segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Coisas sérias

A The Economist tem uma história acerca de Portugal e da indústria do calçado. Vale a pena ler e reflectir acerca do que se quer para o país. Quem quer regressar a 2010, prepare-se para reviver 2011, mas lembre-se da Grécia e das aulas de economia: ninguém escapa à lei dos rendimentos marginais decrescentes.
"With exports accounting for 95% of its production, the footwear industry is a trailblazer for what Portugal’s three-year bail-out was meant to achieve: a rebalancing of the economy away from debt-fuelled domestic demand to export-led growth. Businesspeople say the country’s willingness to make sacrifices to complete its bail-out programme has enhanced their profile abroad. “We sense this in our dealings with international suppliers and customers,” says Mr Gonçalves. “The more Portugal is respected as a responsible country, the more we are seen as reliable companies.”"

Fonte: The Economist

3 comentários:

  1. Alguém que dê um pulo a Londres e avise os senhores da The Economist que "correlation does not imply causation" e "propter hoc ergo post hoc" ainda é uma falácia lógica.

    O programa de ajustamento teve ZERO a ver com o crescimento da indústria do calçado, da mesma maneira que teve ZERO a ver com a indústria têxtil. O grande motor do crescimento da indústria do calçado foi, de facto, a capacidade quase única de um sector se associar de forma efectiva e bater-se de forma unida pelos seus interesses. A associação do calçado fez um esforço hercúleo para mudar a percepção internacional sobre o "Made in Portugal" e resolveu (bem) posicionar-se na gama média a média-alta do mercado.

    Em relação à têxtil, que conheço melhor, a história é ligeiramente diferente: a têxtil foi obrigada, fruto da crise internacional, a procurar clientela. Longe vão os tempos dos empresários ficarem sentados nos seus escritórios, à espera que o cliente fizesse a encomenda. Foram obrigados - fruto da competição externa, especialmente asiática - a irem atrás dos clientes e lutarem por mercado. Isso, por sua vez, levou à necessidade de investimentos tanto para cumprir exigências dos clientes (a nível de produto, condições de laboração e ambiente) como para ter alguma diferenciação.

    No entanto, e apesar das melhorias, ambos os sectores sofrem ainda de um problema que julgo ser tanto grave como estrutura: a falta de marcas próprias e de estratégias comerciais sólidas (mais na têxtil que no calçado mas aplica-se aos dois). Dou-lhe um exemplo:

    Estou a precisar de comprar um par de sapatos, de qualidade boa ou superior. Tentei, como sempre, comprar português. A marca Carlos Santos anda na moda, o dono da empresa (a Zarco) dá entrevistas a torto e a direito, arroga-se de ser dos melhores fabricantes do mundo (presunção e água benta) e por aí em diante. No Porto existem SÓ na Marques Soares e têm uma selecção reduzida (e dentro desta, nem o meu número). No resto do país, salvo erro, há em Braga, em Coimbra e em Lisboa (uma loja em cada). A fábrica, em S. João da Madeira não tem loja. Não têm loja online. Não consigo comprar online na Europa (e acreditem que já tentei). Em alternativa consigo comprar sapatos ingleses (diversas marcas) online e mesmo em mais lojas cá no Porto. Consigo comprar sapatos espanhóis (idem nas diversas marcas) de muito boa qualidade. Consigo comprar sapatos HÚNGAROS e ROMENOS, para não falar em franceses ou italianos. Todas estas marcas têm presenças fortes nos fora online e em blogs de "trend setters", com críticas (reviews) calorosas e preços a condizer (a título de exemplo, a marca húngara leva cerca de 600 euros por par e acham baratos para a qualidade tida). Um dos mais importantes bloggers da área, francês, falou no Carlos Santos na sua última resenha de marcas recomendadas. Sublinho somente que o mercado francês, segundo os próprios é o principal mercado da marca. Transcrevo aqui o mais relevante:

    "Being among the first to support Carlos a few years ago, we anticipated nothing short of a glorious future for his company, given the quality of his work and the notable aesthetics of his shoes. However, weak strategy and questionable marketing decisions have challenged the company’s development, leaving us to wonder if Carlos Santos will one day reach his full commercial potential.

    Carlos Santos’ shoes are excellent, but distribution logistics are caught up in an artistic blur that has resulted in sheer disorganization. Santos’ shoes used to have a physical retail presence at Marc Guyot in Paris, but it is now become nigh impossible to get one’s hands (or feet) on a pair of CS – particularly under his own name.

    His ever-changing lines and collections make little sense ; what happened to the superb “Handcrafted” range, that has suddenly disappeared from the brand’s website ? And what about the prices, that shuffle around, depending on which website you’re on ?"

    http://parisiangentleman.co.uk/2015/08/23/parisian-gentlemans-mens-shoe-review-2015-2016-part-12/

    ResponderEliminar
  2. Carlos, agora que a The Economist estava a tentar criar a percepção que nós éramos como os alemães, uns campeões, vens tu e dás-nos um banho de realidade. Afinal somos uns pobres de espírito, como os gregos. Para quando é que está agendada a próxima queda de governo? Ah, ainda nem sequer o temos...

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Peço desculpa pelo "banho", mas sou um bocado pragmático e custa-me de igual forma os desgracistas como os foguetistas. Mas o post foi mais um desabafo que outra coisa: anda aqui um gajo a querer privilegiar o fabrico nacional - e eu sou dos chatos, a minha mulher detesta fazer compra comigo porque eu ando sempre à cata das etiquetas - e não nos deixam...

      É assim TÃO difícil fazer uma lojazita online? Pelo andar a carruagem, ainda vou comprar sapatos de uma empresa de Atlanta, fabricados em Barcelona e que enviam directamente para aqui a partir de Espanhas sem IVAs ou alfandegas (já agora: http://www.cobbler-union.com/collections/all-products)

      Eliminar

Não são permitidos comentários anónimos.