terça-feira, 3 de maio de 2016

Floricultura 9

Agarras no guarda-chuva e vais ali comprar um molho de nabiças.
Mas vê lá se estão fresquinhas, se as folhas estiverem amarelas, não tragas. Depois passas na mulher da fruta, é preciso laranjas. E umas maçãs, quero fazer um bolo e a macieira este ano não deu nada. Deve estar com bicho. A dona Adília diz que conhece um homem que percebe destas doenças e já o mandei chamar. É que o bicho ainda passa da macieira para as outras árvores e ficamos sem marmelada, sem compota de ameixa, sem figos. Tem uma pessoa um bocado de terreno e umas árvores de fruto para ficar tudo estragado e ter que andar a comprar. Se o homem disser que não há nada a fazer, sempre podemos deitar as árvores abaixo e vender a lenha. Mas que pena eu vou ter da macieira, hoje em dia não se arranja uma que preste. Posso pedir à dona Adília que me dê uns enxertos da dela para plantar aqui. Porque a dela ainda é das boas, acho até que foram plantadas ao mesmo tempo, a dela e a nossa, ainda a Milinha era viva. E o Sr. Idalécio, deus os tenha em seu santo repouso. Naquele tempo ainda eu trepava às árvores e apanhava as maçãs que estavam mesmo lá no alto, mas agora só consigo chegar às mais baixinhas, as outras são para os pássaros. Também agora há menos gente para comer geleia e bolos, por isso não faz mal serem poucas. Mas não haver nenhuma é que não. Ainda sobramos as duas, e ainda somos gulosas, uma maçãzinha assada com açúcar e canela não é pecado. Dizem na televisão que a fruta tem vitaminas e que é preciso comer coisas com vitaminas. Nem por isso a Milinha se aguentou muito tempo, com as vitaminas todas que comeu deve estar um cadáver lindo, ainda alguém começa uma romaria e lhe ergue um altar. Tudo por causa das maçãs. Não sei se na altura o Sr. Idalécio já tinha plantado a ameixoeira e as outras, mas foi pouco depois da Milinha se ter finado, porque o Sr. Idalécio foi logo a seguir, coitado. Mas esse não foi por causa das vitaminas, a não ser que as vitaminas defendam um homem de ser atropelado. Ninguém está livre. Um senhor tão distinto, e tão forte. Ninguém viu quem o atropelou, mas só pode ter sido um carro grande, uma furgoneta se calhar. Nem pararam, só se viram depois muitas laranjas espalhadas pela rua, deve ter sido um daqueles camiões que abastecem a mulher da fruta. Se não tiver sido mesmo ela, ou o marido. Dizem que bebe. E que ela não fica atrás. Não te esqueças, nabiças, laranjas e maçãs. Traz também um quilo de arroz, do mais banquinho.

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