segunda-feira, 19 de outubro de 2015

O arco da governação vai ter mesmo de consolidar

Nem a adesão ao euro, com a disciplina orçamental imposta pelas regras europeias, foi suficiente para conter os défices públicos e uma dívida pública crescente desde 2001, como se pode ver nos gráficos.

A partir de 2001, quando Portugal se torna o primeiro país a violar o PEC – e que continuaria a violar ininterruptamente até hoje -, todos os governos tomaram medidas para consolidar as contas públicas, isto é, para reduzir o défice orçamental. Do lado da despesa, destacam-se o congelamento e o corte de salários, o congelamento das carreiras, restrições no acesso às prestações sociais, e, claro, a redução do investimento público (ou o adiamento da sua factura com os contratos de PPP). Do lado da receita, com a excepção da redução do IRC nos últimos anos, desde 2002, todos os impostos têm sido aumentados por todos os governos. Apesar destes esforços, a dívida pública não parou de aumentar. PSD/CDS e PS reconhecem a urgência de inverter esta tendência e, por isso, de reduzir os défices orçamentais.

Se é verdade que foram os partidos do arco da governação que criaram este problema orçamental, também é verdade que só eles o poderão resolver – o BE e o PCP ignoram nas suas propostas a existência de restrições orçamentais. O acordo entre PSD/CDS e PS é assim uma condição necessária para que Portugal não interrompa o processo de consolidação orçamental. 
Depois da crise financeira e depois da troika o mundo mudou mesmo. Hoje os mercados observam-nos atentamente. Os sistemas financeiros, sobretudo na Europa, ainda estão combalidos. E qualquer sinal de desvio do processo de consolidação orçamental em curso terá consequências muito negativas.

Um acordo de governo entre PSD/CDS e PS tem riscos. Se os partidos do arco da governação falharem, fica aberta a porta para a radicalização do nosso sistema político. No entanto, depois de um tão longo período de crise económica e redução dos rendimentos das famílias, se o próximo governo falhar será toda a estratégia de desenvolvimento, iniciada em 1977 com o pedido de adesão à CEE pelo então governo do PS, que estará em causa. E o que verdadeiramente distingue os partidos do arco da governação dos partidos da extrema esquerda, BE e PCP, é o desejo de sucesso do projecto de integração europeia. O arco da governação vai ter mesmo de consolidar. 

10 comentários:

  1. Caro Fernando Alexandre,

    Peço desde já desculpa se estou a interpretar mal o seu texto, mas concordando com o título discordo com o argumento.

    O arco da governação tem de consolidar, concerteza. Mas de igual forma a Europa (ou os "credores") e o arco da governação tem de assumir que a dívida é insustentável. O esforço subjacente ao pagamento de juros não é razoável e o prazo assumido para a redução da dívida para níveis aceitáveis E com o este esforço de juros, excessivo.

    Quer isto dizer que defendo um corte na dívida, seja em termos de redução do capital (à grega), seja por uma extensão das maturidades e redução de juros (ou indexação dos juros ao crescimento médio do país/zona euro e à inflação)? Exactamente.

    Dir-me-á que isso terá efeitos no mercado e na capacidade do país se financiar. Eu sei que sim e acho óptimo. Uma das razões porque nos enfiamos neste buraco teve a ver com uma constante e permanente má avaliação do mercado à nossa real capacidade financeira. E, portanto, é no mínimo justo que estes sofram as consequências dos seus actos (ou, no caso actual, que os seus "avalistas" os sofram) - e que Portugal sofra igualmente a incapacidade de utilizar de forma desregrada um recurso. Não vislumbro melhor incentivo para uma consolidação que a incapacidade de aceder de forma "livre" aos mercados.

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  2. Caro Carlos Duarte,
    uma das lições da crise financeira é sem dúvida melhorar as relações entre credores e devedores de forma a reduzir as possibilidades de se cair em endividamento excessivo. Outra coisa é alterar os contratos existentes, como é o caso da renegociação da dívida que refere. O meu ponto, o da consolidação orçamental, é independente do que possa acontecer àquele nível. Portugal acumulou défices quando os custos que suportava com a dívida eram baixos. Se não alterarmos o nosso processo orçamental, as despesas continuarão a crescer e os impostos também na tentativa de controlar o défice. Se não controlarmos o crescimento da despesa e os défices orçamentais não vamos sair disto. Claro que o crescimento resolvia isto tudo e muito mais!

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    1. Caro Fernando Alexandre,

      Repare que não falei em crescimentos e afins. Falei em sustentabilidade da dívida. E concordo com a consolidação orçamental.

      A diferença, se quiser, é que eu considero que a consolidação da dívida deve incluir a não-oneração excessiva no futuro (se quiser, os nossos filhos não devem pagar pelas nossas asneiras mais que o razoável) e que, portanto, existe um limite a partir do qual devem ser os actuais a suportar os custos do pagamento da dívida em alternativa aos futuros (sendo que esse "suportar" seria a incapacidade de aceder aos mercados e/ou de apenas o poder fazer com juros punitivos, obrigando a uma consolidação mais imediata).

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  3. Mas se não resolvermos o problema das contas públicas - numa lógica despesas/receitas - vamos continuar a lançar dívida sobre os nossos filhos (quem os tem!). Eu gostava de ver este problema resolvido, porque claramente não está. E, pelos vistos, não vai ser fácil de resolver a breve trecho...

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    1. Mas aí concordo inteiramente consigo. Só considero - e peço desculpa por ser repetitivo - que a discussão deveria ser a sustentabilidade a médio-longo prazo das contas públicas e não o "como vamos pagar as dívidas" e "ai Jesus os mercados" que tem sido o foco da discussão por parte do Governo.

      Já a oposição (e tirando algures sectores racionais do PS) deixava o argumento de que quer sol na eira e chuva no nabal.

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  4. Senhor Fernando Alexandre:
    O arco da governação vai ter de consolidar o quê?
    Não percebi.
    A partir desta afirmação cheia de ambígua na sua formulação, segue-se uma argumentação não menos confusa.
    Nós acumulámos défices porque gastámos demais ou porque produzimos de menos?
    E produzimos de menos porque fomos descuidados ou porque entrámos no euro sem condições para tal?
    E a globalização não é chamada à colação?
    E o alargamento da UE de 15 para 28 também não contou?
    É como se um velocista amador do Clube Desportivo do Forte da Casa fosse participar nos mundiais de velocidade com o Usain Bolt e que tais e depois as pessoas se queixassem de ter ficado em último por não ter treinado o suficiente ou ter feito uma noitada no dia anterior, não acha?
    .

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    1. Caro Manuel Silva,

      Pegando no seu exemplo do Usain Bolt, é como o velocista do Clube Desportivo do Forte da Caixa ter resolvido correr os 100 m a frio e depois lesionou-se. A culpa é do Usain Bolt? O que se pode discutir é o tipo de fisioterapia e ver se a mesma não arruma de vez com o atleta ou, quando este ficar curado, só poder competir no escalão de veteranos...

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  5. Caro Manuel Silva,
    é simples: acumulámos défices porque gastamos demais, face ao que produzimos. Se tiver a fórmula para crescermos mais... se não tiver é melhor não gastar demais.

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  6. Caro Fernando Alexandre,
    Será que a realidade política portuguesa permite aos partidos do "arco da governação" essa consolidação?

    Na campanha eleitoral não houve nenhuma proposta política que defendesse a "consolidação". todas as propostas apontavamo caminho do "alívio da austeridade" sendo unicamente o ritmo de "alívio" que diferenciava a PaF do PS. Mesmo assim os partidos de extrema esquerda tiveram mais de 1 milhão de votos.

    Assumindo que seria politcamente viável, se não nestas numas próximas eleições, eventualmente depois de nova intervenção externa, como faria essa mesma consolidação? quais as despesas concretas que cortaria?

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  7. Caro Fernando Alexandre,
    Será que a realidade política portuguesa permite aos partidos do "arco da governação" essa consolidação?

    Na campanha eleitoral não houve nenhuma proposta política que defendesse a "consolidação". todas as propostas apontavamo caminho do "alívio da austeridade" sendo unicamente o ritmo de "alívio" que diferenciava a PaF do PS. Mesmo assim os partidos de extrema esquerda tiveram mais de 1 milhão de votos.

    Assumindo que seria politcamente viável, se não nestas numas próximas eleições, eventualmente depois de nova intervenção externa, como faria essa mesma consolidação? quais as despesas concretas que cortaria?

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