quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

Definições

As definições são muito curiosas. E há definições para provar qualquer coisa, basta ir à procura ou inventar. Fui à base de dados da OCDE e tirei três variáveis:
  • Government revenue: receitas dos estado em percentagem do PIB
  • General government spending: despesa gerais do estado em percentagem do PIB
  • Government gross debt: dívida bruta do estado

Depois interessei-me pelo stock de dívida porque não batia certo com as contas que o Ministério das Finanças apresentou no OE2016. Fui ao Eurostat, que é um horror de navegar, e recolhi a dívida bruta do estado: General government consolidated gross debt. E ainda -- não, não vai sair a Bota Botilde, vai sair a definição de dívida do Banco Mundial: Central government debt, total, mas a base de dados não incluía 1996, nem 2014.

Com isto tudo fiz um boneco. Como podem ver, a despesa anual não parece ser nada do outro mundo comparada com a receita, mas a dívida tem uma ascensão astronómica, o que indica que ou os juros penalizam muito, ou a dívida é contraída à margem do que o estado diz ter gasto. Parece-me que o que se passa é que os governos se comprometem a gastar empurrando despesa para o futuro e ocultando-a das contas presentes, ou seja, vale de muito pouco olhar para o défice para tentar inferir o impacto na dívida.

E depois há a definição de dívida que a OCDE usa e a definição de dívida que a UE usa e a definição de dívida que o Banco Mundial usa. Note-se que a definição da UE parecia ser a que dava um aspecto melhor da coisa, como se as raposas estivessem a guardar o galinheiro.

Olhando para isto, e tendo em conta que a dívida é pelo menos 30% superior ao PIB e a taxa de juro média da dívida excede a taxa de crescimento do PIB, sinceramente não percebo como é que ambos governos PSD/CDS/PP e PS/Geringonça contam em reduzir o stock de dívida, medido em termos de percentagem do PIB, tão cedo. Não percebo a matemática disto.

P.S. Julgo que o problema é eu não ter as definições certas, pois se as variáveis fossem definidas de outra maneira, o problema desapareceria. É como os porcos: com um bocadinho de batôn, não só não são porcos, como têm uma beleza tão resplandecente, que fazem da Sara Sampaio uma gaja completamente banal...

6 comentários:

  1. Rita, a dívida pública subiu numa proporção semelhante em todos os países da OCDE (e do mundo?), desde o cataclismo americano de 2007-2008. Subiu um pouco mais nos que sofreram as ortodoxias do FMI, um pouco menos nos que tiveram Bancos Centrais com impressoras em prontidão para acudir ao fogo. O problema não é português.

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    1. O problema parece ser o meu português: não percebo a evolução de três coisas que supostamente medem coisas parecidas. Não percebo a formula matemática que permite o PIB crescer menos do que a taxa de juro da dívida, mas a dívida em termos de PIB decresce, como nos dizem os Orçamentos de Estado.

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    2. Lamento informá-lo, meu caro, mas essa cantilena de que a "dívida pública subiu numa proporção semelhante em todos os países" não colhe. Se tiver a oportunidade de estudar os dados do Eurostat não terá dificuldade em verificar que, se em 2007-2008 a dívida do nosso estado (em percentagem do PIB) estava perfeitamente alinhada com a média da dívida na Eurozona (em cerca de 68% do PIB), a partir dessa data encetou uma escalada que lhe permitiu atingir no fim de 2012 o patamar de 130% do PIB. Isto, enquanto a Eurozona atingia na mesma altura o patamar actual de cerca de 90% do PIB.

      Note ainda que na altura em que Troika se mudou para o Terreiro do Paço, no terceiro quartel de 2011, já a nossa dívida se aproximava dos 100% do PIB, o que compara mal com os 86% da Eurozona. O nosso estado andava a endividar-se a quase o dobro do ritmo de endividamento dos seus parceiros do Euro. E isto nada tinha que ver com as "ortodoxias do FMI"...

      Filipe Correia

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    3. Filipe, neste período, quais foram os países do mundo em que a dívida pública baixou, em termos absolutos ou relativos?
      Diz bem, em 2011 estávamos com uma dívida no mesmo nível que actualmente têm, por exemplo, os EUA, Espanha ou a Bélgica, que estão entre os países que mais crescem e, alguns, até se financiam a taxas de juro negativas. Atribuir os défices de 2010 e 2011 a causas nacionais é uma aldrabice que só os néscios podem aceitar. Portugal foi chutado pela ladeira de especuladores de ocasião por políticos irresponsáveis.

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  2. Rita, e se fizesses o gráfico em termos absolutos e não relativos? É que o PIB cai nos pontos onde a dívida dá um salto.

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