quarta-feira, 16 de março de 2016

Uma época de jovens masculinos

Em 1927, Ortega y Gasset escreveu que se estava a entrar numa época cujo protagonista era o jovem. Desafortunados dos que tinham então 40 anos: viveram sempre em contramão com as modas. Quando eram jovens, reinavam na Europa os velhos; agora, na maturidade, chegara o reino da juventude.
A exaltação da juventude estava a começar e Gasset, com o seu excelente radar para estas coisas, percebeu a tendência antes dos outros. Todavia, não era apenas o reino dos jovens que despontava. O novo protagonista, além de jovem, era masculino.
De acordo com Gasset, os homens já não cortejavam as mulheres como no final do século XIX. Verdade que as mulheres nunca deixaram de ser desejadas, mas nem sempre foram estimadas. Agora, os homens queriam antes de mais impressionar os outros homens. A beleza masculina voltava a ser apreciada, como já não se via desde a Antiguidade. E as mulheres nunca haviam falado com tanto descaramento sobre os homens bonitos. Antes, calavam o seu entusiasmo pela beleza masculina, se é que sentiam um verdadeiro entusiasmo.
A mulher de 1927, que gostava superlativamente de “hombres guapos”, havia deixado de cunhar os valores por si mesma e aceitava o ponto de vista dos homens, homens que à época admiravam sobretudo a figura do atleta. Claro, dizia Gasset, as mulheres, nas suas opções, que julgavam pessoalíssimas, não tinham consciência dessas “grandes forças anónimas”, desses “sopros gigantes que nos mobilizam por capricho”. Mas, para Gasset, não era uma casualidade que as mulheres fumassem, bebessem, se vestissem como os homens (houve épocas em que era o contrário), que começassem a falar de desportos, carros, política. Em tudo, em todas as áreas, as mulheres queriam imitar os homens jovens.
Gasset achava que talvez as relações entre os diferentes sexos nunca tivessem sido tão saudáveis, moderadas, paradisíacas. Mas havia consequências, avisava o filósofo espanhol. Em todas as épocas masculinas da história, em que o homem se havia desinteressado pela mulher, prestou-se culto ao “amor dórico”. Foi assim no tempo de Pericles, de César e no Renascimento.
Sobretudo Gasset lamentava que a perda de poder das mulheres levasse a uma convivência cada vez mais áspera e rude. Foram as mulheres que inventaram a cortesia. Nesta época jovem e masculina, a dar então os primeiros passos, a obsessão das mulheres em assemelhar-se aos homens estava a trazer o império da descortesia. 

2 comentários:

  1. Talvez a lei da oferta procura possa explicar estes ciclos.
    Se o número de jovens fêmeas excede claramente o número de jovens machos, o instinto de cortesia destes relaxa-se e o delas exacerba-se.

    Mas não tenho evidência matemática, é só uma hipótese.

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