terça-feira, 15 de dezembro de 2015

Os chatos

Eu recebo seguro de saúde através do chamado Obamacare. Em 2016, irá custar-me $277 por mês um plano prateado que, em média, paga cerca de 70% das minhas despesas médicas. No ano passado eu pagava 7% menos, mas este ano envelheci -- é surpreendente! -- e, como tal, o meu risco de ficar doente aumentou, logo tenho de pagar mais. Convenhamos que, se eu ficar doente com uma coisinha má, vou à falência a pagar os 30% do custo da coisa. Ou então morro antes porque, a bem dizer, irei morrer eventualmente, com probabilidade 100%, e ir à falência não é propriamente a maneira como eu quero viver o resto da minha vida. Espero que a eutanásia chegue brevemente ao Texas.

No grande esquema das coisas, é irrelevante eu morrer aos 43 ou aos 83, que é a minha idade meta. Eu até nem tenho filhos, no entanto gostaria de poder cuidar dos meus cães até eles morrerem. A Stellinha era a minha grande preocupação. Sempre que eu ia de férias tinha uma crise de ansiedade porque se me acontecesse alguma coisa, ninguém tomaria conta dela tão bem como eu. Ela já morreu, logo já estou mais descansada. Quanto a mim, a única coisa diferente entre morrer agora ou depois é que, neste momento sou casada e o meu marido herdaria tudo (é por isso que eu ainda sou casada; o meu marido é que ainda não percebeu a minha lógica, coitado). Daqui a 40 anos irei ser divorciada e todos os bens que eu tiver irão para pessoas que não são da minha família ou entidades não-lucrativas. Por falar nisso, tenho de ir fazer o meu testamento assim que me divorciar. E, não, não tenciono voltar a casar-me -- só se comete um erro uma vez, é esse o meu lema de vida.

Entretanto, estou viva e passei as últimas semanas a receber emails diários muito chatinhos do governo americano, que estava muito preocupado por eu ainda não ter visto se havia melhores planos de saúde do que o meu, que me permitissem poupar dinheiro. O último dia para nos inscrevermos é 15 de Dezembro. Eu já sabia que o meu plano estava renovado; mas, para apaziguar o Sr. Obama, hoje fui ver que escolhas tinha e há um que é $5/mês mais barato. Não me inscrevi nesse. Por $5 não vale a pena. Só a trabalheira de andar a gerir a imensa papelada dá-me dores de cabeça e esgota a minha energia. Vou ficar com a mesma companhia e minimizar os custos de transacção.

O meu plano de saúde é muito bom, é melhor do que o que a minha companhia me ofereceria e não é nada caro. Eu mostrei o plano à minha companhia para ver se compensava mudar para o deles e os meus colegas e a pessoa que trata do seguro de saúde da companhia ficaram surpreendidos. Se eu tivesse comprado um plano daqueles fora no Obamacare, pagaria mais de $500/mês. O plano que a companhia oferece é um que é catastrófico: o paciente paga tudo até aos primeiros $6.000 cada ano e depois é que o plano é activado e paga 100% desde que a doença esteja coberta; custa quase o dobro do meu por mês. Só para terem uma ideia, no meu plano, para ir ao médico pago $30/visita, a uma clínica de urgências pago $50, às urgências de um hospital pago $400, e a um especialista pago $50. Depois, para doenças normais, pago os primeiros $1.500 em despesas cada ano e o seguro paga as despesas a partir desse montante, desde que eu use alguém da rede de seguros e que o tratamento esteja coberto. É o suficiente para me manter viva.

P.S. Se estão chocados com a minha crueza a falar destas coisas, a culpa é das aulas de Macroeconomia da FEUC, em 1991/92, onde nos ensinaram a Life Cycle Hypothesis. Pareceu-me muito boa ideia e eu ainda nem era economista...

4 comentários:

  1. É por essas e por outras que quando pensamos emigrar - e acabamos no Reino Unido - os EUA foram "riscados" da lista de possibilidades. Um sistema de saúde baseado em seguros privados, sem garantia ou supervisão do Estado, não é eticamente compaginável com os valores de uma democracia liberal dos nossos tempos.

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    1. O que é compaginável, meu caro, é o facto de se pagar bem menos impostos nos EUA que na famosa Europa do "Estado Social". Nesta última, há um monte de coisas "gratuitas", claro.

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    2. Não se pagam muito menos impostos nos EUA. Só causa menos alarde gastar 500 milhões de dólares em treinar uma dúzia de insurrectos sírios do que a tratar os desgraçados sem posses que tenham o azar de ficar doentes, por exemplo, com uma apendicite.
      http://observador.pt/opiniao/sinfonia-londres-haydn-nao-importa/

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    3. Carlinhos, agora já podes emigrar para a América...

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