terça-feira, 31 de janeiro de 2017

Apesar de tudo

Aqui há uns meses, na TV do elevador do prédio onde trabalho, vi um conselho para pais. Dizia "Teach your kids to not be bystanders." -- Ensine os seus filhos a não serem meros espectadores.

Os Hoteis Trump pediam no Twitter memórias de viagens passadas e, em resposta, foram bombardeados por tweets. No meio dos tweets alguém partilhou este, do CEO da Airbnb. Ainda bem que há quem intervenha e tente velar pela dignidade dos que ficam presos nas malhas da loucura.

Adenda: Notem as datas dos tweets -- nada se perde na Internet.


O trabalho das imigrantes

Trump teve, até agora, três esposas: duas imigrantes e uma americana. Da americana teve uma filha; das imigrantes teve quatro filhos. O primeiro casamento com a imigrante Ivana Trump durou 13 anos; o segundo com a americana Marla Maples durou apenas 4 anos e ela nem assumiu o nome do marido; o terceiro com a imigrante Melania Trump já dura desde 2005. Note-se ainda que a imigrante Ivana Trump para além de ter os três filhos, manteve também uma vida profissional bastante activa, gerindo parte dos negócios de The Donald. Sem dúvida que a imigrante Ivana foi a mais produtiva de todas, provavelmente porque teve oportunidade de usar o equipamento enquanto este ainda não estava obsoleto, como explico abaixo.

Da imigrante Melania teve apenas um filho, mas tal é completamente compreensível, pois a aparência de Donald Trump deteriorou-se tanto que ele se assemelha a um pato -- sem ofensa para o Pato Donald --, o que piorou as condições de trabalho da imigrante Melania. É natural que, se a imigrante Melania fosse casada com uma pessoa com a aparência de um David Beckham, que é um grande "ham", i.e. presunto da melhor qualidade, a sua produtividade também se equiparasse à de uma Victoria Beckham, que, para além de ser uma grande mulher de negócios, é uma MILF (Mãe Irresistível, logo Fodível), com quatro filhos; ou, pelo menos, fosse tão boa como a da imigrante Ivana que teve a sorte de desfrutar de Trump enquanto este ainda aparentava ser um gato, logo tinha vontade de o foder só para o manter calado. Assim, à imigrante Melania apenas lhe apetece ficar no descanso da Torre Trump, em Nova Iorque, tal qual uma Rapunzel, e ser Primeira MILF, em vez de Primeira Dama. Esperemos que os motoristas, mordomo, e homens dos serviços secretos tratem bem a Primeira MILF. Quem sabe alguns não serão imigrantes...


Self-evident truths

"We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that they are endowed by their Creator with certain unalienable Rights, that among these are Life, Liberty and the pursuit of Happiness. — That to secure these rights, Governments are instituted among Men, deriving their just powers from the consent of the governed, — That whenever any Form of Government becomes destructive of these ends, it is the Right of the People to alter or to abolish it, and to institute new Government, laying its foundation on such principles and organizing its powers in such form, as to them shall seem most likely to effect their Safety and Happiness. "

~ United States Declaration of Independence, 4/7/1776

P.S. Acabei de receber a notificação no meu telemóvel, do NYT, a dizer que o Presidente Trump despediu a Attorney General por esta se recusar a defender a sua política de imigração.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Alternative Kellyanne Conway

Boas notícias, pessoal! Acabámos de descobrir a versão alternativa da Kellyanne Conway (foto da esquerda) em Portugal -- é a Maria João Ribeiro (foto da direita). Diz-nos ela que o problema de Trump é que as pessoas têm inveja dele: "Trump nasceu branco, rico e apreciador da beleza feminina. Para muitos, Trump seria o candidato perfeito se tivesse nascido negro, pobre e homossexual."

Inveja? Foda-se! Ó Maria João, é problemático seres loura porque estás a reforçar o estereótipo, mas o problema do Trump é ser burro, mal-educado, e julgar-se acima da lei. Achas que, se ele tivesse nascido pobre, teria o que tem?

As contradições

Na CNN, há uma peça acerca do condado nos EUA onde há mais utilizadores do Obamacare. Cerca de 1/3 da população usa, mas a maioria odeia ter de usar e odeia ser subsidiada. Querem tomar conta de si próprios, mas a noção do valor das coisas está completamente divorciada da realidade. Por exemplo, quando eu tinha 23 anos e vim para os EUA, há quase 22 anos, tinha de comprar seguro de saúde e custava $60 por mês. Naquela altura, trabalhava part-time na universidade, cerca de 12 horas por semana, por $5.15/hora (salário mínimo, na altura) antes de impostos, ou seja, uma semana do meu trabalho dava para comprar o seguro de saúde para um mês. Nessa altura, Hillary Clinton andava a tentar criar um sistema melhor de saúde e não a deixaram.

Uma das pessoas na peça da CNN queixa-se que o seguro de saúde do Obamacare começou por custar $50 só para ela, mas depois subiu para mais de $600/mês por causa de ter casado e de a família ter um bom rendimento. Pode receber seguro pelo emprego do marido, mas esse seguro não paga a gravidez e ela está grávida (é normal, nos EUA, os seguros não terem cobertura para mulheres grávidas, tratamento de infertilidade nas mulheres, aborto por necessidade médica, etc.). Estas são as mesmas pessoas que querem um serviço de saúde privado em que as companhias fazem o que lhes dá na telha, em vez de universal, que seria mais barato e teria níveis de cuidados mínimos, e depois se queixam dos preços serem altos e da cobertura ser uma porcaria.

O grande mercado de seguro de saúde é o das empresas: são as empresas que compram o seguro e os benefícios que querem oferecer e os empregados pagam parte do custo. Os preços de seguro fora desse mercado são muito mais caros, obviamente, porque a pessoa paga tudo ou tem de ser pobre para receber subsídio do governo. E as mulheres são discriminadas nos seguros de saúde, sempre foram. Acham que a Women's March era porquê?

Ou seja, quem está descontente e quer manter a porcaria de sistema que existe, trate de arranjar um emprego com os benefícios que quer -- nunca foi tão fácil arranjar um emprego, basta procurar na Internet (Indeed.com) e quase toda a gente tem acesso à Internet através do telemóvel. Também se pode procurar nos computadores dos centros de desemprego, nas bibliotecas, etc. Já há décadas que os EUA são conhecidos por ser um país com grande mobilidade de trabalhadores, mas essa mobilidade está a diminuir. Dado que tantas destas pessoas se queixam de não haver bons empregos onde estão, porque não se mudam?

Para além disso, os estados republicanos revoltaram-se contra o Obamacare e dificultaram e bloquearam a sua implementação porque queriam que o sistema funcionasse o pior possível. Agora os residentes queixam-se que o sistema não funciona e que a culpa é do governo federal, quando a culpa é da política seguida pelos governos a nível do estado. Lixam-se a eles e lixam os outros...

Reverter e afundar...

O blogue Gadfly da Bloomberg tem um post sobre a dívida soberana portuguesa. Aqui vai um pedaço, mas vale a pena ler tudo.

Portuguese yields had got low enough to suggest we were a long way from the bailout days of 2011-2014. While it's been a bad few months for bonds around the world, Portugal's are showing particular strain. Recent developments justify concern about Portugal's ability to depend on support from the Troika of the European Central Bank, European Commission and the International Monetary Fund. The government is doing itself no favors by straying from the austerity path. Portugal was the poster child for fiscal tightening during its three-year stint in intensive care, under the previous center-right government. The hard work paid off, as seen in the plunge in bond yields.

Portuguese bonds have widened 150bps to Germany since the summer. Trapped in its 232 billion euro ($248.2 billion) debt vortex, what has kept Portugal out of trouble is its adherence to the Troika’s demands for fiscal discipline. Its economy is one of the smallest in the euro zone, so the government just doesn't have scope to threaten officials with recalcitrance, as Italy can. While the ESM has plenty of funds to underwrite Portugal’s debt it would balk at allowing it to slip back into emergency measures.

The timing could not be worse as Portugal has bumped up against the ceiling of the ECB’s 33 percent issue and issuer limits for its Public Sector Purchasing Program. Ireland is in the same boat, as Gadfly's pointed out. Central bank purchases have been crucial in driving down Portugal’s bond yields, but instead of the 1.4 billion euro monthly pace that's allowed by program rules, this has dropped to 700 million euros in December and will likely fall further to a 440 million-euro pace. Portugal’s support mechanism is being taken away from it while it very much still needs all the help it can get.


Fonte: Bloomberg

Para quem se pergunta o que pode fazer pelos refugiados, aqui estão algumas indicações simples

Partilho um apelo da Mariana Vareta no facebook. Gostei muito de ler porque, para além de relatar a terrível situação nos campos de refugiados na Grécia, nos mostra que há quem ajude com eficiência e indica como é que cada um de nós pode ajudar. Acrescento apenas que os Médicos sem Fronteiras também são um grupo importantíssimo no terreno, e darão bom uso ao dinheiro que lhes enviarmos.
Por favor, leiam e partilhem.


Ajuda humanitária distribuída no último mês pelos vários projectos apoiados pela  
Help Refugees na Grécia.

 
 A aquecer as mãos em fogões portáteis.


“Potential disruption due to extreme low temperatures”. É o aviso meteorológico para os próximos dias no Norte da Grécia, para onde parto na segunda-feira para mais 3 semanas de voluntariado com refugiados (para quem possa ficar baralhado, é verdade que já fui no dia 10, mas tive que voltar de urgência por razões pessoais).
Quando cheguei a Portugal em Agosto, depois de 4 meses na Grécia, já vinha com a ideia fixa de voltar no pico do Inverno. Já nessa altura prevíamos que, apesar de todos os apelos, os campos não iam ser preparados a tempo e ia ser outra vez um drama. Mal nós sabíamos que vinha aí o pior Janeiro das últimas décadas.
Durante os últimos meses, perdi a conta às vezes que me perguntavam “se aquilo por lá andava melhor” e eu pensava para mim mesma “meu deus... as pessoas estão mesmo a leste”. É mesmo a única vantagem desta vaga de frio: ser uma nova wake up call.
Sinceramente, ainda não percebi como é que não morre mais gente. Ainda há centenas de pessoas - bebés e crianças incluídos - a viver em tendas de pano montadas em cima de cimento húmido, dentro de fábricas geladas, com as portas e as janelas partidas.

domingo, 29 de janeiro de 2017

Questões Fra(c)turantes: Uma Fra(c)tura de Ideias

Este post resulta de uma parceria intelectual que não será, adivinha-se, a co-autoria comum: os seus autores estão em discordância. Bom, Nuno Garoupa e Vera Gouveia Barros partilham, naturalmente, alguns pontos de vista. Mas, depois, divergem nas suas opiniões e concordam em discordar. 

O Nuno publicou um artigo no DN sobre as questões “fraturantes” (ele usa o AO90), mas a Vera discorda da definição de questão “fracturante” (ela é contra o AO90). Entre o Nuno e a Vera, o AO90 não é uma questão fracturante porque, apesar das preferências do Nuno, este post segue o estilo anterior ao AO90 (o que, de resto, está conforme o mais recente parecer da Academia das Ciências de Lisboa).

Mas comece-se pelas ideias que ambos subscrevem a propósito deste tema. Para depois cada um desenvolver a sua posição de discórdia.

O que torna uma questão fracturante? Nuno e Vera concordam que (i) divide a sociedade, gerando um importante debate, (ii) diz respeito a valores morais e a uma noção, mesmo que eventualmente difusa, de regressão/progressão civilizacional, (iii) no espaço público, definem-se posições de defesa ou repúdio, possivelmente com algum radicalismo na retórica usada.

E, então, as opiniões dividem-se…

Nuno: Para além de satisfazer (i)-(iii), uma questão fracturante, por ser moral e fundamental para a organização da sociedade onde vivemos, é uma prioridade política. Portanto, assim que haja uma maioria parlamentar favorável, a legislação é alterada ou revogada. Consequentemente, quando não há reversão, seja por distracção, seja por que não é uma prioridade durante anos, ou mesmo décadas, a questão não é fracturante. Quanto mim, é a possibilidade de revogação ou alteração assim que a maioria parlamentar permitir que distingue uma questão fracturante de um qualquer outro tema onde há apenas uma divergência ideológica.

Assim, por exemplo, aborto, matrimónio homossexual, direitos LGBT podem ser questões fracturantes em Espanha ou nos Estados Unidos, onde os conservadores ou os católicos, assim que tiveram influência, procuraram inverter a legislação “progressista”. Não são questões fracturantes em Portugal porque não houve qualquer pressão da direita católica para mudar seja o que for. Não quer dizer que a direita católica aderiu ou mudou de opinião. Apenas quer dizer que são questões incómodas, mas não prioritárias. Logo, não sendo prioritárias, são meras divergências de opinião e não questões fracturantes.

Por contraponto, os contratos de associação com colégios privados, sim, são uma questão fracturante. Porque cada maioria parlamentar, na ultima década, dedica-se a revogar a legislação anterior para impor um ponto de vista no modelo de educação. Portanto, não há uma mera divergência, mas sim uma fractura que cada lado tenta corrigir assim que tem capacidade para isso.

(Aqui também discordo da Vera porque acho, sim, que os contratos de associação com colégios privados dizem respeito a valores morais e a uma noção de progresso civilizacional, pelo menos desde a Revolução Francesa).

Vera: Eu rejeito a noção de que uma questão, para merecer o epíteto de fracturante, deva ser prioritária, quer no discurso, quer na acção. As prioridades são sempre relativas e determinadas pelo contexto, como nos ensina a pirâmide de Maslow. Ora, como o Nuno repetidamente afirma, a Direita tem governado em alturas de crise económica. Parece-me, pois, que, com o défice orçamental fora de controlo, a dívida pública a escalar, o financiamento à economia cortado, o desemprego a aumentar, a população a emigrar, impedir o casamento de pessoas do mesmo género ou reintroduzir a criminalização das mulheres que abortam não seriam questões a constar no topo da agenda política.

Para refutar este meu argumento, o Nuno usa o caso espanhol, onde a Direita reverteu aquilo que eu considero progressos civilizacionais, apesar de a economia espanhola enfrentar problemas semelhantes aos nossos (nos sintomas, pelo menos). Eu repito a ideia de que a prioridade não é requisito para a fractura. E acrescento que as palavras contam. Ou seja, aquilo que se diz sobre determinado assunto não é inconsequente. E, na ausência de acção legislativa sobre o tema – o que, a meu ver, se explica bem pelas circunstâncias socio-económicas –, o discurso é tudo o que temos sobre as posições que se defendem. Aliás, ideologicamente Direita e Esquerda estão separadas no entendimento que fazem do papel do Estado. No peso que querem que este tenha, pelo menos. E, no entanto, não me lembro de um Governo que tenha repensado as funções do Estado ou reduzido significativamente a carga fiscal. Nesse sentido, diria que não é a Direita conservadora que não encontra representação, mas sim a Direita que é liberal.

(Já agora, o exemplo dos contratos de associação com os colégios privados é que me parece não ser uma questão fracturante, pelo menos na acepção em que ambos até concordamos, pois, não obstante ter havido acção, dificilmente se lhe poderia associar um cunho moral ou colocá-la na recta real do progresso civilizacional.)

Obviamente, não sou tão ingénua que tome o discurso político como sempre genuíno. Isto é, admito perfeitamente que palavras e sentimentos sejam dissonantes. Mas repare-se na primeira condição para que uma questão seja fracturante: dividir a sociedade. A sociedade, não os partidos políticos. Temas como o aborto ou os direitos LGTB cumprem-na. E – é a minha percepção – dividem a sociedade de uma forma não equitativa, já que os portugueses são maioritariamente conservadores. Note-se, aliás, que o Bloco de Esquerda que tinha a “agenda fracturante” era o que só conseguia dois deputados e ambos por Lisboa. Foi quando o seu discurso passou a integrar mais “trabalhadores” e menos “homossexuais” que ganhou lugares na Assembleia da República.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

O preço do menu

Como vos contei aqui há uns tempos, tenho alguma perda de audição e a minha médica queria que fosse medida. Fiz uns testes e uns exames e finalmente tive uma consulta com um otorrinolaringologista, que recomendava uma cirurgia, mas que era uma escolha minha. Perguntei-lhe acerca da causa do problema e dos riscos e preço da cirurgia. Mesmo depois de ter feito exames, o médico não sabe o que se passa exactamente com os meus ouvidos. O mais provável é os meus ossos terem uma qualquer deformação, que afecta a dissipação das ondas de som que entram no ouvido. Como tive sarampo quando era bebé (depois de ser vacinada), essa pode ser a causa do problema. Ou também pode ser por eu ter tido muitas infecções nos ouvidos quando era criança. Se me operar, talvez consiga identificar o problema e repará-lo.

Relativamente aos riscos da cirurgia, eu perguntei acerca da taxa de sucesso e ele disse 80%. Depois, para além de poder não resolver o meu problema, pode também haver a possibilidade de não funcionar -- por exemplo, pode ser que acabem por meter uma pequena prótese e esta saia do sítio -- ou de ficar pior do que o que estava, pois há um nervo que passa por perto do sítio onde ele tem de operar e que, se for danificado, eu poderia ficar com a cara parcialmente paralisada. Como ele não sabe a natureza do que eu tenho, não sabe se dá para entrar apenas pelo ouvido ou se tem de fazer um corte por detrás da orelha, etc., logo não sabe exactamente por onde terá de andar. Perguntei qual o risco de complicações sérias e ele disse-me um número que eu achei muito alto, já não me recordo exactamente, mas era bem maior do que um por milhão. Dado que funciono muito bem com o nível de audição que tenho, fiquei muito reticente.

Enquanto estávamos a conversar, ele mostrou-me os resultados do meu teste de audição e disse que o melhor era operar o ouvido esquerdo primeiro, pois era nesse que havia maior perda de audição. Disse-lhe que não, eu ouço pior do meu ouvido direito, pois para esse os sons muito graves são quase imperceptíveis. E depois pensei para os meus botões: "Olha, Rita, isto está giro, para saber o que se passa, ele precisa mesmo de fazer uma expedição exploratória aos teus ouvidos! Isto é a época dos Descobrimentos outra vez..."

Quando perguntei dos custos, levei a resposta do costume: "Não sei, os custos não são comigo". Mandou-me falar com a assistente dele para marcar o dia da cirurgia -- era uma cirurgia de opção, eu não tinha de a fazer, mas marcava já e depois podia desistir. A rapariga que trabalhava com este médico não sabia quanto ia custar, mas disse-me para esperar um telefonema da assistente que tratava do seguro para me dizer qual a minha porção do pagamento depois da comparticipação do seguro.

Hoje telefonaram-me de anestesiologia para marcar a consulta pré-cirurgia, mas eu ainda não tinha falado com a moça do seguro, logo não quis marcar porque nem sabia se iria fazer a cirurgia. Dizia-me a rapariga que não tratava das coisas do seguro, mas que eu estava à vontade para ir à consulta porque não custava nada. Eu dizia que o custo não era zero, ela dizia que sim, era; voltei a insistir que não era e achava um desperdício ir à consulta sem saber se ia fazer cirurgia. Ela irritou-se e despachou-me.

Falei depois com a moça que trata do seguro que me disse que, pela minha parte, tenho a pagar $200. Perguntei se esse era o custo total da cirurgia e ela disse que não, essa era a parte dos custos do hospital; ainda faltava ver quanto ia cobrar o cirurgião e o anestesiologista, e que coisas iam usar durante a cirurgia, etc., e nem sequer sabiam quem ia ser o anestesiologista, ou seja, só depois de me operarem é que saberiam o custo desta festa toda. Mas não era nada com ela porque ela só tratava da porção dos custos do hospital e do seguro dessa parte.

Eu acho sempre tão engraçado quando ouço pessoas dizer que os cuidados de saúde seriam prestados mais eficientemente pelo sector privado. Quem é o idiota que vai ao restaurante e decide o que vai comer sem ver os preços do menu?

quinta-feira, 26 de janeiro de 2017

Coincidência Infinita

Autor: Richard Willmsen

Tese: Donald Trump is going to snap very soon, and here is how I know

Justificação: ler aqui

Excerto da Justificação:
"I used to suffer from a quite disabling insecurity, particularly when it came to things like being creative and forming relationships with other people. I got better, partly by virtue of living in and studying Portugal, learning about its people’s tendency to swing between moments of self-aggrandisement and self-abnegation, from ‘we are great’ to ‘we are nothing’. I also learnt about my own habit of projecting my own feelings onto others, both people and countries. The work of the Portuguese poet Fernando Pessoa showed me that we’re all characters on a stage acting out different roles, and that that is okay. I identified strongly with the philosopher Eduardo Lourenço’s diagnosis that Portuguese people tend to suffer from taking on too many identities, and I took enormous inspiration, consolation and guidance from his insights that Portugal is ‘marvelously imperfect’, ‘no worse and no better than anyone else’, and that progress comes from accepting one’s limitations."

Marcha à frente!


Teorizar a (in)fidelidade

O Tyler Cowen tem uma op-ed na Bloomberg em que explica a lógica por detrás do tipo de mentiras que Trump usa e das mentiras dos que trabalham para ele. Diz ele que se tratam de testes de fidelidade, pois as mentiras são tão óbvias e fáceis de ser refutadas, que só quem é fiel a Trump se disponibiliza para fazer estas figuras. O mesmo raciocínio é aplicável aos apoiantes de Trump. Mas eu diria que a mesma coisa se passa com muitos Republicanos que não votaram em Trump.

Há uns dias, um antigo colega meu, que é Republicano, mas não votou no Trump, dizia o seguinte:
Quando o Reagan foi eleito, o facto de ele ser divorciado foi problemático. Quem é que baixou o limite da moralidade? Ironicamente, foram muita das pessoas que marcharam no Sábado. Ao justificarem repetidamente e encobrirem Bill Clinton, o limite da moralidade baixou. A rua por onde o Trump passou foi construída pela National Organization of Women.

Hã?!? Pois, é a isto que estamos reduzidos porque, se há asneira da parte dos Republicanos, deve ser culpa das mulheres, não é culpa dos Republicanos que votaram no homem e o deixaram chegar onde chegou -- aliás, quem elegeu o divorciado Reagan? Culpe-se as mulheres de os homens não conseguirem manter a pila nas calças. Há um remédio muito simples: corte-se a pila destes gajos.

Soma, mas não segue...

Sempre que os jornalistas portugueses dizem que o Obama duplicou a dívida, há um gajo português que me manda um email a dizer que o não-sei-quantos disse que o Obama duplicou a dívida pública. Já me contactou umas quatro vezes sempre com a mesma argumentação de que alguém disse isso. Estou a perder a paciência e não é raro dizer ao rapaz que é burro e mal-educado porque já lhe expliquei onde ele devia ir buscar a informação -- dados primários, criaturas! --, em vez de me andar a fazer perder tempo.

Hoje mostrei os dados outra vez. Fui ao site do CBO buscar as tabelas e mostrei-lhe. Tenho a certeza de que não vai perceber ou, se perceber, vai esquecer-se e daqui a não sei quantas semanas envia-me outro email com a mesma lenga-lenga. Dava-me jeito que os jornalistas portugueses aprendessem a recolher dados nos EUA, mas duvido que tal aconteça. Em sua defesa, para saberem o que procurar têm de saber um pequeno detalhe: Obama assumiu a dívida pública de Bush que estava escondida nas apropriações dos orçamentos suplementares.

As guerras de Bush foram financiadas a dívida -- foram as primeiras guerras na história dos EUA que foram financiadas a dívida, em vez de um aumento nos impostos (Bush cortou impostos, se se recordam). Aconteceu um bocado como com o Governo Sócrates em Portugal, durante o qual parte da dívida foi contraída de forma a não ser contabilizada como dívida pública, mas depois a Troika forçou o governo de Pedro Passos Coelho a assumir essa dívida, ou seja, a dívida aparece como sendo do governo PSD/CDS, apesar de ter sido contraída pelo governo PS. Prestem atenção a estas coisas porque o governo da Geringonça, não tendo a supervisão da Troika, também anda metido em contabilidade criativa.

Já se vislumbra que parte da dívida da administração de Trump será escondida. Por exemplo, o custo de repelir o Obamacare não pode ser anunciado pelo Congressional Budget Office, de acordo com uma resolução da Casa dos Representantes (ver páginas 25 e 26), datada de 2 de Janeiro de 2017. Estima-se que esse custo seja de $350 mil milhões durante 10 anos, mas enquanto dos Republicanos controlarem ambas as câmaras do Congresso, não saberemos. Outro exemplo, o custo de construir o muro entre os EUA e o México está estimado em $12 a $15 mil milhões. O Presidente Trump anunciou ontem que seria pago pelo México, ou seja, não é dívida americana -- é um crédito dos EUA com o México.

Ah, querem os dados primários da dívida americana? Então dêem um pulo ao Congressional Budget Office, onde encontram o histórico dos Orçamentos (o mais recente aqui, numa folha de cálculo de Março de 2016) e apropriações suplementares do orçamento que estão aqui. Comparem a evolução das apropriações suplementares de Bush com as de Obama para perceberem a diferença.

Declarações à padeiro

Nuno Carvalho, um dos donos da cadeia 'Padaria Portuguesa', parece ser um apoiante ferveroso de uma maior flexibilização do mercado de trabalho. Está bem de ver. Com despedimentos mais fáceis, pode disciplinar-se melhor a força de trabalho, premiando o mérito e punindo a incompetência. A resposta pública a estas declarações, amplamente negativa, mostra a imensa ironia da premissa do empresário. Num mercado laboral com a natureza proposta pelo senhor Nuno Carvalho, a posição dele enquanto gestor (e enquanto dono, mas em menor grau, admito) estaria em risco. As declarações que fez publicamente teriam um custo elevado para a empresa que tem à sua (co-) responsabilidade. O que, num mercado laboral liberalizado, teria um custo para ele próprio, enquanto gestor.

Não é preciso ser um génio para compreender a natureza deste fenómeno. Há empresas de restauração no país que me acolhe que entenderam há muito tempo as vantagens de se colocarem publicamente no outro lado da barricada, face ao lado que Nuno Carvalho ocupa com tanta confiança. O pret a manger, uma cadeia gigantesca de fast food "saudável", cresceu com base numa estratégia de marketing que incluia a promessa de pagar mais que a média aos seus empregados, e os tratarem de uma maneira urbana. No seu site, ainda hoje em dia referem que os "Team members at Pret work hard, have fun, wear jeans, learn a lot and really grow. 78% of our Managers started as Team Members." . A Innocent, uma espécie de Compal, refere no seu site que "we want to create a business we can be proud of. So to make this happen, we need brilliant people who inspire and deliver change all around them. That's why we're always looking for talented, ambitious and altruistic folks to come and join us." São vários os exemplos de empresas deste tipo que fazem publicamente promessas semelhantes. Estranhamente, não há referência à vontade de pagar salários o mais baixo possíveis, e à necessidade de poder despedir com facilidade. Bons gestores compreendem que os seus clientes, além de se preocuparem com os preços que pagam pelos bolos, não se querem sentir culpados por estarem a patrocinar sweatshops. Maus gestores não compreendem isso, e lesam os interesses das suas empresas. Num mercado laboral de gestores que fosse competitivo, não teriam lugar. Infelizmente, a Concorrência é um problema sério em Portugal, e isso reflete-se no à-vontade com que os gestores de topo fazem disparates grosseiros, sem punição.

E, esse sim, é um problema sério a resolver, e que é responsável pelo atraso económico português. Bem mais que os coitados que ganham menos de 600 euros. 

Trumpocalipse Now

Achava (e continuo a achar) muita de revolta quanto ao Trump extremamente excessiva, principalmente fora dos EUA. Sendo que a grande maioria da mesma vem de pessoas “de esquerda” torna-o ainda mais desmesurado, principalmente quando muitas destas pessoas são as mesmas que se revoltam quando alguém usa os EUA como um bom exemplo seja no que for. (Quem é que nunca teve uma discussão com alguém em que acaba a revirar os olhos após a pergunta inevitável: “Mas os EUA são um bom exemplo porquê?”, ou qualquer variação da mesma?)

Atenção! Estou plenamente solidário com os meus amigos americanos. Tenho pena que o país deles esteja prestes a sofrer um retrocesso de anos ou décadas nos direitos de milhões de pessoas, sejam elas mulheres, imigrantes, ou quaisquer outros. Ainda assim, seja o Trump tão mau quanto muitos prevêm, os EUA continuarão a ser um dos melhores países para uma mulher nascer. É um pouco (ou talvez muito) triste que a indignação pelo facto de as mulheres americanas estarem prestes a perder alguns dos seus direitos seja tão mais profunda (ou pelo menos histérica) do que a solidariedade (activa) pelas mulheres por esse mundo fora que podem não ter acesso ao mercado de trabalho, podem não ter liberdade para escolher com quem se casam ou podem até ser compradas e vendidas. Mas hoje em dia, o importante parece mesmo ser por quem os sinos dobram. Ou ter a certeza que toda a gente sabe que os dobramos. Ou talvez nem tanto, porque para muitos os sinos nem sequer chegam a dobrar.

Posto tudo isto, este post é maioritariamente para fazer uma mea culpa. Enganei-me profundamente. Argumentei durante semanas que não era justo ou muito lógico esperar que o Trump cumprisse (todas) as promessas disparatadas que fez na campanha eleitoral. Primeiro, porque nenhum político cumpre metade do que promete. E segundo porque o Trump tratou as eleições com um concurso de celebridades - e portanto seria porventura ainda menos provável que seguisse a maior parte das suas promessas do que qualquer outro politico. O problema na minha lógica foi não considerar que, neste caso, como em quase todo o que diz respeito ao Trump, a lógica inversa se aplicava: que, por ele ser tão diferente de todos os políticos "normais", em vez de cumprir menos promessas que o politico "normal", poderia passar a cumprir TODAS as promessas. NA PRIMEIRA SEMANA. Aqui fica a lista dos meus argumentos, e da triste realidade que sublinha a minha ingenuidade:

  • O muro: O meu argumento era que ele ia adiar a coisa, até chegar ao impasse quanto ao financiamento e dizer “Pronto, pelo menos tentei!”, e acabar por só apertar um bocado as regras de emigração que, não sendo algo que apoie, não é propriamente apocalíptico. Parece que afinal o muro é mesmo para construir. JÁ!
  • As mulheres: Os direitos das mulheres, e a própria retórica sobre género estavam condenados a sofrer. Uma erosão tão rápida e fulminante, era o pior que se podía esperar. Pelo menos até ele começar a agarra-las pela co** em jantares de estado. (As odds estão a 5-1 a favor de ele implementar um novo "aperto de mão" para as mulheres do staff dele antes do Natal).
  • O sistema eleitoral: depois de ganhar, era certinho (achava eu) que deixasse o sistema em paz. Porque ninguém se queixa da arbitragem quando ganha o jogo. Afinal quer investigar a potencial fraude que, a comprovar-se justifica segundo Trump uma mudança (ninguém sabe bem qual) sobre as regras eleitorais. A brincar a brincar, é assim que (quase) todos os ditadores começam.
  • A imprensa: Achava eu que, com a ajuda da economia, ia andar mais sossegado nos primeiros tempos a inaugurar e visitar coisas, e queixar-se só de vez em quando. Em vez disso, em menos de uma semana a relação deteorou-se ao ponto de haver “factos alternativos” e ter terminado com a comitiva de imprensa que antes viajava com o presidente para todo o lado. Isto para não falar dos ataques à CNN ou as conspirações sobre o número de pessoas na inauguração. A sorte é que com a Internet, a censura é um bocadinho mais complicada. Já a desinformação...
  • Obamacare: Estava com esperanças que tentasse ver-se livre do Obamacare e falhasse. Ainda pode ser que tenha razão, mas saltar-lhe em cima tão rápido é preocupante, ainda que nada tenha sido feito com efeitos práticos significativos de momento.
  • O meio ambiente: A minha esperança era que, pelo menos no início, as relações de proximidade com os amigos ricaços lá do sítio fossem menos preponderantes do que se esperaria. Em vez disso, já deu o aval para a construção da linhas de transporte de óleo no Dakota e em Keystone apesar das queixas sobre o impacto ambiental, e um mês depois da  Army Corps of Engineers ter concordado estudar localizações alternativas para a construção das mesmas, assim como um estudo de impacto ambiental (inexistente até à data!)

Em 2017, as únicas coisa que parecem desaparecer mais rápido que o meu (relativo) optimismo são as as hipóteses do Sporting ganhar o campeonato.

Por isso, aqui fica: Estava redondamente enganado.  As minhas desculpas.

Bem-vindos ao Trumpocalipse. 

quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Salvo pelo Dow!

O índice Dow Jones superou 20.000. Há quem argumente que, hoje em dia, o Dow não tem grande valor informativo, mas é divertido acompanhar o índice. O Presidente Trump ficou tão contente que até emitiu um tweet oficial na sua conta nova:


Lapsus linguae

Eu sou uma pessoa não muito versada em acrónimos e siglas, confesso. De modo que só muito recentemente vi a referência a POTUS. Juro que a primeira leitura que fiz foi POTRO.

O Trump responde

O Miguel Madeira iv* colocou uma questão bastante pertinente no meu penúltimo post: perguntava ele se a oposição a Trump não serviria para o fortalecer em vez de enfraquecer. Para responder, vale a pena fazer o enquadramento histórico do que os eleitores democratas estão a sentir.

Quando George W. Bush foi eleito pela primeira vez com a decisão do Supremo Tribunal, os Democratas ficaram decepcionados, mas não houve grandes manifestações em Washington, nem pelo país inteiro com a mesma força com que agora se opõe Trump. Antes dos ataques de 11/9/2001, a imagem de Bush já estava bastante deteriorada, pois a economia não parecia ir a lado nenhum apesar dos cortes de impostos e a maior parte da cobertura mediática da Administração limitava-se a discutir a má dicção de Bush.

Os ataques deram um novo rumo a Bush e conseguiram apoio popular, tanto a nível nacional, como mundial. Já a decisão de invadir o Iraque levantou bastantes questões, mas a Administração Bush decidiu acusar de anti-patriotismo quem se opunha. Muitos Democratas no Congresso, como Hillary Clinton, sentiram-se encurralados e capitularam, apoiando a invasão. Essa decisão de Clinton foi um dos pontos fortes com que Obama a derrotou nas primárias de 2008.

A percepção dos eleitores democratas é que uma Administração Trump irá desenrolar-se de forma semelhante à de Bush e, como tal, mais vale opor-se desde o início do que lhe dar folga para que alguma coisa corra mal. O comportamento actual dos Republicanos reforça esta ideia, pois há um sentimento generalizado nos eleitores democratas de que os Republicanos demitiram-se dos valores políticos e morais que dizem ter e não fiscalizarão uma pessoa como Trump, assim como não fiscalizaram Bush.

Os Democratas acham que fizeram o seu papel ao bloquear o extremismo de Bernie Sanders, enquanto que os Republicanos passaram o tempo a alimentar extremistas, a começar com o convite que John McCain fez a Sarah Palin e a terminar na eleição de Donald Trump. Por outro lado, se os Democratas não fizerem nada, também correm o risco de deixar a oposição a Trump nas mãos de extremistas piores do que Bernie Sanders, que têm espaço para crescer e monopolizar o partido.

Hoje de manhã, o Presidente Trump mandou investigar a votação eleitoral para ver a prevalência de fraude eleitoral, especificamente o papel do voto dos imigrantes ilegais. Será que algum Republicano acha que isto compromete a força da Democracia americana ou do seu Presidente?

* Afinal não era o Miguel Madeira; era o iv. Li o comentário numa mensagem de e-mail e dava a autoria ao Miguel Madeira porque ele tinha sido o último a comentar. Não reparei que havia mais do que um comentário.

Demita-se

Tenho conhecido vários Trumps ao longo da vida. São homens com um ego seco, mirrado, que conduzem carros topo de gama, maltratam os empregados nos restaurantes e se fotografam com acompanhantes de luxo, algumas pagas de uma vez, outras às prestações. Toda a gente os goza em surdina, mas raramente de frente, pelo que podem facilmente passar uma vida inteira a achar genuinamente que estão a impressionar o mundo com o seu "sucesso". Este, ao menos, está finalmente a perceber que é visto pelos outros como aquilo que realmente é

 Tem bom remédio. Ainda vai a tempo de salvar o ego. Demita-se.

O porquê

Porque é que o Trump foi eleito?
Porque os Republicanos mainstream acham que a culpa da Grande Recessão foi do Obama.

Os anti-democratas

O Alexandre Homem Cristo é mais um dos portugueses que acham que manifestarmo-nos contra Trump e as suas políticas é anti-democrata e que nós já vimos este filme com os ataques a George W. Bush. Tanto ele como Rui Ramos acham os inimigos de Trump muito perigosos.

Diz o Alexandre que as democracias modernas medem-se pela forma graciosa como se perde. Não sei de onde saiu esta ideia de democracia, mas não é a mesma ideia que os americanos têm. George W. Bush foi Presidente depois de um processo em Tribunal: Bush vs. Gore. Adivinhem quem iniciou o processo... Pois foi: George W. Bush e Dick Cheney. Porque é que o Alexandre não acusa este dois de falta de graciosidade e de serem anti-democratas?

Será que os portugueses não se recordam que Clinton teve um impeachment por ter pseudo-sexo na Sala Oval (foi salvo de deposição pelo Senado)? E Nixon foi deposto por um impeachment. Donald Trump, que hoje é Presidente, foi a favor de se fazer um impeachment a George W. Bush, ergo, de acordo com o critério do Alexandre, Donald Trump é anti-democrata!

terça-feira, 24 de janeiro de 2017

Shape up or ship out

Um imbróglio da TSU foi, mais uma vez, a estratégia escolhida para provocar uma crisezinha num governo de Portugal. Crises há muitas, mudanças há poucas. Catarina Martins lá arranjou maneira de dizer que não vale a pena antecipar eleições, que a Geringonça está como sempre esteve: sólida. Ela percebeu a mensagem de António Costa: "Shape up or ship out", ou se portam bem, ou vão para a curva.

Não há nada de novo em Portugal; era expectável que António Costa governasse assim.

Coerência

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

#AlternativeFacts

"We have to be honest with the American people. I think sometimes we can disagree with the facts...our intention is never to lie"

~ Sean Spicer, Press Secretary

(O Eng. Sócrates já tem uma nova linha de defesa em tribunal.)

O tamanho é importante!

Está ainda a decorrer a recolha de estimativas de quantas pessoas participaram nas marchas de Sábado, nos EUA. De acordo com Jeremy Pressman (Universidade do Connecticut) e Erica Chenoweth (Universidade de Denver), o total estará algures entre 3,3 e 4,6 milhões de pessoas, como podem ver na folha de cálculo que disponibilizaram, que inclui as fontes para os dados.

Agora vem a parte preocupante para os homens: suspeita-se que isto foi a maior manifestação, a nível nacional, na história dos EUA, ou seja, as mulheres gostam mesmo de coisas grandes.


A realidade morde...

"Kentucky Republican Matt Bevin ran for governor on a platform devoted almost exclusively to killing Obamacare, including its expansion of Medicaid insurance to the poor. He didn’t do it. Following in the steps of eight Republican governors who sought to expand Medicaid without appearing to do so, he applied for federal permission to add Republican-friendly tweaks to the program instead.

The decision was a nod to reality. By the time Bevin took office at the beginning of 2016, almost one in three Kentuckians had Medicaid or insurance through a federally subsidized Affordable Care Act plan. Many of them didn’t know it when they elected the new anti-Obamacare governor, a side effect of how Kentucky marketed the plans.

State Branding

Kentucky pushed Obamacare as anything but Obamacare in order to sidestep political hostility to the president, whose position on coal made him unpopular in a state with roughly half the coal jobs it had in 2010. Enrollees signed up for Kynect, the state’s brand of the health-law insurance, not Obamacare. Medicaid recipients enrolled through managed-care companies that handle the program, including Louisville, Kentucky-based Passport Health Plan.

“A lot of people, they just know they have insurance but they don’t know it’s Obamacare,” said Amber Lewis, 34, who sells guns, Kennedy half dollars, baseball cards and knives every day at a booth at the Bull Creek Trade Center in Prestonburg, Kentucky.

“They say they have Kynect insurance, or Passport insurance, I hear it both ways,” said Lewis, who has insurance for the first time, pays nothing for it and knows what it is. “I know what I have. I have Obamacare.”"


Fonte: Margaret Newkirk, Bloomberg

domingo, 22 de janeiro de 2017

A Direita que se cuide

Uma das políticas que Donald Trump quer implementar é investir em infra-estrutura pública. Como irá ser pago? Através de parcerias publico-privadas. Onde irá ser gasto? Não se sabe, mas supõe-se que Trump irá querer recompensar quem votou nele. Os eleitores de Donald Trump localizam-se em áreas com baixa densidade populacional e nível de educação baixo. Se a infra-estrutura for aí localizada, não criará tanto crescimento para o país, especialmente porque a infra-estrutura mais envelhecida foi construída para uma economia que já não existe.

Os mais atentos notarão que isto poderá acabar sendo uma armadilha de empobrecimento, pois má localização dos gastos em infra-estrutura, sem levar em conta análise de custos-benefícios, é uma das razões pela qual Portugal se endividou e esta política não gerou crescimento para o país, mas sim empobrecimento. Outra coisa que as PPPs permitem é que se esconda a dívida pública, como descobriu o governo de Pedro Passos Coelho, quando a Troika fez as contas à dívida portuguesa.

Pela minha parte, estou ansiosa por ver os comentários da Direita portuguesa, a elogiar as PPPs de Donald Trump e a olhar para o lado quando a dívida pública americana começar a crescer. Antecipo até que se abrirá uma brecha para José Sócrates: se ele se converter ao PSD, pode facilmente ascender a líder do partido com o mote "Enaltecer Portugal Outra Vez!"

Yes, we can!

Como deve ser do vosso conhecimento, na Sexta-feira, Donald Trump tornou-se Presidente dos EUA. O dia teria sido um completo desastre, não fora o nosso colega de blogue Nuno Garoupa estar em Houston e termos aproveitado para fazer um mini-jantar da DdD. No final de algumas horas a falar português, fiquei mais animada e pronta para a manifestação de Sábado.

De manhã, encontrei-me com alguns amigos americanos para participar na Women's March de Houston. Iniciámos a marcha em Jamail Skate Park, em direcção à City Hall. Pensámos que estávamos atrasados, mas chegámos mesmo na hora exacta e ficámos perto do início da marcha. A polícia estava à nossa frente a pé e abria caminho.

sábado, 21 de janeiro de 2017

A popularidade dos populistas

O Nuno Garoupa tem escrito alguns textos interessantes sobre o populismo. De acordo com a definição que utiliza do termo, Portugal, em princípio, estaria nos próximos tempos imune a este espectro que ronda o resto do mundo ocidental. Talvez. Desgraçadamente, não há nenhuma definição consensual sobre este conceito. De qualquer maneira, o Nuno utiliza dois critérios para o definir ou circunscrever. Primeiro, a oferta de respostas simples para problemas complexos, ou seja, a existência de uma componente demagógica - um populista é sempre um demagogo, embora nem sempre o contrário seja verdade. Segundo, um discurso antissistema - contra as elites do poder. Ora, com base nestes critérios, não vejo como é que se pode excluir o Bloco e o PCP dos movimentos populistas que abalam o mundo. Renegociar a dívida ou a saída do euro não são respostas simples para problemas extremamente complexos? Detestar o capitalismo, a democracia liberal, os empresários (vulgo “capitalistas”) não é estar contra o sistema? Talvez o Bloco e o PCP não sejam neste momento populistas, mas então, a meu ver, esta definição de populismo está incompleta.
Em entrevista ao "Observador", Jan-Werner Müller descarta o discurso antissistema (que, segundo o autor, até pode ser visto como salutar) ou o discurso sobre certas temáticas (a emigração, por exemplo) como sintomas do populismo. A característica principal de um populista é apresentar-se como o único representante legítimo do “verdadeiro povo” (seja lá o que isso for) - só ele pensa e fala como o “povo real” pensa e fala. De acordo com Müller, Bernie Sanders ou o Podemos não representam movimentos populistas, porquanto não se apresentam como os únicos representantes legítimos da “maioria silenciosa”. Isto parece-me altamente discutível.

21.01.2017 - Marcha das Mulheres em Berlim



Diversidade, generosidade, harmonia.

Gostei de passar esta hora no meio de pessoas assim, falar com elas, ver que não estou sozinha, enternecer-me com a criatividade e o sentido de humor.
  
Ao sair, deparei-me com um pequeno memorial. Só então me lembrei do risco de atentados terroristas. Se havia ali polícias, não vi. Berlin, Du bist so wunderbar!








sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Amanhã, marchamos!

Amanhã, por todo mundo, marchamos pela nossa dignidade. Em Portugal, haverá marchas em Braga, Porto, Coimbra, Lisboa, Faro, e na Ilha da Terceira. Podem ver o mapa aqui. Eu estarei na de Houston e vocês?




Começou a contagem



Ou podem visitar visitar a página oficial da contagem para o último dia de Trump deste termo. (Ah, deixem-se de parvoíces: quando o Obama foi eleito, quem não gostava dele também fez o mesmo.)

Chegámos às ruas

A Destreza das Dúvidas chegou ao Correio da Manhã.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

O eixo do mal

Por estes dias, uma amiga minha comentou que estava a resistir à tentação de fazer piadinhas sobre a aparência física do Trump. Sugeri-lhe que não o faça, lembrei o velho ditado "não lutes com um porco: vocês os dois vão acabar sujos de lama e o porco vai adorar".

Sou óptima a dar conselhos aos outros... Mas, pelo meu lado, se penso na cerimónia de tomada de posse do Trump que vai ter lugar amanhã, deparo-me com um terrível impulso de Schadenfreude. Rebbeca Ferguson é convidada para cantar na cerimónia de tomada de posse de Trump, e responde que só o fará se a canção escolhida for Strange Fruit, hihihihi, embrulha essa, Trump. A única estrela que vai cantar a solo é Jackie Evancho, uma miúda de 16 anos que se revelou no "America's got talent" a cantar "o mio babino caro". Hihihi, foi o melhor que se arranjou para cantar o hino nacional à frente do Trump, hihihi, uma miúda de 16 anos. Para o Obama, foi a Aretha Franklin. Hihihi. E o baile, hehehehe, quero ver quem arranjam para cantar no baile. Quero ver se quem canta também se comove profundamente como a Beyoncé (quem não se lembra?), imagino o casal Trump a dançar na terrível exposição daquele palco: nos antípodas da graça, do à-vontade, da harmonia, da sensualidade e da alegria do casal Obama. Quero ver, hihihihi. Por falar em casal Trump: a Melania. Hihihihi, a Melania, coitadinha da Melania, hihihihi.

Portanto, é este o gelo fino sobre o qual corro o risco de avançar: pensar mal da Melania por causa do marido dela. Desclassificar a Jackie Evancho (cuja alegria e naturalidade em tempos me enterneceram) só porque ela vai cantar o hino nacional na cerimónia de tomada de posse. Sujar o debate das ideias políticas com incursões na área do aspecto físico de uma pessoa e da sua vida privada.

"O Trump liberta o filho da puta que há em ti", dizia há tempos o Lutz Brückelmann, falando do contributo de Trump para a aceitação e até o elogio de discursos públicos à margem da decência e da humanidade, agora vistos como sinal de corajosa frontalidade. Mas a acção destruidora do fenómeno Trump vai mais longe: como descubro também em mim, faz vir à tona os piores instintos de quem se queria pessoa civilizada. Isto está a correr muito mal. Tenho de meter os travões a fundo: pensar, escrutinar os impulsos, pensar de novo.

Tempos difíceis, estes, quando me sinto desapontada comigo própria, e suspeito que aqueles com quem mais me identifico ideologicamente também não estarão muito seguros dos seus valores.

Por exemplo: será que a ausência de estrelas do mundo do espectáculo na tomada de posse do Trump é realmente sinal de protesto de cada uma delas? Ou há algumas que só não foram porque temeram ser marginalizadas ou perseguidas pela máquina da qual dependem? Será que está em curso uma espécie de controlo de "actividades antiamericanas" entre pares? Outra questão preocupante: a independência do nosso pensar. Temo o dia em que o Trump diga algo sensato, e muitos desatem a contradizer apenas por reflexo condicionado.

Corremos o risco de nos afastarmos dos nossos melhores valores de tolerância, generosidade, respeito pela liberdade alheia. Estamos cada vez mais separados uns dos outros - "deploráveis", uns; "elitistas arrogantes", os outros.

O mais perigoso eixo do mal é esse que marca a distância intransponível entre nós e os outros - e é ele o mais eficaz vector de destruição da nossa sociedade. Por muito antagonizados que estejamos, vamos ter de arranjar maneira de nos reencontrarmos e entendermos. A nossa democracia tem de ser um lugar de coexistência pacífica na diferença. E não se trata de aprender a indiferença e o cinismo, não se trata de aceitar passivamente. Trata-se do trabalho difícil e exigente de encontrar as palavras certas para o diálogo.

A Jackie Evancho, a tal miúda de 16 anos que amanhã vai cantar o hino nacional americano, pode tornar-se um símbolo desse desafio. Ela - a única artista que aceitou actuar a solo na tomada de posse do Trump - tem uma irmã mais velha que nasceu com corpo de rapaz, e se empenha na defesa da dignidade dos transexuais. Na mesma família, uma pessoa colabora com Trump e a outra é perseguida por muitos dos eleitores deste presidente. Se eles conseguem o amor, o entendimento e o respeito, nós também havemos de conseguir.



We the people

Amanhã, no Washington Post, a Amplifier Foundation irá comprar páginas de publicidade onde publicará arte para a Marcha das Mulheres, que se realizará no Sábado. O objectivo da campanha no Kickstarter era de $60 mil, mas já ultrapassou mais de $1,3 milhões.



Limites de um mercado competitivo

A respeito do Obamacare, é comum ouvir-se que, se houver competição, os preços serão mais baixos e o que falta ao mercado de saúde do Affordable Care Act, vulgo Obamacare, é que, em vez de haver mais competição, ela está a diminuir. Quem diz estas coisas confunde causa com consequência. Se o mercado tiver muitos participantes inicialmente, pode ser uma consequência da competição no mercado que eventualmente haja menos competição. Basta que as seguintes condições se verifiquem, por exemplo:

Prostitutas é com eles

Uma informação útil, caso venha a ser inserida no Trivial Pursuit, da boca de Vladimir Putin: não há dúvida que a Rússia tem as melhores raparigas de moral duvidosa do mundo.

“I find it hard to believe that he [Donald Trump] rushed to some hotel to meet girls of loose morals, although ours are undoubtedly the best in the world”

~ Vladimir Putin, citado na Bloomberg

Portugal, a eterna metrópole

Na sequência da recente viagem de António Costa à Índia pude mais uma vez constatar a singularidade do complexo colonial português. A maioria dos países ex-colonizadores sente uma culpa característica ou, no máximo, uma indiferença relativamente às nações que no passado colonizou. Portugal, pelo contrário, sente ainda hoje um estranho orgulho no seu império passado. O mito criado por Salazar permanece vivo, de uma forma que ultrapassa a mudança de regimes ou ideologias políticas.

O dito mito assentava em dois ou três pressupostos básicos. A suposta capacidade inata e única dos Portugueses para colonizar. A ausência de racismo no processo de colonização. A invenção do “mulato”.  Salazar fez realmente muito bem o seu trabalho de construção da identidade nacional. Apesar da existência de alguns laços, especialmente económicos, com as colónias anteriores à instauração do Estado Novo, o Império enquanto símbolo da soberania, da razão de ser do regime político vigente, e da mitologia nacional aparece em toda a força com a edificação do Estado Novo.

Olhemos para alguns números. Num ensaio sobre o 25 de Abril, onde aborda a questão da descolonização, Vasco Pulido Valente cita números que apontam para um total de 15.000 (quinze mil) habitantes de Angola e Moçambique com origem na metrópole em 1910. No final da II Guerra Mundial, os números ascenderiam, então, a 70.000 habitantes brancos com origem na metrópole. De acordo com o autor, apenas com o início da guerra colonial houve, de facto, um aumento substancial do número de brancos de origem Portuguesa nas colónias. Os motivos para a ausência de um número alargado de colonos são, para o autor, bastante prosaicos. Os Portugueses não pretendiam emigrar para a África Portuguesa (o que correspondia a um degredo económico à época). Pretendiam, isso sim, emigrar para países ricos, onde pudessem, naturalmente, alcançar os seus sonhos materiais, e ver-se livres da pobreza abjeta que grassava em Portugal. Países como o Brasil, primeiro, e, mais tarde, França ou Alemanha. E, recentemente, o historiador económico Nuno Palma tem desenvolvido excelente trabalho económico, referente sobretudo aos séculos anteriores, que corrobora no essencial esta visão.  O “império colonial português” durou na verdade 20 anos (dos anos 50 aos anos 70), sendo que metade deste tempo foi em guerra para não se desintegrar. Por outras palavras, nós nem quando éramos metrópole éramos metrópole!

É, pois, frequente (e interessante) vermos peças jornalísticas – como as que se repetiram durante a última viagem do primeiro-ministro – a aludirem à forma como ainda hoje se sente de forma fortíssima (!) a presença portuguesa em Goa, Macau, África e no Brasil.

As peças jornalísticas da semana passada foram especialmente ridículas. Uma peça de uma estação de televisão aludia à emoção de se sentir Portugal do outro lado do mundo, nas ruas de Goa. Logo de seguida, entrevistada uma prima de António Costa, esta teve de falar em inglês, uma vez que não sabia português. O semanário Expresso apresentou uma entrevista ao Ministro da Economia, Manuel Caldeira Cabral, onde este referia o habitual estribilho que Portugal deveria aproveitar estes fortíssimos laços culturais passados para se estabelecer como porta de entrada do investimento indiano na Europa. Esta expressão não será estranha para ninguém. Já todos ouvimos – inúmeras vezes – que Portugal deve aproveitar estes “laços” coloniais passados para se posicionar como porta de entrada na Europa para investidores Brasileiros, Angolanos, Indianos ou Chineses. Eu própria cheguei a aprender na escola e a debitar em testes – em pleno século XXI – que Portugal deveria aproveitar a sua posição atlântica e ser uma plataforma giratória entre a CPLP e a UE. Este é, pois, o grande desígnio geopolítico de Portugal!

No fundo, a expressão “porta de entrada” revela simplesmente que esta gente acha que Portugal deve continuar a ter um papel de metrópole a cumprir, onde os laços comerciais são exclusivos com Lisboa, que, depois, tirará benefícios de revenda os produtos e serviços das colónias. Manuel Caldeira Cabral, entre muitos outros, acha mesmo que um investidor milionário indiano – que não sabe português (nem a prima do Costa sabe!) – quando quer investir na Europa (por exemplo, na Polónia) deve primeiro fazer escala em Lisboa, em vez de ir directamente onde quer. Dizem-me, “sim, mas no caso dos investidores brasileiros ou angolanos, a língua é um facilitador importantíssimo”. Bem, eu lamento desiludir os meus leitores, mas creio que isso é igualmente uma fantasia.

Olhemos para o caso do Brasil. De facto, é o país onde mais se fala português. Mas, dada a sua independência tão mais anterior, percorreu uma história independente de Portugal que os Portugueses parecem esquecer. Foi, por exemplo, um fortíssimo destino de emigração de italianos, alemães, holandeses e japoneses, os quais contribuíram para o enriquecimento cultural, económico e social do país. Nas zonas mais ricas do país (nomeadamente nos estados do Sul), existem comunidades completamente bilingues, que mantêm laços culturais e económicos com os seus respectivos países de origem. Para além disso, qualquer pessoa com experiência em grandes universidades Americanas, testemunhará o enormíssimo número de Brasileiros que lá estudam e se preparam para tomar as posições de destaque no seu país de origem.

Por tudo isto, a ideia de que um investidor da elite Brasileira virá a Lisboa “picar o ponto”, e pedir a autorização à metrópole, para entrar no mercado Europeu, é simplesmente risível. Digamos que um país com uma Justiça em frangalhos, um código fiscal sem qualquer previsibilidade, impostos altos, e uma população pouco educada é de qualquer utilidade apenas porque fala a mesma língua parece-me no mínimo duvidoso.


Será isto culpa de uma propensão portuguesa para mitos, um trabalho de propaganda do Estado Novo muito bem feito, uma ausência de “julgamento” histórico e público do real papel das figuras e elites do Estado Novo (Adriano Moreira passa hoje no espaço público Português por um  “grande humanista”)? Falta ainda uma reflexão nacional sobre a extensão real do racismo nas colónias (recomendo, a este propósito, o magnífico livro de Isabela Figueiredo “Caderno de Memórias Coloniais”). Não sei.