa. Um artigo publicado no Brookings Papers on Economic Activity, em 2013, que ainda este ano dei aos meus alunos de Políticas Macroeconómicas (Mestrado de Economia) para discussão numa aula, é um bom exemplo disso.

Não me choca nada que se discorde de Ricardo Reis e que se ache que o homem está completamente errado. Mas ignorá-lo e fingir que não existe é, para mim, incompreensível e apenas pode resultar de um sectarismo que eu não esperava de Ricardo Paes Mamede.

Declaração de interesses
Há também trabalhos meus, e de co-autores meus, que considero que deviam ter sido referidos. Assim sendo, é perfeitamente legítimo interpretar esta entrada como mero ressabiamento. Disputo tal interpretação, naturalmente, mas, a bem da honestidade intelectual, fica declarado o potencial conflito de interesses.

3 comentários:

  1. Ficarei aguardar com grande expectativa o próximo post sobre o livro do Ricardo Paes Mamede.

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  2. Caro Luís,
    a tua crítica seria particularmente acertada se este livro fosse outro que não foi. Estava a trabalhar num projecto de livro com o título provisório de "As histórias (mal contadas) da crise portuguesa", cujo objectivo consistia em rever criticamente as principais obras (livors, artigos e relatórios) sobre as causas de crise protuguesa. "O que fazer com este país" não é esse livro, é um trabalho de divulgação alargada que evita propositadamente polémicas que só interessariam a uma dúzia de pessoas. Já tive oportunidade de me encontrar com o Ricardo Reis e gostei muito de o conhecer e de trocar ideias com ele sobre vários temas. Considero-o um economista notável do ponto de vista da formalização e do domínio dos principais debates actuais do mainstream. Quanto à análise das origens da crise portuguesa, creio que lhe escapam aspectos institucionais fundamentais (como as implicações da liberalização financeira da primeira metada de década de noventa), o que fragiliza a interpretação que obtém com base nos seus modelos. Em qualquer caso, os trabalhos do Ricardo Reis são apenas uma parcela do muito que não menciono no livro que agora publiquei, incluindo os trabalhos realizados no âmbito do NIPE (o trabalho sobre a poupança em Portugal é para mim particularmente notável, mesmo tratando-se de um relatório de investigação) e muito outros.
    Abraço,
    Ricardo

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    1. Ricardo, agradeço a resposta, a explicação e o 'fairplay' com que aceitaste a crítica, embora não concordando, como é evidente.

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