Porque, como o Luis bem notou há bocadinho, estava mais que na hora de começar a minha a participação neste mui nobre espaço (elogio o qual
se deve quase única e exclusivamente ao rigor científico que o resto dos
elementos da destreza dedicam à análise sempre problemática da roupa interior
feminina).
De modo muito resumido, uma subida do salário mínimo tem dois efeitos
maiores na economia: por um lado, aumenta o rendimento dos trabalhadores com salários
mais baixos, e por outro aumenta os custos das empresas. Se o primeiro aumenta
o rendimento dos mais pobres, e pode aumentar a procura agregada, o segundo pode
diminuir os níveis de emprego, e é esta combinação de factores (vulgo trade-off) que faz do salário
mínimo um objecto de enorme discussão, e pouco consenso.
E assim, comecemos pela segunda parte do título deste post: Porque poderá um
aumento do salário mínimo ser uma boa ideia na conjuntura económica actual?
"I find your lack of faith disturbing."- Darth Vader
O principal factor que joga a favor de um aumento do salário mínimo é o facto de que quando os agregados familiares têm rendimentos mais reduzidos não lhes resta outra opção senão consumir uma proporção mais elevada dos mesmos (se não a totalidade).
Isto é importante pois aumenta a velocidade com a qual os rendimentos retirados às empresas pela via de um aumento salarial obrigatório retornam às mesmas sob a forma de um aumento da procura dos seus bens/serviços. Ou seja, o efeito positivo de um aumento do salário mínimo nos níveis de emprego será mais acentuado quando a propensão a consumir dos trabalhadores que o auferem é mais elevada. Esta propensão será provavelmente mais alta durante uma recessão (técnica ou não).
Acrescente-se ainda a favor desta subida a menor propensão para poupar que resulta das taxas de juro em vigor, e o facto de a pressão inflacionária que pode advir desta subida dos custos para as empresas não ser efectivamente perigosa (por muito que nos tentem convencer do contrário) nos dias que correm.
Tendo estes três factores em consideração, e na minha perspectiva, aumentar o salário mínimo é capaz de ter sido no final de contas uma boa ideia...mas ainda assim, não posso ser a favor.
"A Jedi's strength flows from the Force. But beware
of the dark side." – Yoda
A argumentação anterior, por muito boa que possa ser, não passa disso mesmo: argumentação.
E , talvez utopicamente, decisões politicas desta magnitude não podem/devem ser feitas com base em argumentos, mas sim em estudos na matéria, com metodologias consistentes, que possam defender estes resultados.
Um dos objectivos do projecto profissional no qual estou enquadrado neste momento pretende analisar o efeito mencionado anteriormente. Mas os resultados ainda estão a meses de distància e, tanto quanto sabemos, não existe nenhum outro estudo que chegue à conclusão que os meus argumentos anteriores podem sugerir
O único estudo consistente e independente, como sabemos, é o trabalho do João Cerejeira e demais co-autores, segundo o qual aumentar o salário mínimo nesta altura não é aconselhável.
E assim sendo, e mesmo jogando contra a minha intuição e esperança, a minha honestidade intelectual não me permite defender uma subida do salário mínimo no contexto actual.
Infelizmente, os problemas não ficam por aqui.
"There is a great disturbance in the Force." - Darth Sidious
Um dos problemas maiores (senão o maior) do salário mínimo em Portugal é o processo de ajustamento do mesmo. É óbvio que um aumento de cerca de 4% no salário mínimo poderá ter um impacto significativo nas empresas que empregam trabalhadores a este custo, dado ser pouco credível que a maior parte delas tenha níveis de crescimento sequer perto de 4% num futuro próximo (ou condições financeira para suportar sem problemas um acréscimo nos custos de produção dessa magnitude).
Ora, se este aumento tivesse sido distribuído igualmente pelos anos em que o salário mínimo esteve congelado teríamos tido aumentos anuais a rondar 1%, que permitiria um ajuste mais gradual das entidades empregadoras, porventura evitando tantos despedimentos como aqueles que podem resultar de uma subida abrupta do mesmo.
Acresce a esta forma desajustada de ajustar o salário mínimo a ideia de que deve existir um plano de longo prazo para o mesmo (defendido pela CGTP, por exemplo). Não terá sido lição suficiente a imprevisibilidade económica da crise que se arrasta há meia década para percebermos que tomar decisões políticas com base em previsões económicas que podem perfeitamente estar erradas deve ser evitado a menos que seja totalmente indispensável?
E, dadas as condicionantes políticas que afectam assuntos como este, não estaria o mercado de trabalho português mais bem servido deixando a decisão (ou o estudo da mesma pelo menos) a cargo de uma entidade independente, que faça uma recomendação anual, baseada numa metodologia consistente e independente , sobre o ajustamento do salário mínimo nesse ano (tal como acontece já em países como o Reino Unido por exemplo)?
Talvez esta última sugestão seja pedir um pouco demais. Mas o ano novo está quase a chegar, e todos temos o direito a sonhar. E, pelo menos por enquanto, os sonhos em Portugal ainda não pagam impostos.
Moreover, the Force will be with you. Always. - Obi Wan Kenobi