segunda-feira, 20 de julho de 2015

Pois é, dava um filme...

Correu quase tudo bem, mas cheguei ao aeroporto George Bush e a minha mala tinha excesso de peso. Queriam $200 porque tinha mais de 23 KG. Não paguei tanto, acabei por fazer o check-in de uma segunda mala por $100. Por acaso, desta vez nem me lembrei de pesar a mala. Ultimamente, tenho viajado com bagagem mais pequena e nunca me acontece. Como levo uma mala maior, descuidei-me. No grande esquema das coisas, $100 é menos do que o que eu costumo gastar quando vou aos correios enviar dois pacotes para Portugal. 

Dirigi-me para a zona de fazer o controle de passaportes e segurança. De repente, ouço gritos. Uma mulher que chamava "bitch" a alguém, não sei quantas pessoas a tentar controlar uma outra, e eu não sabia muito bem o que pensar. Demorou alguns segundos para eu perceber que a zona tinha sido vedada e não se podia entrar daquele lado. Uma multidão acumulava-se a assistir à cena, algumas pessoas tiravam fotos e vídeos. Já deve estar no Twitter e no Facebook... Uns agentes dirigiram-nos para o outro lado, fiz o controle de passaporte e cheguei à porta de embarque. 

No meu voo de hoje, fiquei no lugar 35C, a última fila. Fiquei, mas não fiquei, porque um americano mal-educado decidiu que o meu lugar, que dava para o corredor, era melhor do que o dele, e, quando eu lá cheguei, o gajo já estava sentado no meu sítio. E para cúmulo dos cúmulos, tirou a revista e os panfletos educativos desse lugar e meteu-os no lugar do meio, que deveria ser o dele, mas que ele queria que fosse o meu. Como eu estava com uma dor de cabeça fenomenal, deixei que ele ficasse com o meu lugar, nem lhe disse nada, apenas me diverti a chamar-lhe nomes na minha cabeça. Não era preciso dizer uma coisa que tanto ele e eu sabíamos. Sentei-me no meio e tentei encontrar maneira de enfiar os meus dois sacos debaixo do banco da frente. Consegui! Eu adoro puzzles. 

A senhora que estava sentada à janela era uma indiana pequenina, que vive em El Paso, olhava para o todo lado, e a certa altura me diz, à guisa de desculpa, que era uma pessoa muito curiosa. Como ela estava um bocado irrequieta, eu perguntei se ela estava bem. Sim, estava apenas um bocado preocupada porque levava uma coisa muito preciosa com ela: tinha as cinzas do irmão na bagagem que tinha enfiado por cima dos bancos. Eu perguntei de onde ela era e ela diz-me que era de Portugal, mas a família tinha saído de Portugal há centenas de anos e foram para a Índia. Pois é, as coisas que me acontecem... 

O seu sobrenome era Desouza. Depois disse-me que ia para Bombaim--agora é Mumbai--; ia levar as cinzas do irmão para fazerem o funeral, apesar de o irmão já ter morrido em Abril. O irmão tinha síndrome de Down e morreu com 62 anos, uma coisa extremamente rara porque as pessoas que sofrem da doença têm uma esperança média de vida muito curta. Dizia-me ela que tinha muita sorte por ter um irmão assim, pois ele era muito simpático com toda a gente e ela gostava muito dele. Eu disse-lhe que uma vez tinha feito voluntariado numa instituição onde ensinava uma menina com síndrome de Down a cozinhar. Também lhe disse que tenho uma amiga minha que tem uma filha pequenina com a doença. 

Conversámos durante o voo. Quando eu escolhi a comida, o hospedeiro mandou-me sorrir. Ele notou que eu estava mal-disposta. E a minha amiga indiana também. Imaginem! Eu, mal-disposta... Relaxei e ri-me e ela disse-me que eu estava melhor do que quando tinha chegado. 

Notava-se que ela gostava muito de Portugal e tinha mantido muitas das tradições portuguesas, porque falava em "nós", no sentido de nós, os portugueses. É uma católica muito devota. Quando me falou no Santo António, eu disse-lhe que era o santo padroeiro de Lisboa. Ela perguntou-me se eu sabia de onde era o Santo António, eu não sabia. Ela achava que era originário de algures em Portugal, talvez Coimbra. Eu disse-lhe que eu era de Coimbra. Surpreendeu-me que ela soubesse o nome da minha cidade. Olha o factor sorte, que é tão giro... 

Perguntou-me se eu já tinha ido a Fátima, eu disse-lhe que tinha sido há muito tempo e já não me lembrava. Afinal, acho que, para além dessa vez que fui com a minha avó, também fui em 1998, quando levei uma amiga minha americana aí. Ela perguntou-me se eu tinha notado que me tivesse acontecido algum milagre. Eu disse que não. Quando eu lhe disse que eu tinha o nome de duas santas, uma delas a Rainha Santa Isabel, ela sabia que a Rainha Santa era originária da Espanha. Eu disse-lhe que uma vez fui ver a mão da Rainha Santa, ela perguntou-me se dessa vez tinha havido milagre. Eu disse que não. 

Quando aterrámos, ela viu um avião da TAP e mostrou-mo logo. Eu tentei ver se o avião tinha algum nome de uma pessoa conhecida, mas não consegui encontrar. Expliquei-lhe que alguns aviões tinham o nome de pessoas famosas, ela perguntou-me se também tinham nomes de santos. Eu disse que achava que não. 

Foi uma conversa engraçada. A meio do voo pensei que até foi bom o americano ser mal-educado, pois assim eu fiquei ao pé dela e ela parecia muito contente por poder falar de Portugal com alguém. Disse que um dia gostaria de ir visitar Portugal. Talvez possa ir brevemente, agora que já não tem de cuidar do irmão.

P.S. Escrevo isto do telemóvel. Peço desculpa pelos erros. Estou cansada. É verdade, eu falo com toda a gente--ou toda a gente fala comigo... 😜



3 comentários:

  1. Só uma correcção: apesar de Santo Ant´pnio ser o mais celebrado em Lisboa, o padroeiro de Lisboa é São Vicente.

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  2. Saiba a Rita que o Santo António era natural de Lisboa e que se chamava Fernando de Bulhões, viveu algum tempo em Coimbra, no Mosteiro de Santa Cruz, da Ordem dos Cónegos Regrantes de Santo Agostinho, isto antes de mudar para a Ordem dos Franciscanos e rumar para África, onde nunca chegou, tendo desembarcado em Itália, onde se fixou e morreu em Pádua.

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  3. Obrigada a ambos! Quando regressar aos EUA, vou ver se encontro a senhora para lhe oferecer a correcção.

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