quinta-feira, 26 de maio de 2016

A queda de um muro?

Muita gente achou de mau gosto o cartaz da JSD, no qual Mário Nogueira aparece com as vestes de Estaline, um dos santinhos adorados pelo PCP. Não discuto. A mim, causou-me mais espanto a reacção da Fenprof e de Mário Nogueira em particular. Não, não é por Mário Nogueira considerar a possibilidade de processar os jovens laranjinhas. Ou por no passado a Fenprof ter usado cartazes do mesmo género para gozar com ministros ou primeiros-ministros. Esqueçamos esses pormenores da liberdade de expressão, da coerência, etc. O meu espanto é outro. Desde quando Estaline passou a ser uma persona non grata para os comunistas portugueses? Deixaram de venerar o homem de aço? Se calhar António Costa tinha mesmo razão quando há uns tempos disse que o muro de Berlim estava (finalmente) a cair lá para os lados da Soeiro Pereira Gomes. Ou talvez, como sugere hoje Francisco Assis no "Público", Mário Nogueira se sujeite a um “processo disciplinar” instaurado pelo PCP e se transforme, involuntariamente, num “verdadeiro herói”.

15 comentários:

  1. Não, não vai haver processo disciplinar contra o Mário Nogueira. Mas pode ter essa fantasia, se quiser. Já agora, o Estaline não é um santinho devoto do PCP. Não encontra nenhum documento atual do PCP a incensar o Estaline. Nem o Cunhal o fazia, e era o Cunhal, a não ser na juventude. Poderá haver comunistas que gostem do Estaline. Mas, como já reparou, não é o caso do Mário Nogueira, não é assim? Obviamente, o Alexandre não discute o gosto do cartaz da JSD.

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    1. Ai sim, diga-me lá então o nome de um dirigente comunista português que tenha denunciado e criticado os crimes de Estaline. Querem ver que agora já nem Cunhal era estalinista. Estão a reescrever a história (uma das especialidades dos comunistas), é isso?

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    2. A primeira critica clara ao Estaline pelo PCP foi feita no seu V congresso, em 57. Já depois do 25.A, o Cunhal dá uma entrevista em que que repudia o Estaline. Repare, Alexandre, eu já fui na juventude da JCP, já sai, por divergências com o partido, já estou noutra, mas continuo a ser amigo de antigos camaradas. Há lá de tudo, estalinistas e anti-estalinistas, que se mantém no partido e não foram por isso alvo de qualquer processo. Entende agora porque é que o Mário Nogueira não vai ser alvo de processo disciplinar? O Mário Nogueira é um sindicalista duro, combativo (se conhecesse alguns dirigentes sindicalistas ingleses, franceses e alemães, devia achá-lo muito mole ;)). Mas nunca me tinha ocorrido que isso seria equivalente a purgas sanguinárias no partido ou ao massacre dos kulaks. Enfim...

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    3. Claro que não vai ser alvo de nenhum processo disciplinar.
      O PCP nunca repudiou Staline, pelo menos não a sério. O que o PCP faz é dizer que houve desvios do ideal socialista e que a solução que preconizam para Portugal é diferente daquela. Isto é o mais que consegue arranjar. E, sem ter na memória a entrevista de Cunhal que refere, tenho a certeza absoluta de que ele não foi além de umas palavras como as que estou aqui a dizer.

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    4. Entrevista ao Independente, 90, e a palavra foi mesmo repúdio, como ideologia, acção politica, etc. Cuidado com as certezas absolutas, Luís ;)... Marxista-Leninista, sim, sempre.

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    5. Essa entrevista está disponível algures ou tenho de ir a uma hemeroteca?

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    6. A única entrevista de Cunhal em 90 que tenho guardada: https://drive.google.com/file/d/0BzLlVRSYwg-qU0VibHdSQWgtTjQ/view?usp=sharing

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    7. Luís:
      Roma e Pavia não se fizeram num dia.
      Ouvir o Mário Nogueira dizer aquilo em público, em resposta a esta provocaçãozinha da jota laranja, que tem esta visibilidade pública, é uma verdadeira lança em África.
      Como o Renato diz, naquela tasca há muitos géneros de amantes do tintol.
      Ainda há pouco tempo o presidente da minha câmara comunista, de maioria absoluta desde 1976, disse numa sessão camarária que tinha muito apreço pelo regime da Coreia do Norte.
      Ouvi e vi com estes que a terra me há-de comer.
      Nem queria acreditar.
      Portanto, há lá gente para tudo.
      Como em todos os partidos e fora deles.
      Não queira meter o Rossio na rua da Betesga... pelo menos para já.
      Como sabe, o PCP está num dilema: se se moderniza é comido pelo PS e pelo BE, pois deixa de ser muito diferente (e puro) e deixa de ser útil operativamente como solução política para os eleitores.
      Se se mantém na ortodoxia cada vez tem menos clientes: os velhinhos vão morrendo.
      Escolha difícil.


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    8. O PCP repudiou Staline na sequência do XX Congresso do Partido Comunista da União Soviética, em 195, onde Khrushchev o denunciou também (essencialmente, por perseguir e matar comunistas, note-se). O PCP fez esse repúdio por fidelidade a Moscovo, e não necessariamente por convicão.

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    9. Entrevista fantástica, essa. Inacreditável o que diz sobre a Coreia do Norte (bem como a defesa que faz das conquistas socialistas a leste). E esta entrevista é de 1990.

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    10. Congresso PCURSS em 1956. Faltou o 6.

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    11. Basicamente, a posição do PCP em relação a Staline, depois do XX Congresso do PCURSS, foi: "matar sim, mas tanto também não".

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    12. Em 1990, Cunhal já soava com aqueles salazaristas empedernidos que, por volta de 1970, consideravam Marcelo Caetano um "perigoso democrata".

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    13. Pode consultar na hemeroteca, Luis. Mas isto é acerca das certezas absolutas sobre o que fez ou disse alguém. Claro que a motivação mais direta foi a guinada do Krutchev, mas isso não impede que sempre tenham existido militantes e dirigentes comunistas portugueses a quem sinceramente repugnaram os crimes do Estaline. Para além de existir uma antiga tradição de oposição marxista leninista e bolchevique ao Estaline (paga bem cara), estamos a falar de homens com sensibilidades pessoais sobre o que é certo e o que é errado. Daí que não entenda o espanto com o caso Mário Nogueira.

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    14. "Claro que a motivação mais direta foi a guinada do Krutchev"

      Isso foi nos anos 60, depois de Bresnev voltaram a gostar de Stalin. Aquilo em que não acredito não é sobre o que foi nos anos 60. Escrevi "nunca", mas não o deveria ter escrito. Na verdade, estava na Perestroika e no que se passou depois disso. E estou como o Zé Carlos ali em cima, que dirigente destacada do PCP é que alguma vez disse o que Mário Nogueira disse agora sobre Stalin?
      Mas, confesso, depois de ver a entrevista que o Luís Gaspar aqui postou, e a forma como Cunhal lava o regime da Coreia Norte nessa mesma entrevista de 1990, quase que me estou nas tintas para esse repto.

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